domingo, 12 de novembro de 2017

Nosso Tempo - O Julgamento de Sócrates (TEATRO)




O Julgamento do Nosso Tempo

Por Vagner Gomes de Souza

A Cidade de São Sebastião do Rio de Janeiro é testemunha, ou seria melhor dizer, conivente com um andamento conservador de sua “revolução passiva”. A lógica do sectarismo de uma esquerda nostálgica induziu o carioca ao labirinto do Minotauro anti-Maquiavel (metade política e metade religião). O fundamentalismo está na base de outros segmentos políticos ou setores artístico-socioculturais. Falta muito a arte do diálogo e da reflexão. Por isso, somos reféns de uma crise mais profunda com a qual atravessa nosso país.
Muitos sábios defendiam uma “Era de Ouro” para a capital fluminense, porém estamos sem alternativas democráticas para sair do fundo desse poço. Seja nos cargos majoritários ou no desafio de renovar os quadros parlamentares no campo democrático. Gravíssima é a situação da precariedade da educação dos jovens que apontam para candidaturas autoritárias. Uma onda de Greves nas Escolas Públicas não criou uma legião de ativistas à esquerda. Pelo contrário, emergiu um variado perfil de neoautoritários sem formação nas letras: uma “SS das Redes Sociais”. O ano de 2013 foi a Primavera que logo se viu substituído pelo Inverno político de nosso atual gestor estadual com o complemento do gestor municipal de viés populista liberal/conservador.
Esse é o juízo que fazemos sobre nosso tempo na política carioca. Então, foi nessa lente que observamos a atuação de Tonico Pereira na peça “O Julgamento de Sócrates” (Teatro Cândido Mendes – Ipanema – Temporada: 03 de novembro até 17 de dezembro). Eu sei que nada sei sobre a crítica teatral contemporânea, mas confesso que essa é a peça política mais instigante e original desde o Impeachment da Mandatária Presidencial em 2016. Trata-se de uma peça brechtiana que alerta para os perigos das forças sociais que vivem na ignorância e se enquadram numa ação caluniadora do campo democrático. O ator celebra seus 50 anos de carreira com esse presente para o público carioca que está convocado a responder: “Quando o Rio de Janeiro se F...?”
Num breve prelúdio, o monólogo começa com lembranças das raízes agrárias do ator que veio de Campos dos Goytacazes. Um descendente de imigrantes italianos o qual nos deixa em prontidão para pensar no quanto conheceria Gramsci seja pela política, ou seja, pelo autor teatral Dario Fo. Então, a plateia percebe que o monólogo é um momento para se fizer pensar sobre nossos caminhos e nossos mentores. Quem seriam nossos Sócrates? Tonico Pereira cita alguns nomes de sua trajetória antes de encarnar o próprio Sócrates vitimado pela perseguição.
Filosofando com essa peça teatral, observamos que a Filosofia é muito importante para a formação da humanidade. A Filosofia que é deixada em segundo plano em tempos de reorganização das grades curriculares. Fazer pensar é um ato que faz muitos sentirem a indigestão, pois a máscara cai. Se sentir pertencente a classe oprimida pode gerar um ódio para aquele lhe fez essa revelação, pois estando consciente disso lhe resta dois caminhos: ou assumir que é um “capacho” dos poderosos ou deve ser um ser disciplinado para fazer as mudanças. Esse é o desafio imposto por Sócrates nessa livre inspiração na obra de Platão. “O Julgamento de Sócrates” é uma versão teatral da leitura sobre o mito da Caverna. O esclarecimento das camadas populares é um desafio contemporâneo.

Essa é uma peça profundamente didática para as forças políticas progressistas. Devemos estar abertos a ceder nossos pontos de vista inflexíveis para ganharmos gradualmente espaço. Ganhar o Governo não implica em ganhar a opinião da sociedade, muito se articulam para desconstruir pela via da mágoa. Nesse momento, todos aqueles que se sentem incomodados com as novas ondas moralizadoras na cultura precisam ganhar um pouco mais de inspiração reflexiva indo assistir essa peça. Mesmo que eu nada saiba que nada sei de Teatro. Posso afirmar que é a melhor peça teatral do ano.
Crédito da foto: Tonico Pereira Foto: Victor Pollak