quinta-feira, 22 de abril de 2021

OSCAR 2021 - ENTREVISTA COM O PROFESSOR PABLO SPINELLI

A  entrevista que se segue com o Professor Pablo Spinelli mantem uma iniciativa desse BLOG de alguns anos em trazer uma opinião sobre o OSCAR para motivar que novas gerações observem nas produções cinematográficas o registro de uma época. 


1) Em sua opinião,  quais foram os impactos da Pandemia da COVID19 que teriam influenciado nas indicações do Oscar de 2021?

O primeiro e mais óbvio, a falta de público. Os filmes não passaram pelo olhar do público e aí temos o segundo impacto. A elitização daqueles que podem fazer o tradicional “bolão” – pelo menos para os mais velhos -, pois os filmes estão circunscritos ao mundo do streaming, portanto, quem tem acesso à Netflix ou Amazon Prime sai na frente nas apostas. Creio que um terceiro impacto seja a escolha por produções mais autorais, diferentes de um Pantera Negra ou Corra! que casaram bilheteria com autoria.

 

2) Na categoria de indicados a Melhor Filme de 2021, haveria algum filme que foi “esquecido”? Qual seria o favorito e o “azarão”?

O favorito é geralmente aquele escolhido pelos Sindicatos de Produtores, Atores, Diretores e Roteiristas que têm em inglês o sugestivo nome de guildas. Saiu na frente o filme “Nomadland”, que está em algumas sessões de cinemas para os mais corajosos, que é dirigido por uma chinesa. A China está em alta. Um filme que os jovens deveriam ver pensando não só nos avós, mas no que pode ocorrer aqui e alhures para quando chegarem aos 60 anos. A diretora, Chloé Zhao, é uma jovem chinesa, filha de um executivo rico em Pequim, uma geração dos anos 80, que cresceu fazendo mangás e se formou em Ciência Política. Creio que ouviremos falar mais de Zhao.

Azarão é o filme “Meu Pai”. Um filme que apesar de muito bem interpretado pelo Anthony Hopkins, uma atuação verdadeira como ele nos deu em “O Silêncio dos Inocentes” e em “Os Dois Papas”, não tem chance.

Dois filmes foram um pouco esnobados. “Relatos do Mundo”, com Tom Hanks e “Uma Noite em Miami”. Poderiam estar na lista de melhores filmes.

 

3) A tendência ao multiculturalismo continua nas indicações desse ano para atender a quem?

A todos. Uma cerimônia que tem uma marca interessante. A primeira com uma vice-presidente negra e que tem duas diretoras indicadas – uma chinesa e uma negra. Um ator negro falecido que vai ganhar o Oscar. Seu colega de “Pantera Negra”, forte favorito para ator coadjuvante. Um comediante inglês que tem uma das melhores comédias dos últimos anos indicado a roteiro adaptado. Um dinamarquês muito talentoso indicado a diretor. Agora, o ponto é que o limite entre aquilo que tem que ser representado na cerimônia e o que realmente deveria estar lá é tênue. Arte não é corrida de cavalo. Oscar é uma aposta da indústria. Cannes, Berlim, Veneza são mais artísticos. Não adianta ter 150 minorias indicadas e 50 000 filmes sem elas. Mas acho que isso vai mudar pelo tempo do mundo e não pelo tempo das imposições. 


Cena do filme Os 7 de Chicago

4) Além da Pandemia, 2020 foi marcada pelo movimento do “Vidas Negras Importam”. Quais indicações ao Oscar 2021 tem uma melhor contribuição para esse debate?

Temos “Judas e o messias negro”, sobre um infiltrado nos Panteras Negras, quase um complemento ao filme do Spike Lee sobre a Klan; “A voz suprema do blues” que fala de uma diva negra e seus músicos com personalidades distintas em uma época muito complicada, cerca de um século atrás, mas quem sai na frente é o filme da Regina King, “Uma noite em Miami”. Creio que as personalidades envolvidas, as discussões, as diversas camadas dos personagens tenham muito a nos dizer. Não à toa que o ator que fez Sam Cooke foi o indicado. O xadrez verbal e a excelência das atuações mostram que todos ali importam muito na construção do tema racial, só que há opções entre a ética da convicção e a ética da responsabilidade.

5) Na categoria Melhor Direção, não seria estranha a ausência de Spike Lee?

A Academia pune. Spike Lee tem um gênio difícil. Não se esqueceram do que ele fez ao não ter vencido o Oscar pelo filme anterior. Ele fez um filme brilhante, o primeiro sobre algo jamais abordado, a participação negra no Vietnã; o negro que vota no Trump, o peso do passado; a miscigenação que a guerra gerou – e as consequências para os filhos dos invasores americanos. É um dos seus melhores filmes, mais maduro. Mas pagou com a língua.

Chloe Zhao

6) Esse será o primeiro ano de Cerimônia do Oscar após o falecimento de Ennio Morricone. A relação entre a música e o cinema ganhou força para o Oscar 2021?

Morricone (“Os oito odiados”; “Era uma vez no Oeste”, “Cinema Paradiso”) fechou uma geração. Só falta o John Williams (compositor de “Tubarão” e “Star Wars”, dentre outros). Temos ainda Danny Elfman em suas colaborações com Tim Burton; Hans Zimmer, Alan Menkel. Mas acho que se perde aquela trilha que sobrevive ao filme, que tem vida própria. Bernard Hermann deu vida à Psicose. Morricone era o Oeste dos italianos. O que seria de “O Poderoso Chefão” sem Nino Rota ou dos filmes do David Lean, como Lawrence da Arábia sem Maurice Jarre ou Missão Impossível sem o argentino Lalo Schifrin? Os jovens não sabem, mas antigamente havia uma coisa chamada disco e se vendia disco só de trilhas sonoras. A trilha dos filmes da Disney ou a da Marvel são inesquecíveis? Não estou pessimista. Coisas boas surgem, mas a relação que você citou se diluiu. Tudo o que era música desmanchou no ar.

 

7) Por que Itália, França, Espanha e Alemanha estariam ausentes nas indicações de Melhor Filme Estrangeiro?

Não foi a pandemia. É triste para mim, amante do cinema italiano, ver o que os anos Berlusconi geraram naquela cultura. Eu dou aula de Cinema & Sociedade para os meus alunos e quando falo do Neorrealismo eles captam imediatamente a mensagem, alguns ficam curiosos, sabem que aquilo nos diz algo. Imagine um ladrão de bicicleta fazer um furto em um entregador do Ifood? Esse filme é perene. A Itália e a França – e nós, que você não perguntou – seguiram um caminho determinado pela TV (Fellini previu em “Ginger e Fred”) e o riso fácil. Comédias picarescas que temos que espremer com muita generosidade para dali sair algo. Uma França que perdeu um Truffaut e ganhou um François Ozon é muito duro. Espanha depende da criatividade do Almodóvar. Veja o catálogo da Netflix. Eles estão lá, dentro da fórmula que atenda os metadados. “A Casa de Papel” é uma série cheia de referências dessas escolas, os jovens desavisados, acham que tudo é Tarantino, mas Tarantino vem de Godard, de Sergio Leone, de Einsenstein. Porque os espanhóis não arriscam? A Alemanha é a mais feliz no seu cinema, tem seu festival, investe. Mas chamo a sua atenção. Assim como os romances policiais, o cinema dos escandinavos só tem melhorado. Dinamarca está lá merecidamente. 


 Maria Bakalova

8) Quais seriam suas “apostas” para Melhor Ator e Melhor Atriz seja na categoria principal e na coadjuvante? Por que?

