quarta-feira, 28 de janeiro de 2015

CONJUNTURA - RIO DE JANEIRO

 
O Labirinto Grego na Política Carioca
Por Vagner Gomes de Souza
Inúmeras avaliações estão sendo feitas para a Política Nacional diante dos recentes impactos das eleições na Grécia. Na imprensa, defensora do Ajuste Fiscal pró-ricos, há dois caminhos: de um lado a vertente catastrofista anunciando mais incertezas de outro lado há aqueles que anunciam a futilidade de uma Coalização de Esquerda Radical ser empossada precisando do apoio de um partido Nacionalista. Ambas, visões desprezam uma abordagem da história recente de um país que se endividou muito após as Olimpíadas de Atenas. Naquele momento, houve um endividamente público que favoreceu os investimentos do Capital Privado. Nesse aspecto, há referências no "badalado" O Capital no Século XXI de Thomas Piketty.
Não há dúvidas que esse será um ano de Ajustes na economia. Não podemos ficar em silêncio diante dos testemunhos do aumento da riqueza do capital privado em tempos de baixo crescimento econômico, ou seja, os ricos precisam pagar a "conta" pera equilibrar as contas públicas. Na esteira disso, as Prefeitura do Rio de Janeiro já dá sinais de promover ajustes que avancem contra as conquistas dos servidores públicos municipais. Por exemplo, recentemente muitos servidores públicos municipais perderam a Gratificação de Difícil Acesso em inúmeres escolas públicas que, em muitos casos, estaria relacionada a necessidade garantir a presença de profissionais de educação em áreas distantes e inseguras. De um lado, o Governo municipal alega que houve avanços na mobilidade urbana e avanços com as UPP´s. Na realidade testemunhamos horas de engarrafamentos e chuvas de "bala perdida". Na verdade, trata-se de um processo de Ajuste nas Contas Públicas que vai vitimizar o trabalhador.
As medidas que desagradam os servidores públicos municipais é uma "ponta" desse Iceberg que necessita de uma ampliação da "base" política do Governo Municipal. As trocas de cargos e benefícios para antigos e novos aliados ao PMDB tem como objetivo as próximas eleições da Capital que é estratégica na manutenção de um grupo político de modernização conservadora. Tudo é feito para garantir a maximização do enriquecimento do Capital Privado na Capital. O debate sobre as Olimpíadas de 2016 deve permitir um olhar sobre qual será o peso do endividamento público da Prefeitura, fazendo uso ou não de recursos da Previdência dos Servidores Públicos municipais, a medida que a "bolha imobiliária" se instalou enriquecendo pequenos grupos ou consolidando o monopólio das empresas de ônibus nas linhas do BRT que concentram massas de trabalhadores.
Da Grécia, há muitos anos a política carioca tem construído um Labirinto onde os grupos políticos de oposição são "esvaziados" internamente e, em seguida, isolados. Outros grupos, caminham sempre para o autoisolamento do sectarismo. O Campo Democrático não se permite a mobilizar as Universidades para debater a Cidade e a periferia presencia inúmeros jovens que nem estudam e nem trabalham. Do capital dessa juventude testemunhamos jovens que rumam para a informalidade, para a base do clientelismo político e para aultraesquerda. Falta uma opinião política da Esquerda Democrática para fazer a política de forma ampla.
Tudo ainda está em aberto para a próxima sucesso municipal. Contudo é momento de avaliar as possibilidades de dialogar com setores emergentes do voto petencostal que influenciam de forma organizada um segmento considerável dos moradores e da juventude na Zona Oeste carioca. O fio de Ariadne passa por um "Compromisso Histórico" a semelhança que os italianos buscaram construir nos anos 70 do século passado.

segunda-feira, 26 de janeiro de 2015

IDA - Crítica ao Filme




 
A Questão "Ida"
 