Chadwick Boseman ganha por uma questão afetiva. Ele fez um belo trabalho, percebe-se que está doente, mas vai até o fim. Mas ele fez melhor em “Pantera Negra” e “Destacamento Blood”. Acho a atuação do Hopkins melhor, mais difícil, mais cheia de camadas. A bolsa de apostas coloca o jovem Daniel Kaluuya como o ator coadjuvante. Ele é muito bom, vimos isso em “Corra!” e em outras produções. Vejo um sucessor do Denzel Washington. Frances McDormand tem vencido tudo, deve ser a terceira vez a ganhar o prêmio, mas vejo poucas nuances de suas últimas interpretações. Uma excelente atriz. Basta ver Fargo ou Três Anúncios para um Crime ou Mississipi em Chamas para ver isso Viola Davis está no páreo, mas o trabalho mais difícil, na minha ignorância, foi o da Vanessa Kirby em "Pieces of a woman". A atriz coadjuvante deve ser um dos poucos Oscar de “Mank”, a Amanda Seyfried, que é uma aposta e ainda não fez harmonização facial, o que lhe dá mais tempo para fazer outras interpretações dignas. Minha favorita é a cara-de-pau Maria Bakalova, de Borat. Saber que essa jovem só entrou porque o Sacha Cohen tinha sido reconhecido e a entrada dela resolveu o filme, merecia. Agora, posso estar ranzinza pela pandemia, mas foi uma das piores seleções dos últimos anos, especialmente se há alguma pretensão em renovar o público. Tem filmes bons (“Os 7 de Chicago” é o meu favorito), mas os jovens vão preferir o Tik Tok a ver duas peças filmadas; um filme sobre aborto; outro sobre alcoolismo; a Hollywood dos anos 1940; os sem-teto nos EUA; ou ainda sobre Alzheimer ou outro sobre surdez. E a animação favorita é kardecista. Faltou leveza, mas há esperança. É ainda o rescaldo do último ano da gestão Trump.


quarta-feira, 14 de abril de 2021

EPÍSTOLA NÚMERO 1


 

De @velhoprotestante para @jovemevangélico

 

Por Eremildo de São Cristóvão (1)

 

Prezado jovem, que a Paz esteja contigo. E é sobre a paz o tema dessa epístola. Escreveu Paulo, em Efésios, especificamente no capítulo 6 e a partir do verso 10 podemos ver as orientações da Palavra de como devemos viver a relação entre dois mundos. O espiritual e o nosso mundo.

Ali, Paulo faz a famosa descrição da vestimenta dos cristãos de acordo com o que o autor de Efésios via dos romanos. Armadura, sandálias, espada, escudo, capacete. E, em uma poética analogia, Paulo transforma o que seriam símbolos da violência em instrumentos de luta espiritual. Nesse ponto, meu jovem, há uma referência há muito esquecida por nossos irmãos que protestam pela liberdade de culto que teria sido negada recentemente e nunca o foi, pois é cláusula pétrea da Constituição a liberdade de culto e de religião. Cabe a você, jovem evangélico, quem sabe no meio de livros de uma biblioteca, ensinar aos seus contemporâneos que o país que vivemos é tão rico, complexo e diverso que, quem criou essa cláusula pétrea foi um comunista ateu acusado de macumbeiro. Mas isso é em outra epístola, quem sabe?

A referência esquecida pelos cruzadistas que não estão de capacete, de sandálias, cinto, armadura ou espada – mas com uma camisa da seleção brasileira ou empunhando cartazes de idolatria que faria Baal ficar satisfeito – é que a luta dos cristãos não é contra carne e sangue. Não é contra o outro. Mas é contra as potestades, os dominadores dos mundos de trevas, aqueles que tem a maldade no mundo celestial. Nesse ponto, Paulo é claro. Fiquemos INABALÁVEIS depois de fazermos de TUDO.

Fé, estudo, Espírito, orações, súplicas, atenção, perseverança. Essa é a munição do autor de Efésio que estava preso em correntes. Coragem. Não é uma arma apontada, uma defesa de mais presídios, de uma verborragia indefensável nas redes sociais. Os espíritos maus que nos rondam tem poderes. Mas que agem por padrões de comportamento – e não devemos pensar só no mau que atinge o indivíduo – que estão num sistema do MUNDO.

E nisso, há o poder da potestade. A captura de formas de pensar e de agir que de tal forma uma pessoa cristã, pia, sábia, pode se despersonalizar no grupo do whatsapp ou do facebook e acreditar em remédios milagrosos semelhantes aos que Lutero tanto criticara há pouco mais de 500 anos. Temos as relíquias vendidas no mundo virtual. Do feijão ao voto. Do gargarejo com limão ao uso heterodoxo do ozônio. A potestade da ignorância urge em ser abatida. E sua geração tem um compromisso com isso, meu jovem. E além das orações, a perseverança nos estudos, no despertar coletivo, no fortalecimento das comunidades, no esclarecimento – Faça-se a Luz! – para aqueles que tanto necessitam para não caírem em discursos de ódio, alimento dessa potestade. Estudo e diálogo coadunados com as armas espirituais.

Outra potestade que nos assola é a fome. A fome derivada da negligência das autoridades políticas, da classe empresarial e até, jovem evangélico, de algumas igrejas. Os vendilhões do templo e os falsos profetas foram denunciados mais de uma vez por Jesus. A trajetória pública de Jesus tem uma coincidência que nos assombra. Sua primeira ação política – essa palavra no seu sentido mais amplo, jovem – é contra os vendilhões do templo. Essa também será a sua última intervenção antes do calvário. A desconfiguração do templo foi algo que incomodou o Cordeiro, que deixou sua mansidão e se irou, mas não pecou. Por que as igrejas abertas nesse momento pior do que ano passado? Não quero colocar os termos liberais do comércio. Vamos pensar diferente. Que tipo de intervenção várias igrejas poderiam dar em momentos pandêmicos, do poder das potestades da fome e da discórdia?

Jovem evangélico, já pensou quantas igrejas tem acesso à internet e que poderiam ajudar ou ter ajudado os jovens da rede pública a não ter tanta perda de instrução? Ou ainda, aquelas confecções que fazem bandeiras em épocas de eleição não poderiam ter seu uso para máscaras com um versículo, uma cruz? E somos humanos. Não multiplicamos os pães e nem modificamos o sabor do vinho. Mas qual tipo de arrecadação de distribuição pública de alimentos e remédios, de álcool e água, os vereadores e deputados cristãos fizeram com a administração pública para chegar o pão na casa de quem precisa?

Essas potestades nos tiraram a sensibilidade para uma média de 3 000 mortes diárias. Perdemos realidades diversas. A manifestação da potestade da morte está aí. O desemprego estrutural, onde auxílios não dão conta das necessidades diárias com essa alta do custo de vida. Há uma corrupção sistêmica e que está mais ligado ao mundo dos mercadores do que do mundo da política, jovem cristão. Há jantares ao meio da fome pedindo por portas abertas em corações fechados.

Essas potestades nos tiram a sensibilidade de pensar em famílias que não podem ficar em casa e não estão porque querem nas estações de trem, do BRT, não é uma aglomeração pela balada insensível dos jovens. Essas pessoas estão ali porque querem e precisam da sobrevivência. Jovem evangélico, porque quem se preocupa com o STF não questiona que menos de 30% do crédito para as pequenas e médias empresas não chegou porque esse dinheiro público ficou no sistema financeiro? Faça-se a luz, jovem cristão.

Vivemos em um momento de heróis. Abraão, Noé, Raabe, Abel, Davi, Samuel são os “heróis” da Bíblia. Mas temos um problema com a personagem heroica, meu caro jovem. O herói é amado por um lado e tem por consequência o ódio de outro. A polarização não deixa salvação e amor surgirem dessa forma. Nesse cenário os demônios ficam “desamarrados”. Jovem evangélico, demonstre que não adianta amarra a potestade no mundo celestial se a liberamos no nosso meio, que por onde age. Jesus ao repreender Satanás que estava em Pedro mostrou que agiu no mundo do aqui, do agora. E contra essa potestade é que somos chamados a enfrentá-la. No fortalecimento do poder do Senhor, mas também da lucidez, da verdade cuja  ciência é uma demonstração de Sua presença – “o médico dos médicos” – e acreditar que esse deserto que atravessamos no momento e entender que Jesus não grita nas praças, é o cordeiro, não é o mito do herói, é o santo de Deus. Precisamos nos separar como santos da intolerância, pagar o mal com o bem, se somos do Príncipe da Paz precisamos ficar separados, distanciados socialmente, conscientes do amor ao próximo. Recomendo orar e ação, teoria e prática para seguir a carreira e fazer o bom combate com estudo, perseverança, fé, corajosamente e com ousadia podemos lutar contra as potestades sem timidez, oração sem ação é pensamento mágico. Lembre-se que as igrejas medievais eram locais de oração e de conhecimento, de ação política e de generosidade.

 

(1) Doutor em Filosofia com a tese “Materialismo Dialético e Histórico nas Epístolas Paulinas”. Autor do ensaio – A Filosofia da Práxis no Apóstolo Paulo em breve publicação pela Ed. JUERP.

sexta-feira, 2 de abril de 2021

A POLÍTICA FORA DA QUARENTENA - NÚMERO 18


Manifesto, Entrevista de Lula e A Terra Prometida

Por Vagner Gomes de Souza

 

Foi uma semana que um “contragolpe” se fez realizar no silêncio das ruas por causa das restrições da ocupação das ruas nesse “Tsunami” da pandemia. A elite econômica da sociedade brasileira, aos poucos, se aproxima de realidade de que a política é fundamental para que as forças da produção tenham investimentos. O capital produtivo se deslocou do capital rentista após um ano de recessão econômica e falsas expectativas sobre um programa de reformas por trás do programa autoritário e conservador nos costumes da Presidência da República. O liberalismo econômico vocalizado por essa fração da burguesia precisa de se alimentar da vida dos consumidores para que seus lucros ampliem. Diante disso, o “Poder Moderador” das Forças Armadas foi colocado em “teste” na demissão do Ministro da Defesa Fernando Azevedo. Troca nas FFAA enquanto o Vice-presidente Hamilton Mourão se vacinava e garantia que o Exército pertencia a normalidade democrática.

O pior não ocorreu porque o Centro político ressuscitou mesmo que sem que tenha atores políticos em condições de melhor lhe fazer representar. Há um “arco” amplo de forças centristas que se deixaram seduzir pelo atalho da “antipolítica”, mas agora reocupa o espaço diversificado de uma oposição moderada que estava muito silenciosa até a volta da elegibilidade do ex-presidente Lula. Por outro lado, o mantra do “Impeachment” da Esquerda parecia um recurso a “cloroquina” política. A Democracia se consolida com a “vacinação” das alianças ampliadas contra os segmentos autoritários e obscuros que emergiram por muito de ressentimento e pela ilusão de alguns segmentos defensores de um individualismo liberal extremado que se faz pela defesa de posturas não civilizatórias. Expansão de bases sociais populares pela via do fator religioso esteve muito vinculado ao desejo de ter mais segurança para seus familiares. Mais indivíduo numa comunidade mercantil e menos limites civilizatórios do Estado Democrático. Hobbes soberano como um Deus no Livro das Revelações em aliança com as sutilezas de um Adam Smith com suas mãos armadas que controlam as periferias das grandes cidades nos grupos milicianos.



Se o Centro político reapareceu para impor seu ponto de equilíbrio, o “Centrão” também se faz cada vez mais presente para que relembremos nossa característica política muito dependente do clientelismo. A Democracia política consolidou numa Carta Constitucional com a presença de Roberto Cardoso Alves, pois o Brasil é um mosaico no qual as mudanças precisam ser construídas numa longa duração. A “nova geração” do Centrão aprende a trilha da sobrevivência pela “Guerra de Posição” do Orçamento com um olhar para a renovação do Parlamento em 2022. Com a moderação da sociedade, não toleram que uma nova onda de “vozes novas” da política reduza seus assentos quase que mantidos pelos resquícios de um feudalismo político. Esse é um “fio da navalha” que as forças democráticas devem saber atravessar na busca de desobstruir uma nova Transição Política em nosso país.

Então, precisaremos olhar para uma Terra Prometida que está ao fim de uma longa travessia. Nesse momento, o Manifesto assinado por prováveis presidenciáveis de 2022 em favor do compromisso com a Democracia divulgado é um ponto importante que as forças progressistas precisam saudar mesmo que tenha ocorrido um sectarismo na exclusão ao convite aos nomes do Partido dos Trabalhadores (Lula, Fernando Haddad ou Jacques Wagner). O tom do texto é relevante para demonstrar o quanto o isolamento político de Bolsonaro se faz presente, pois o deslocamento dessas lideranças políticas segue o sentido do eleitor de centro que precisa ser conquistado para essa nova etapa de ampliação da democratização. Mas deixemos os tópicos programáticos para mais adiante, pois é necessário ainda abrir o “Mar Vermelho” com o “cajado” da estratégia da Frente Democrática.

Moisés e Josué foram importantes na longa travessia rumo a terra prometida. Por isso, ouvir a entrevista de Lula no programa de Reinaldo Azevedo foi outro momento importante desse “contragolpe” para isolar as forças do obscurantismo. O Ex-Presidente fez uma grande sinalização ao relembrar da aliança que lhe fez vitorioso em 2002, a partir da indicação do empresário mineiro José de Alencar. Duas fortes referências para um posicionamento ao Centro da Política (o empresário liberal-democrata e o estado de Minas Gerais). Não foi o momento único em que Lula se colocou aberto ao Centro Político o que reforça a necessidade de um encontro entre o Grupo do Manifesto e o ex-presidente, pois não se deve fazer da Grande Política um reflexo dos cálculos eleitorais porque o fundamental é a derrota do inimigo comum. Enfrentar as “Pragas do Egito” nesse século XXI que assolam nossa nacionalidade. Ainda termos que ter muita imaginação ainda a se construir para fortalecer o campo democrático, que se fará com uma necessária mobilização da juventude para fora das posturas individualistas seja à extrema-direita ou na Esquerda. Superar uma tendência a uma militância juvenil burocratizada em movimentos sociais alheios aos ventos da moderação da política. Lula deu a receita ao abordar os assustadores números de desempregados que na juventude está em níveis catastróficos.  

quarta-feira, 31 de março de 2021

A POLÍTICA FORA DA QUARENTENA - NÚMERO 17


 

Lições sobre a Frente Democrática

Vagner Gomes de Souza

 

No ano da antipolítica, 2018, nas comemorações dos 30 anos da Constituição do Brasil, tive a lembrança daqueles anos marcados pela esperança na conquista da democracia e na superação das desigualdades sociais. Estávamos a 48 horas da realização do Primeiro Turno das Eleições Gerais em nosso país e a ansiedade era compartilhada por muitos ao meu redor em relação ao que estava por vir. Havia uma ausência de um balanço crítico das lições da derrota política do autoritarismo que se fez nas instituições democráticas numa sociedade conservadora.  Enfim, entremos num Segundo Turno sem debate programático que favoreceu uma onda da “nova política” que, na verdade, expressou os ressentimentos de segmentos sociais contrários a inclusão social.

Naquele momento, o legado da Nova República inaugurada na derrota da Ditadura Militar (1964 – 1985) através do corajoso comparecimento ao Colégio Eleitoral foi colocado em risco. Os desdobramentos dos fatos políticos dessa semana confirmam essa percepção. Em décadas de negociações, os indicadores sociais foram melhorando e uma pluralidade de leis consolidaram direitos para muitas pessoas simples. A elite econômica se deixou levar pelos cânticos da “sereia do autoritarismo” numa manifesta intenção de resolver o custo Brasil com a imposição da flexibilização. Mais mercado e menos valores democráticos.

Essa é a oportunidade de dialogar com amplos setores sobre a crise da representatividade em que o país se envolveu desde as jornadas de 2013. Os germes da metamorfose da política brasileira não teriam sido captados em sua profundidade. Começou um lento esvaziamento do Centro Político brasileiro manifestado numa polarização eleitoral instrumentalizada pelos seus principais atores políticos em 2014. Em seguida, a Operação Lava Jato (com fortes desdobramentos no Rio de Janeiro) permitiu que a mídia pavimentasse um processo de desqualificação da política. Emergiu a figura de um “tenentismo togado” a procura de um ator político que sintetizasse através da manifestação da fúria do voto.

O processo eleitoral em curso no Brasil tem semelhanças com os casos estudados por Manuel Castells em seu livro “Ruptura – A crise da democracia liberal” lançado em 2018. Os efeitos da crise econômica mundial alimentam a crise da legitimidade das forças políticas em curso. Aqui, a queda eleitoral das forças do Centro permitiu a emergência de forças obscuras de um passado que se considerava superado. Os conservadores se oferecem como alternativa fazendo a releitura da centralização política e como possibilidade de viabilizar a concentração da renda. Esses setores de linha reacionária sempre existiam às margens da política brasileira sufocados pela prática da política de um Centro comprometido com a democracia.

As mudanças na sociedade efetivadas pelas conquistas democráticas vivem esse risco de sofrer retrocesso diante das manifestações do voto de fúria. Os trabalhadores têm seus direitos ameaçados e precisam realizar alianças com outros segmentos da sociedade. Essa ponte era feita pelo Centro político que agora se faz necessário renascer das cinzas da política nacional. Os quadros políticos do liberalismo democrático ainda sobrevivem em muitos setores e precisamos dialogar com eles. Não é fácil numa época de informação em rede praticamente instantânea fazer uma opinião democrática prevalecer. Contudo, é tempo de reinventar a Frente Democrática que enfrentou a Ditadura Militar demonstrando que o discurso simplificado do “Nós contra Eles” está a serviço da elite econômica.

A Frente Democrática articula forças políticas e da sociedade na defesa da Democracia e a favor de reformas que beneficiem um gradual processo de distribuição de renda. A linha do desenvolvimento econômico com mais conquistas sociais sustentam um amplo “pacto na sociedade”. Seriam equivocados aqueles que limitem o debate da Frente nas negociações eleitorais. O tema eleitoral é precedido do tema político maior que sempre será o aprofundamento das instituições democráticas. Portanto, o recente discurso do Ex-presidente Lula mobilizou pontos de unidade com o centro político que não podem ser desprezados pelo sectarismo seja de qualquer coloração.

 

Nota: esse é um artigo atualizado a partir de “Lições sobre a Frente Democrática” que está originalmente publicado em meu livro A sagrada política / Vagner Gomes de Souza. – 1.ed. – Rio de Janeiro: Albatroz, 2019. Pp. 64 – 66. Houve uma motivação diante de uma nova geração de jovens que me perguntam o que seria essa Frente.

quinta-feira, 18 de março de 2021

TEXTOS DA JUVENTUDE


                                                       Qual é o valor da morte?

Por Lucas Soares

 

”A vergonha já é uma revolução; [...] Vergonha é um tipo de ira voltada para dentro. E se toda uma nação realmente tivesse vergonha, ela seria como um leão que se encolhe para dar o bote” (MARX, 2015, p. 14).

 

“Não se humaniza a vida numa sociedade como a nossa sem conflito”. Foram estas as palavras proferidas pelo líder religioso e membro da Pastoral do Menor da Arquidiocese de São Paulo, Júlio Renato Lancelotti quando tomado por críticas e ataques do campo reacionário, derivadas de suas ações assistencialistas em prol dos moradores de rua, em setembro de 2020, na cidade de São Paulo. Curiosamente, sob aquele mesmo contexto, encontrava-se o Brasil otimista em virtude do segundo mês de involução nos números de óbitos pelo vírus que devastava todo o mundo e colocava em xeque, como em uma partida de xadrez, peões e reis.

 Oposto ao jogo de origem asiática onde elementos inanimados do exército, separados em dois segmentos, batalhavam por posições no tabuleiro em prol da vitória de seus respectivos reis, o novo contexto pandêmico, ao contrastar peças políticas de forças nada equivalentes, evidenciava cada vez mais um velho dilema: Quem deve sobreviver? Os Peões  ou os Reis; A Grande Burguesia ou o Trabalhador; A economia ou vida; Seriam estes, utilizando a categoria de Georg Lukács, existências reificáveis? Existia mesmo uma linha tênue entre os pólos? Era realmente preciso salvar um, ao preço da morte do outro? Analogias e questionamentos à parte se sabem que hoje, seis meses após a declaração do muitíssimo bem intencionado pároco da pequena Igreja São Miguel Arcanjo, decidiu-se, no bojo de declarações das autoridades federais, dotadas de omissão e negacionismo ao conhecimento científico, por uma política pública desumanizante que tenta desastrosamente dar vida ao mercado e ao “empreendedorismo tacanho” enquanto transforma em números a morte de milhares de seres humanos.

Exposta a catastrófica e fúnebre conjuntura a qual nos encontramos, realinhemos nosso foco ao que motiva a declaração de Júlio Lancelotti  e consequentemente traz a tona nossos questionamentos: A defesa da vida. O que a sociedade civil, respeitando as respectivas impossibilidades de nossa realidade pandêmica, tem mobilizado para efetivamente conflitar essa sociedade que, como dissera Rousseau, mais se assemelha a uma “selva habitada por feras selvagens”? A reabilitação do amor ao próximo, - sentimento assiduamente presente nos sermões e ensinamentos de um importante personagem histórico – quase uma utopia frente à ideologia individualizante do neoliberalismo, deve servir como a base da retomada pela valorização da vida e para o enfrentamento das contradições resultantes do processo reificante dos setores que não estão protegidos pela invisible hand, resultando, sendo assim, em incontáveis mortes chanceladas por um discurso de irresponsabilidade teórica e por seguidas demissões no cargo que deveria capitanear as gestões de risco e, sobretudo, salvar vidas.

Por fim, reitero a necessidade do compromisso com a defesa do Sistema Único de Saúde, como política pública de caráter social; com a manutenção da autonomia e dos investimentos nos institutos públicos de pesquisa; e na seguridade da fraturada democracia que vez ou outra se encontra em ameaça da “cadela do fascismo” que, segundo o dramaturgo Bertold Brecht, está sempre no cio.

quinta-feira, 11 de março de 2021

TEXTOS DA JUVENTUDE


 Imagem da Força Expedicionária Brasileira (FEB)
Vencendo o Fascismo na Itália na Segunda Guerra Mundial

A união faz a vitória.

Por Tariq Bastos de Souza

 

Embora haja uma exaltação, nos dias de hoje, quanto ao papel dos Estados Unidos na Segunda Guerra Mundial, é indubitável que o fator decisivo para a derrota do totalitário Eixo foi a existência dos Aliados. Esta união de países, dentre eles União Soviética, França e Brasil, se destacou dos seus rivais por conta do bom gerenciamento dos bônus e ônus de cada integrante, do suporte material e emocional, e da esperança existente neles, bastante escassa naqueles tempos. Nenhuma dessas vantagens existiria sem a união das forças de cada membro do grupo.

Um dos fatores que manteve eles juntos foi a esperança, sentimento necessário em momentos de opressão. Este estado emocional é capaz de manter vivo a ideia de dias melhores, por mais difícil que seja o cenário, servindo assim como força para fazer mudança na configuração do presente. Por essa razão, regimes ditatoriais fazem uso do medo e desespero com o intuito de minar as pretensões contra o sistema, podendo chegar até a mesmo a tortura e manipulação, a exemplo da obra 1984, onde o protagonista Winston Smith é torturado pelo Partido, com o intento de quebrar qualquer pensamento oposto ao do mesmo.

Nesse contexto, gerenciar as atuações da resistência é crucial para a sua sobrevivência, assim como para a esperança e unidade do grupo, sempre posta em xeque quando há intensa repressão. Para isso, é importante saber os pros do grupo formado, porque a vantagem de unir pessoas diferentes é juntar suas habilidades distintas para melhorar qualquer empreitada, seja ela um ataque direto, seja um ato simbólico para aumentar o ânimo do time.

Portanto, fica claro que sozinho não há como vencer a opressão, sendo importante o trabalho em equipe, tanto para organizar as forças resultantes da união, quanto para manter a resistência viva, através da manutenção da esperança. Mostrando assim, o quanto reservar o mérito da vitória há uma coalizão de países é o certo.

 


O DISCURSO DE LULA


 O SALTO DO SAPO PARA O CENTRO POLÍTICO?

Por Vagner Gomes de Souza

Um escritor e diplomata escreveu certa vez que o sapo pula não por boniteza mas por necessidade. Na política estamos reféns dos erros de uma fratura da política no qual a "Lava Jato" foi sua fonte. O centro político foi cooptado por uma "facção" da burguesia retrógrada com um discurso anti-sistema. Personagens do fundo pantanoso de nossa política emergiram como se estivessem acelerar o atraso sem se importar para as desigualdades sociais. Segmentos da sociedade emergiram com a proliferação de uma vertente liberal americanizada no seu fundamentalismo religioso e de costumes. Seja à Direita como também à Esquerda pós-moderna. Uma falsa polarização pois tudo se resume em ocupar um espaço no mercado das escolhas individuais. O empreendedorismo militante das redes sociais de cada dia em poucos momentos se referem a necessidade de superar a pobreza através dos valores da República. Uma agenda de liberalismo pelos usos do Hobbes entranhados numa exposição de um país que necessita um afastamento dos "lobos" à margem da globalização. Uma sociedade de ressentidos se formou pois venderam a ilusão de uma "nova classe média" como se essa fosse formada pelo perfil de seu consumo. Mais mercado e menos democracia foi um "vírus" que alimentou muitas variantes a mediada que a economia se foi deslocando da política. 
Sem o sentido da República o liberalismo no Brasil se perverteu num mosaico de segmentos e pautas para além das bases dos trabalhadores. O neoliberalismo subiu a partir das bases da sociedade diante do esvaziamento do centro político por falta de ação do campo democrático. O Campo Democrático com uma agenda social e transformadora que inseriu esse país num longo ciclo de crescimento social. A imagem da derrota da Copa do Mundo em 1950 é a melhor metáfora que não se pode desistir de se fazer cumprir uma necessidade da humanidade. Qual seria? A humanidade precisa de nosso país como o ponto de equilíbrio nas relações internacionais. Entre 1950 e 1958 houve o tiro no coração de um Presidente acusado de crimes de responsabilidade e corrupção em 1954. Há sempre bons exemplos em nosso história para que se perceba nossa capacidade de invenção política. Sempre avançamos em benefício de todas e todos através de uma ampla frente política. Os mais "fechados" poderiam questionar a ausência de ganhos maiores, porém nunca citam exemplos dos ganhos de suas vias sectárias.
Então, a pandemia emergiu em nosso planeta num momento em que muitas lideranças críticas da democracia se posicionavam na chefia de Governos como foi a experiência de Donald Trump nos EUA. Lá se percebeu que a derrota dessa americanização pervertida do ressentimento social exigiria a busca da moderação. Em nosso país, o Parlamento voltou a ser um espaço do debate da política que muito bem reflete o perfil de nossa população. Não foi omisso no debate do Auxílio Emergencial no ano passado e não se curvou para as tentações de rasgar as conquistas sociais da Educação e da Saúde presentes na proposta de Paulo Guedes na PEC 186. Todavia a oposição ao Governo Federal passa por um longo período de "apagão político" diante a postura eleitoreira do debate colocado até por setores do mercado. A calamidade da saúde está presente a cada dia nos números de óbitos e novos contaminados. A calamidade do desemprego está presente na falta de investimentos públicos. O "teto de gastos" caiu sob as cabeças dos mais pobres empurrando muitos para baixo dos limites da miséria. 
Foi nesse momento que o ex-Presidente Lula convocou uma coletiva a Nação para se pronunciar sobre diversos pontos. Todavia, o principal em seu discurso foi o tom que negou o ressentimento e a abertura para o diálogo com todas as forças políticas nos quais receberam a confiança do eleitor brasileiro. O discurso foi para além das fronteiras de um Partido pois se pautou pela necessidade de buscar uma saída democrática para esse momento. Não se deve antecipar futuras posturas eleitorais, mas exigir que haja um avanço na articulação do entendimento nacional que isole as forças questionadoras da Ciência e da Democracia. Devemos pressionar para que um programa comece a se desenhar articulado por uma Frente. 

quinta-feira, 4 de março de 2021

A POLÍTICA FORA DA QUARENTENA - NÚMERO 16

 

Apagão da Oposição

Por Vagner Gomes de Souza

 

Não estamos na “segunda onda” da Pandemia, mas apenas num possível começo de um “Tsunami” de contaminações de COVID19. O Ex-ministro da Saúde Luiz Henrique Mandetta já alertava para essa possibilidade há semanas atrás.  Então, vieram os números do PIB de 2020 com o terceiro maior tombo da nossa história recente. O desemprego em níveis de 14 milhões não sugere que vai recuar. O retorno às aulas presenciais se faz como se o conteúdo fosse o mais importante para inúmeros jovens em elevado índice de vulnerabilidade (abrem-se as escolas sem que se abram as mentes para essa reflexão). A vacinação é lenta e praticamente as doses são racionadas enquanto que o Ministro da Saúde anuncia uma “chuva de vacinas” para depois de julho. Não temos ainda um Orçamento Federal para o ano de 2021 aprovados. E o valor de R$ 250 para o auxílio emergencial nos faria questionar: o que melhorou nesse cenário para que se defenda a queda de R$ 350 do valor anterior? Ainda mais diante de uma carestia dos produtos da cesta básica em que muitos mencionam a situação do bolso caro.

Muitos analistas sugeririam que esse seria um momento favorável a Oposição ao Governo Federal. Então, por que não se observa a consolidação do programa de oposição? Em primeiro lugar, não nenhum programa de oposição consensual que possa motivar a ascensão da pluralizada opinião refratária ao Presidente Bolsonaro. Há uma autonomeada “oposição responsável” que é refém de uma “agenda liberal” fiscalista observando um Ministro da Economia politicamente esvaziado. Esse segmento é tímido ao combate aos impactos da pandemia em seus governos locais porque deseja disputar uma base “radicalizada” do Governo, por exemplo, no tema das atividades religiosas como essencial (curioso serem isentos no pagamento de impostos que poderiam ser investidos na saúde pública). Por outro lado, se abriu uma busca do melhor nome para derrotar o mandatário federal. A fulanização da política favoreceu ao mesmo, pois sempre consolida seu grupo de fieis apoiadores. Enquanto isso, a oposição se definha em debates internos e ressentimentos que não priorizam salvar as vidas.

Onde estaria o Centro Democrático? Esse é a pergunta daqueles que defendem uma Frente de Esquerda que se baseia nas contradições do centro político fraturado desde as eleições de 2018. Faz-se um profundo silêncio sobre a aliança vitoriosa nas eleições presidenciais 2002, pois a fulanização seria o “anticorpo” desse sectarismo. A muito de sebastianismo político vintage nas articulações de uma política eleitoral antecipada enquanto ameaçamos chegar a números acima de 2500 óbitos por dia por COVID19. Ninguém defende ao menos um Manifesto de Unidade nos pontos referentes a pandemia pois tudo pode soar como “abertura da oportunidade” de ser a cabeça de chapa de uma disputa eleitoral. Não se pode condenar a omissão da sociedade sobre muitos aspectos dos protocolos sanitários uma vez que a população pobre foi deixada abandonada por uma ampla lista explorações estrutural. Não se combate a desigualdade social, mas se faz oposição a um suposto mal de origem de nossa História. O desempregado ficou em segundo plano. A pobreza está na periferia daquilo que chamam “narrativas”.

Mais do que dialogar com o centro político, muitos segmentos da Oposição de Esquerda ficou relembrando contradições das gestões passadas. As pontes da costura política sempre são dinamitadas nas redes sociais. Todos tem um demônio moralista da “lava jato” em sua mente. A população empobrece a cada instante. Contudo, estamos com uma grande pobreza de lideranças políticas que preferem viver um mundo de stories e imagens para demonstrar trabalho. Falta demonstrar a política de Frente Democrática. Aliás, essa é a verdadeira denominação para evitar os desvios esquerdistas possíveis naqueles que falam numa Frente Ampla.

Em que essa estratégia política ainda teria validade nesses tempos? Sugerimos que não foi Bernie Sanders que conquistou a indicação do Partido Democrata em 2020 porque todo esse mundo polarizado só se supera com a “moderação da política”. A Frente Democrática tem o poder de fazer uma política de unidade dos segmentos da sociedade com as inúmeras forças políticas a partir dos valores da República. A coisa pública está acima do empreendedorismo econômico e da política. Devemos fazer essa Frente se tornar realidade no debate do cotidiano da sociedade e no parlamento. Os interesses precipitados de 2022 deu um fôlego ao fisiologismo político no Congresso Nacional. Só a ideia de República para recolocar temas urgentes da sociedade. Por exemplo, não se fala numa seguro desemprego ampliado e nem da necessidade de ampliação dos valores da multa nos casos de demissão sem justa causa. A oposição vai sair desse apagão no momento em que a Esquerda deixar as eleições do próximo ano em segundo plano. Urgente é cuidar das trabalhadoras e trabalhadores sem trabalho.

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2021

A POLÍTICA FORA DA QUARENTENA - NÚMERO 15

 


O Diesel é Nosso

Vagner Gomes de Souza

 

O liberalismo brasileiro sempre conviveu com um “DNA” distante da ortodoxia. A intervenção dos Governos da Primeira República para a valorização do preço do café é um exemplo que os arautos da imprensa se esquecem nesses dias que procuram reviver o conceito de populismo. A militarização da PETROBRAS sugere, que sem qualquer programa econômico claro, o Governo simplesmente não deseja perder as eleições presidenciais. Seus limites seriam nessa manifestação da Hidra de Lerna em relação aos temas econômicos.

O Ministro da Economia Paulo Guedes se assemelha ao jogador de futebol no meio de uma roda de bobinho. E o mercado é a bola imaginária. Se muitos articulistas gastam inúmeros artigos para buscar decifrar as ações do Presidente da República, o maior desafio seria compreender o “dilema do prisioneiro” o qual sua equipe econômica ainda se vincula ao grupo hegemônico do Governo. Provavelmente a ausência de conteúdo programático em pauta desde a campanha eleitoral seja a melhor explicação. Nada se faz para superar uma crise econômica que se agrava com o aumento da desigualdade social. Então, temos uma política econômica ausente e sem compromisso com o investimento público. A “reserva moral” do compromisso com um ajuste fiscal que se faz no imobilismo.

A simplificação do uso do conceito de populismo para a “intervenção pessoal” do Presidente na política de preços da PETROBRAS é um desvio dos analistas. Melhor seria problematizar que nossa economia não está crescendo e que o desemprego se consolida com características crônicas. Não há interesse em ampliar os gastos públicos nem em saúde ou educação. O liberalismo sem compromisso com os valores humanos da vida está presentes nesse Governo. Aquilo que chamam de retórica “populista” é campanha eleitoral antecipada. Fazer uma oposição liberal ortodoxa em favor dessa ortodoxia empurra muitos articulistas da imprensa para um “deserto de ideias” diante dos impactos sociais da pandemia.

O Governo reforçou seus laços políticos com o “Centrão”. Escrevo REFORÇOU pois o Onyz Lorenzoni nunca foi um expoente do reaganismo no Brasil ou um Rui Barbosa do século XXI. Portanto essa aliança foi reforçada num projeto sem programa para a sobrevivência política e eleitoral de inúmeros segmentos políticos que se abrigam nas famosas bancadas do Congresso Nacional. Sem programa político claro, vivemos um “presidencialismo de cooptações”, ou seja, cada votação se coopta um grupo para sua manifestação. Nesse quadro político fraturado, ainda questionam a ausência de um centro político coeso com o compromisso democrático. Lembremos que ele foi destruído pela polarização política no qual os partidos de esquerda permitiram alimentar.

As manifestações eleitorais de 2020 sugeriram a moderação da política brasileira. Contudo, o centro democrático será reestruturado somente por um programa que tenha suas referências na Carta de 1988. Uma tarefa que deve ser feita com a provocação de uma política de alianças feita pela Esquerda, pois foi assim que chegamos a Constituinte de 1986/1987. A “roleta russa” do debate pré-eleitoral não permitiu ainda o gesto da renúncia pelo programa, pois esse é o grande ausente até na Esquerda. Não se debate mais política porque logo se CANCELA o possível aliado. Uma simplificação alimentada pela ortodoxia dos valores liberais no campo da esquerda, que renderia outro artigo.

terça-feira, 22 de dezembro de 2020

GRANDE POLÍTICA EM VERTIGEM


 

A Família em Vertigem

Por Pablo Spinelli

Vagner Gomes de Souza

 

“Palavras não bastam, não dá pra entender

E esse medo que cresce não para

É uma história que se complicou

Eu sei bem o porquê

Qual é o peso da culpa que eu carrego nos braços

Me entorta as costas e dá um cansaço

A maldade do tempo fez eu me afastar de você (...)”

A Noite – Tiê

 

A Pandemia do COVID19 destruiu muitas famílias com a injustificada antecipação de muitas perdas de vidas que pode ser responsabilizada pelos governantes que deviam zelar pelas famílias brasileiras. Essa não é uma contradição uma vez que é a burguesia que aboliu os laços familiares na Revolução Industrial, conforme antigo Manifesto. As crianças exploradas e definhando no espaço fabril do século XVIII tinha como meta que a economia não poderia parar. A economia já estava parada no raquítico 1% do PIB quando muitas famílias foram confrontadas com a realidade de uma emergência sanitária. Sem os elos da qualidade na educação diante da asfixia das escolas fechadas sem uma alternativa democrática de acesso ao ensino remoto, os laços familiares passaram por abalos mais do que tectônicos que pela via da antropologia abraçou a rota do conformismo nos “tumbeiros” das periferias.

A família e seus valores se arruinaram ainda mais com a precarização do mundo do trabalho. A via do trabalho massificado nas entregas por aplicativos e nos deliverys atomizaram ainda mais nossos laços sociais. A uberização de nosso país dava saltos largos. A família estava mais disciplinada para promover o “distanciamento social” no momento das comemorações da Páscoa e das Mães. Todavia, ao se negar a educação só houve a viralização do negacionsimo da ciência diante da ilusão de que não se deve temer aquilo que não se vê porque há um “ser supremo” que não se vê e está a zelar por todos. Era só o “orai” sem o “vigiai”. E no meio desse caminho há um Messias que deu um outro olhar para o que seria o empenho na defesa da família, basta ver seu silêncio para a família do senador do Rio de Janeiro que o apoiara na eleição onde ambos ganharam. O americanismo conservador de Roberto Da Matta foi se impondo aonde aquilo que se mostra uma “casa” das redes sociais desconectada com a realidade de miséria que se observa nas ruas.

As “famílias dos coletivos” teriam valores mais invejosos que Caim ao decidir matar Abel por desejar um reconhecimento do Criador. José foi vendido como escravo no Egito antigo pelos irmãos, mas soube fazer a reconciliação pois no centro estava a palavra AMOR. Antes, Noé anunciou a vinda do dilúvio para os negacionistas daquele mundo que se foi em água. Em sua arca reunia familiares e buscou salvar vidas. Enfim, eis esses primeiros exemplos para que não se espalhem as “fakenews” de que estamos a fazer um longo texto contrário aos ensinamentos do cidadão cristão do bem. Entretanto, os contágios dos atalhos dos interesses mal compreendidos levaram a essa situação no qual as famílias precisarão escolher em retomar o distanciamento social em pleno Natal. Uma vez que a ideia de uma Quarentena ou lockdown (que nunca houve no Brasil) ganhou espaço no imaginário dos jovens como um longo tempo de nada se fazer e algo a pegar, seja covid, seja uma bicicleta para entrega, seja uma arma ou uma bíblia que não seria aberta e estudada. Pesquisemos nas redes sociais, mais uma vez, que esse foi um roteiro que aos poucos virou consenso nas cabeças dos jovens ao contrário de se fazer o ensino da disciplina da paciência. Imaginemos essa juventude diante do cerco a Stalingrado em plena Segunda Guerra Mundial. O que fariam os jovens?

As famílias doloridas estão diante de uma tomada de decisão entre a celebração do material ou fazer viver a vocação do AMOR para se distanciar de seus entes queridos nessas comemorações de fim de ano. Foi nesse espírito comovente que a animação “A Vida é uma Festa” foi revista por nós por um veículo identificado com uma matriz do imperialismo cultural (a outra face do malfadado “marxismo cultural” paranoico) – o canal da Disney. Não perderemos mais palavras com esse falso debate “decolonial” pois o fundamental é a inserção do campo democrático no acolhimento da questão familiar. Sua melhor base jurídica está na sempre atacada Carta Constitucional de 1988 no qual o Artigo 226 define “A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado.” Esse é um elo que os descaminhos econômicos ultraliberais de Paulo Guedes ameaçam. Assim, se introduz nossa leitura dessa animação com “cores” muito adultas.

Além da morte “morrida”, termo do nosso Nordeste, a produção do diretor Lee Unkrich, há a abordagem de um tema que destoa das mortes das produções Disney e mais próximas do universo Pixar (vide Up – Altas Aventuras): a morte da memória. Os idosos precisam ser revividos e os mortos lembrados – mas, como em texto célebre de Marx, não podem nos governar -, um dos alvos preferenciais do capitalismo do século XIX adotado pelo atual governo federal e referendado pelos jornalistas de opinião em canais cujos patrocinadores são do...sistema financeiro. Agora, como trazer mais leveza num contexto de morte e perda? Música, algo que remetemos às lives para aqueles que têm acesso à internet nesses dias de pandemia. A animação mostra que a música pode ser tão universalista quanto o cristianismo; ao invés de um particularismo, o infinito universal que conecta por pétalas o mundo dos mortos com o mundo dos vivos em uma harmonia melhor que a dicotomia desses espaços na excelente animação A Noiva-Cadáver, de Tim Burton. Nesse final de ano, onde parentes estão distantes, o décimo-terceiro dos funcionários do Rio de Janeiro, ausente e um governo federal que tem vários esqueletos nos armários rachados; doentes com ou sem leito; idosos com ou sem aposentadoria; crianças sem escolas; a ciência e Jesus cantam: Lembre de mim!

quarta-feira, 9 de dezembro de 2020

A POLÍTICA FORA DA QUARENTENA - NÚMERO 14


Desafios para a Juventude

 

“(...) Quem não se submete a uma disciplina política é precisamente matéria em estado gasoso, ou matéria poluída por elementos estranhos: portanto, inútil e prejudicial. A disciplina política faz precipitar estas impurezas e fornece ao espírito sua melhor liga, fornece à vida uma finalidade, sem a qual a vida não vale a pena ser vivida. (...)”

Disciplina e liberdade. Antonio Gramsci 1917

 

Por Vagner Gomes de Souza

Há um ensaio que o pensador italiano Antonio Gramsci escreveu para a juventude sob o título Disciplina. Um curioso texto uma vez que o marxista sardo mencionava R. Kipling (um ilustrado pensador inglês que dialogava com a colonização). Nele, ao contrário de buscar a “desqualificação” do criador de Mogli, se faz uma inversão de sua leitura sobre a sociedade hierarquizada, pois parte do reconhecimento da modernidade da organização do Estado Burguês para conferir a juventude uma cobrança pela sua liberdade de forma disciplinada. Um texto que mereceria fazer parte de muitas aulas da graduação de Administração, porém se encontra “perdido” para poucos gramscianos.

Disciplina está num conjunto de textos que foram publicados, sem assinatura, em La cittá futura (número único editado pela Federação Juvenil Socialista do Piemonte, 11 de fevereiro de 1917). Observe-se que Gramsci estaria sugerindo, num excesso de otimismo comum a sua fase juvenil, um grande futuro para a humanidade a partir da articulação da juventude com a cidade. Eis que a Revolução de Fevereiro batia as portas da Rússia czarista, mas a “Gripe Espanhola” ainda não se anunciava. Nessa linha poderíamos fazer um convite aos jovens cariocas para um grande desafio diante do momento grave em que estamos a atravessar. O Rio de Janeiro está numa grave crise econômica e social que se aprofunda nessa pandemia em que as “ondas” destroem qualquer interesse dos agentes econômicos privados em fazer investimento. Aliás, a limitada capacidade de investimento do capital privado impõe uma visão que se aproxime das sugestões de André Lara Resende em seu recente e pouco lido livro pela esquerda carioca e nacional (Consenso e contrassenso: por uma economia não dogmática).

Os desafios para a juventude partem da alarmante informação de que 1 em cada 3 jovens nem trabalham e nem estudam. Esse número se agrava nas comunidades da periferia assoladas pelo ultraliberalismo vindo de baixo. Os canais de solidariedade ensinados por Durkheim poderiam permitir uma conexão com o papel libertador da disciplina atribuída em Gramsci. “(...) Porque é essa a característica das disciplinas autonomamente assumidas, ou seja, a de serem a própria vida, o próprio pensamento de quem as observa. (...)” – Gramsci, Antonio – Escritos Políticos, vol. 1 (Organização e tradução de Carlos Nelson Coutinho). Rio de Janeiro, Civilização Brasileira, 2004, p. 89.

Na ausência de atores políticos deslocados do eleitoralismo (uma característica que incomodava o jovem Gramsci), partir do desafio em superar a chamada geração “NEM-NEM” carioca é muito ousadia mesmo na futura gestão municipal do Rio de Janeiro com os holofotes dirigidos para a Secretaria Municipal da Juventude e a Secretaria Municipal da Educação com a indicação de dois jovens que estariam na faixa etária dos jovens dirigentes da citada Federação Juvenil em 1917. A lição da história, o qual Walter Benjamin nos chama a atenção, sugere que as contradições entre forças produtivas e relações sociais de produção chegam a níveis caóticos numa realidade de muitos jovens que acumulam elevados níveis de “analfabetismo funcional”.

Por que o “analfabetismo funcional” é uma grave característica na juventude carioca? Essa seria a chave para repensar a gestão pública juvenil em nossa cidade uma vez que baixa interpretação de leitura, dificuldade nas operações básicas de matemática e desconhecimento dos principais conceitos sobre a vida alimentam muitas ações “negacionistas”. Muitos especialistas têm estudos mais profundos sobre esse tema nas instituições universitárias cariocas. Aqui temos a PUC, UFRJ, UNIRIO e UERJ para ficar nos exemplos mais famosos. Reverter essa situação é o primeiro passo para superar outros grandes desafios.

Contudo, não podemos nos iludir do quanto esse desafio requer muito investimento público para no mínimo uma década. Por outro lado, a modernização conservadora pressionada pelas forças do dito “mercado” não deseja que se pare muito tempo para reflexões e ações. Vai se exigir muita disciplina dos sujeitos juvenis que se inserem na futura administração municipal para que tenhamos um compromisso para resgatar vidas. O resgate de vidas esquecidas e nem sempre presentes nas estatísticas que só aparecem nos momentos das tensões da violência policial que atingem crianças e jovens da periferia. 

quinta-feira, 3 de dezembro de 2020

A POLÍTICA FORA DA QUARENTENA - NÚMERO 13


 

O Partido de Narciso

Por Vagner Gomes de Souza

 

Narciso é um personagem da mitologia grega que muito se assemelha as análises de conjuntura feitas pelos dirigentes do Partido dos Trabalhadores após as eleições municipais de 2020. A vaidade é representada nele. Ele teria nascido com uma grande força atraente, porém foi aconselhado por Tirésias a não admirar sua beleza. Todavia a beleza foi acompanhada pela arrogância e o orgulho. Nunca se apaixonou pelos outros que o admiravam e ficou perdidamente apaixonado pela sua beleza refletida num lago. A Ninfa Eco, por não ser correspondida em sua paixão, lançou um feitiço que o fez definhar olhando sua imagem no lago até a morte.

Diante da gravidade da conjuntura nacional no ano de 2020, os dirigentes do Partido dos Trabalhadores pretendem debater suas diferenças internas observando seus resultados eleitorais. Como se fosse o Narciso se admirando no lago, os dirigentes dessa agremiação partidária do campo reformista democrático perdem escrevendo linhas sobre números comparativos dos votos conquistados, prefeituras conquistadas, total de habitantes de prefeituras conquistadas ou de vereadores eleitos. Como se as contradições das classes sociais estivessem expressas nas linhas eleitorais. Um partido político é simplesmente uma fração da sociedade brasileira ainda mais num sistema partidário muito diferente tanto do “modelo europeu” e também do “modelo norte-americano”. Assim, os números refletem os gostos do narcisismo como “falsete” de análise política.

Nada nos opomos ao necessário balanço partidário que se faça de um processo político que foi histórico por ter ocorrido numa situação de pandemia. Na época da Gripe Espanhola uma expressiva massa de brasileiros não eram cidadãos ativos numa República oligarquizada que adotava um liberalismo ortodoxo na economia. Fazer esse balanço é muito importante a partir da percepção da correlação das forças políticas e sociais que estão em movimento em plena mutação de nossa estrutura econômica. As capitais brasileiras definham sua sustentabilidade econômica por terem se transformado em espaços urbanos de serviços sob o impacto recessivo da pandemia. A precarização do mundo do trabalho nas capitais sugere muito da natureza de uma possível derrota eleitoral de um partido que se diz representante dos trabalhadores. Todavia, os dirigentes do Partido alimentam seus argumentos com a arrogância e a vaidade para se realizarem lutas internas paralisantes.

Numa negação do conhecimento do mais básico marxismo de um Plekhanov, individualizam os resultados eleitorais do Partido. Seria de bom tom que se aproximassem desse ensinamento daquele que um dia inspirou Lênin. “(...) Mas, nenhuma outra particularidade provável garante a pessoas isoladas o exercício de uma influência direta sobre o estado das forças produtivas, e, por conseguintes, nas relações sociais por elas condicionadas, isto é, nas relações econômicas. Um dado individuo, quaisquer que sejam suas particularidades, não pode eliminar relações econômicas determinadas, quando estas correspondem a um determinado estado das forças produtivas. No entanto, as particularidades individuais da personalidade tornam-na mais ou menos apta a satisfazer as necessidades sociais que surgem em virtude de relações econômicas determinadas ou para opor-se a essa satisfação.(...)” (O papel do indivíduo na História). Essa longa passagem demonstra o quanto é um equívoco projetar 2022 a partir de um indivíduo que já foi Presidente da República 20 anos depois de sua primeira eleição.

Seria o momento do Partido dos Trabalhadores fazer a política de aproximação com o centro político compreendendo sua vitória de um amplo leque de forças do “Campo Democrático” nas eleições municipais de 2020. O “Campo” saiu vitorioso por nele fazer parte o PT. O PT saiu derrotado se considerar que não faz parte desse amplo campo democrático se auto isolando como um “Narciso Chic”. Nessa dialética que poderia se fazer qualquer balanço partidário de uma esquerda amadurecida ao ponto de perceber que sua função seria ser um instrumento para a emancipação da sociedade ao contrário de pensar a sociedade como reflexo de sua acumulação de força política. O eleitor demonstrou que está interessado na redução das desigualdades sociais num amplo leque de possibilidades politicas – do empreendorismo até a taxação das grandes fortunas passando pelas vertentes revisionistas da economia criativa e da renda mínima. Não inserir esses pontos num balanço partidário é fazer uma política só eleitoreira pois só se alimenta num processo de constante debate eleitoral (primeiro as eleições na sociedade para depois entrar nas eleições internas e depois retornar para as eleições gerais). Essa é uma característica muito questionada no atual mandatário presidencial que nunca sairia do “palanque” e se negando a governar para a sociedade. O narcisismo na política é o alimento da polarização que pode definhar as instituições democráticas. Portanto, o feitiço de Eco precisa ser quadrado por quadros internos ou externos ao PT como alerta do quanto esse momento impõe a necessidade da “Grande Política”.

sexta-feira, 23 de outubro de 2020

MEMÓRIAS POSTUMAS DO CIDADÃO CARIOCA - 5

 

 

Razão e Maluquice

Por João Sem Regras

 

Já temos muitos leitores a reclamar se essas memórias estão sendo escritas em que tempo terreno. Mas eis que lembro a todos que aonde me encontro nada há como medir o passar do tempo. Aliás, o que seria o tempo nesses dias. Outros se questionam sobre em que lugar se passa as minhas lembranças. Seria mais interessante que cada leitor pudesse imaginar o quanto tudo nesse infinito universo está relacionado por mais que haja esses diplomatas antiglobalistas a discursar suas maluquices.

Já o leitor mais atento e fiel as leituras dos depoimentos anteriores do quanto me esforço em não expor muitos outros personagens. Todavia eles existem ou existiram. Há um labirinto nas informações para aqueles que precisam estar preparado para esse “reality show” narrado dessa zona sombria. Aliás, muitos vivem na zona sombria sem ter uma noção do quanto eles existem.

Estávamos muito bem a pensar na volta de uma Razão a habitar os corações no mundo terreno. Uma ilusão que foi se deixando passar aos poucos. Eu poderia dizer que o mundo do carioca seria o suburbano universal. Nessa minha tentativa de ser um pouco antropólogo desse cotidiano que ficou sombrio nos tempos de um determinado Prefeito. Mas a astúcia de seguir o “atalho” do nacional foi a moeda de César em sua vida política. A Sandice nunca sai desse meu Rio de Janeiro com as constantes maluquices desses mascarados que ornamentam seus rostos sem propagar o amor nos discursos políticos.

Tempos em que a Razão poderia se impor na vida carioca, porém muitos se silenciam no esclarecimento das alternativas. Sem a força de uma opinião a loucura alimenta o fogo do ressentimento das camadas médias. Desse segmento que se diz conhecedor das letras sem ter condições de ler mais que os caracteres de um Twitter. Dessa geração de ativistas que cancelam quase tudo, pois a opinião está sufocada por uma nova Inquisição. Antes os debates seriam para buscar pontos de convergência. Vivi nos tempos em que cresciam as tretas. E eu falando do Twitter por onde alguns poucos de meus leitores divulgam essas linhas. Seriam elas lidas até o final?

Antes que busquem a impugnação de minhas palavras, espero que todos assumam o compromisso de pensar mais na sua cidade que sempre esteve doente e ainda mais com diversas doenças. Agora, pensemos nas casas vazias enquanto há pessoas sufocadas no pagamento de aluguel. Pensemos nos moradores de rua e nos espaços públicos vazios. Imaginemos o quanto a moradia é uma palavra curiosa no dia a dia. Reformas seriam possíveis nos Centros das cidades que poderiam animar outros centros. Eis aqui um pouco do que uma vez li num certo livro. Não me recordo ao autor. Nem sei se valerá a recordação. Mas estaria em Construir e Habitar se não me falha a memória.

Se me serviria o consolo em saber que até o Papa é ouvido, mas muito pouco é levado em consideração até pelos católicos. Desconfio que sim. Fico aqui remoendo essas linhas como a reclamar por um pouco mais de uso da Razão. Pois ela alimentaria um caminho mais sensato para o carioca pudesse resgatar seu espaço público. Falta Rex Pública numa cidade que se deixou ficar dividida em “pequenos feudos”. Um encontro entre Alberto Passos Guimarães e Nestor Duarte na sociologia da política carioca. Agora, tenho certeza que do mundo de Star Wars virão reclamações dessa minha referência ao agrarismo na política brasileira, porém me esforço a render homenagem ao grande Raimundo Santos que foi Professor e teve o nome como personagem de um romance de José Saramago. Antes que fiquem desesperados na leitura, estou fazer referência a História do Cerco de Lisboa.

Na nossa política carioca, há muito distúrbio que nessa peregrinação nos testemunhos das eleições que deveriam servir para pensar melhor a cidade como base de uma cidadania. Meu cérebro constantemente em rodopios, pois nem sei se estou a escrever a leitores fidelizados ou a outros que caíram aqui por uma curiosidade em clicar um link. Enfim, se até aqui você chegou, eu lhe atribuo muita força de vontade em fazer algo diferente de se deixar levar pelo consenso de um “partido de juízes” que levaram uma cidade sem juízo as portas do Juízo Final. Já se passaram os anos de minha juventude em que adorava dizer que seria delegado em algum encontro político. Ser delegado era por alguns dias. Todavia, uma cidade é administrada pela arte de representar uma política.

Há uma amável peregrinação que sugere que o terror ainda não passou na cidade dos golfinhos. A maluquice está em cada cantinho das redes sociais. Estamos assustados com os excessos de buscas por experiências sem ler compromissos programáticos. E os formadores de opinião parecem mais como os mágicos em meio ao Circo Místico em que todos sabem muito bem quem é o palhaço diante de uma Live numa quinta-feira qualquer.

E, escrevendo isto, travou-me a sensação de que a fábula da corrida entre o “coelho e a tartaruga” ainda não foi compreendida por alguns políticos. A maluquice pode muito bem expulsar a razão pelo grunhido de zangas daqueles que precisam deixar de falar da vida urbana. Deixemos ao leitor um momento para reflexão e que tenha consideração em se fazer pensar o Rio de Janeiro. Ainda a tempo de fazermos algo racional.

sexta-feira, 9 de outubro de 2020

SENÕES DOS SERTÕES - Nosso correspondente do Ceará


Mar de imprecisão

 Por Hermes Messger

Formado em filosofia e criador de cabras.

 

A vida, nas incertezas de seus futuros fatos, nos conduz em mares turbulentos com velas levantadas, em temporais que, iniciados por nós, tem na incerteza sua condução.

Ao ver a ignorância, inépcia e obscurantismo, com marcha firme e olhar altivo, como quem do vazio se orgulha, tomar o país e o mundo levando o bom senso e a razão ao descaso das massas pensaria eu... e existiria? Ou existo... se não o pensasse?

Na profundidade do pensar deixamos de perceber o avanço da inépcia como ciência e do subjetivismo como fatos.

Não nos preparamos para o mundo dos algoritmos, certos das solidas bases da sociedade e conhecimento humano. Não se percebeu que nesse novo mundo em bits o bem fundamentado não da “like” e as ideias vagas encontram eco na ágora dos idiotas. Estes sim, os idiotas encontraram um canal para voz e juntaram-se aos semelhantes.

Para os algoritmos cada opinião é um número num mar de irrelevâncias, como os idiotas sempre foram maioria, a opinião destes se somam e como uma onda conduzem a boiada da humanidade rumo ao medievo.

A tecnologia nos emburreceu quando da simplificação, em modelos matemáticos complexos (Paradoxal realmente). Quando o mais importante são os números (os iguais) e não o conteúdo (as exceções) as ideias rasas se agigantam, os imbecis se enobrecem, os cegos (de razão) apontam o caminho, e o gado, bem o gado segue ao som do berrante, dos “likes”, das curtidas e “memes”. Até que haja luz novamente em meio as trevas e fumaça... claro.