Por Pablo Spinelli
 

Há caminhos de ida sem volta. Há caminhos de ida ziguezagueantes. Há voltas onde o ponto de partida não é o mesmo que o ponto de chegada. Nesse aspecto apresenta-se o candidato ao Oscar de Melhor Filme estrangeiro, “Ida”.
Um filme que aparentemente não é para todos os gostos. Filme polonês. Em preto e branco. Passado nos anos 1960. Com momentos de silêncio e contemplação. Mas, como a paciência é uma virtude, o filme supera o que seriam esses obstáculos para a grande massa e nos oferece reflexões.
Uma jovem noviça antes de ser freira é aconselhada a ver a sua única parente viva, uma tia de vida aparentemente errática – bebe e fuma demais – para confirmar sua vocação religiosa. Caso a jovem achasse que o mundo católico é o seu mundo, voltaria para o convento e se firmaria como freira.
O que pode ser um fiapo de roteiro passa a se tornar instigante. A jovem, que com uma carga de julgamento ético-moral não vê com bons olhos o comportamento da tia – que dorme com homens que encontra em suas bebedeiras -, aos poucos estabelece interações com a tia e o que era rudeza caminha para a sociabilidade, usando aqui os conceitos de Georg Simmel. Do conflito pode haver coesão e não necessariamente esgarçamento (como vemos PT x Marta, entre outros). A jovem precisa de conhecer o seu passado. O espectador se depara com ousadias no roteiro. A noviça é um peixe fora d’água posto que sua origem é judaica. Partindo desse ponto, vem o grande questionamento. O que aconteceu com seus pais? A partir daí, vemos tia e sobrinha indo no coração das trevas da história da Polônia dos anos da Segunda Guerra. A tia errática assume outro papel social: é uma dura e implacável promotora pública do Estado Socialista polonês.
O que aconteceu com os pais judeus da jovem noviça? Sabe-se que estão mortos. Mas quem os matou? Aonde estão seus corpos? Temas tensos numa Polônia que viveu a situação da Floresta de Katyn nos estertores da Segunda guerra (sugerimos aos leitores dessa resenha que procurem o que foi essa polêmica histórica). Até aqui, nesse resumo, não adiantamos nada a mais do que 25 minutos do filme nos apresenta. O que era uma relação de distanciamento passa a ser de aproximação gradativa, com ressalvas e identidades. Mas aos poucos, numa provocação clara, a noviça torna-se rebelde. Sobre quem matou e o porquê deixamos aqui uma pista: não são os usual suspects. E isso faz do filme um ar de oxigênio e reflexão. A Polônia cinzenta do filme é não só uma referência aos filmes poloneses – Roman Polansky fez o seu primeiro assim e tratou do tema judaico em “O Pianista” – como também a um país de matizes, não era o branco, o preto e nem o vermelho, o branco e o azul como defendiam alguns cineastas liberais poloneses dos anos 1980. Nessa zona acinzentada há um questionamento de estereótipos que enriquecem o filme e a história. Como uma Polônia sob o jugo “totalitário” (aqui uma enorme concessão de um conceito a uma famosa filósofa de origem judaica) soviético tinha uma promotora alcóolatra e adepta de amores fugazes? Uma Polônia sob o autoritarismo do ateísmo soviético mas onde do início ao fim temos Igrejas católicas, santos, crucifixos e a liberdade de ir e vir de uma noviça nas cidades. Um pouco diferente das imagens simplificadoras das caricaturas horrorosas da Guerra Fria. Para dar mais um tempero, temos uma noviça que faz flerte (mais Simmel) com um jovem...guitarrista que toca...jazz! Bem, seria algo alegre para o nosso querido e saudoso Hobsbawm ver. Na Polônia dos anos 1960 temos jazz. Tocado em hotéis como se fossem night clubs. A pergunta que não quer calar: Essa Polônia era a descrita pelo líder sindicalista Lech Walesa?
Tolerância religiosa, culto ao prazer, aos desejos, aos corações desvelados, dúvidas religiosas, o cinza que permite pensar que uma nova geração de intelectuais poloneses pode rever para além dos discursos – nada impede a crítica ao burocratismo – aparece até um “sabe com quem está falando?” que faria um famoso antropólogo brasileiro rever seus conceitos sobre a cultura brasileira.
E a jovem noviça? Ela não tem uma máquina estatal sobre sua cabeça. Ela tem o acerto de contas do seu passado, um reajustamento do seu presente e uma ida a um futuro depois de gozar alegrias e dissabores da vida. Finalmente minha geração – e olha que havia um certo pessimismo dessa possibilidade -, ainda caudatária do discurso da Guerra Fria, pode ver nuances e redescobertas que começaram com um “Adeus, Lenin”. E assiste ainda uma certa nostalgia do mundo soviético em outros filmes, como “Busca Implacável 3”., onde o Estado levianítico (aqui uma referência a outro filme indicado ao Oscar de Filme Estrangeiro, o russo “Leviatã”) gerou quase uma anomia após sua desintegração. Mas, terrivelmente o inimigo agora é outro, lembrando o maior sucesso de público do cinema do Brasil. Só que esse inimigo – os jihadistas – é um vespeiro que deixaremos para os snipers americanos. Mas isso é para outro texto.







sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

ELEIÇÕES NA GRÉCIA

Comício da Syriza
 
 
Pela Democracia na Grécia & Alhures
 
Ricardo José de Azevedo Marinho[1]
 
Os tempos fraturados, como qualificou o saudoso Eric Hobsbawm, o século XXI, tem sido de aguda crise económica, social e política, com intensas repercussões ao nível dos processos de desestruturação e desfiliação social (desemprego, precariedade, pobreza e aumento das desigualdades, enfraquecimento do Estado social), torna-se ainda mais premente o debate vivo e atualizado sobre os caminhos da sociedade global.
O Brasil, país chave nos arranjos sociais vigentes e vindouros, precisa mudar sua política científica reinante que, entre outros aspectos, vem desprezando implícita ou explicitamente o papel das ciências humanas como se vê no Programa Ciência Sem Fronteiras (CsF), precisamente quando se imporia o inverso, isto é, o aumento de recursos e de vontades para que seja possível um conhecimento científico aprofundado e sistemático das nossas sociedades, condição indispensável para a produção de políticas públicas adequadas à urgência social, devidamente qualificadas e qualificantes, solidárias e sustentáveis.
A Grécia, de igual modo, precisa defender com afinco a promoção das ciências humanas, de forma a superar a precariedade que expulsa tantos e tantas investidoras e investidores do país e do espaço europeu, comprometendo perspectivas profissionais e de vida pessoal e social e, não menos importante, diminuindo o potencial científico do país.
Isso por que a circunstância aziaga vivida na Grécia tem, entre outros móveis, o equívoco fortemente ideológico de alguns discursos utilitaristas sobre a suposta falta de sentido concreto das ciências humanas, uma vez que não encontram suporte nem na realidade empírica, nem nos inúmeros estudos realizados aqui, la e em alhures. A suposta “inutilidade” das ciências humanas é tão mais propagada quanto os resultados do conhecimento adquiridos ao longo do tempo sobre as práticas sociais incomoda os poderes instituídos, uma vez que apontam erros, insuficiências, omissões e, acima de tudo, a possibilidade de pensar e de agir de outra maneira, contra a barreira de mitos da inevitabilidade, que mais não é do que uma forma de neutralizar a história, a política e o próprio debate público.
Ora, é na discussão aberta, viva e plural sobre os caminhos do possível que se encontram os futuros socialmente disponíveis e imagináveis da Grécia. Hoje, mais do que nunca, as ciências humanas, sem tentação messiânica ou posse absoluta de qualquer verdade ou dogma, podem mobilizar um grande conjunto de conhecimentos estruturados sobre nós mesmos e sobre o nosso lugar no mundo, no lugar da Grécia na Europa e no mundo. Não por acaso, a Grécia resiste à deriva antidemocrática da União Europeia.
A Grécia move-se, por isso, com esta indestrutível energia de não parar no conhecimento único, no debate único, sem implicações públicas. A Grécia mostra que pode ser possível, com outros critérios e orientações, unir a pluralidade do conhecimento científico, das políticas públicas, dos movimentos sociais e a cidadania contra as repercussões destrutivas da crise como certa vez analisou Gramsci.
Daí que a Grécia ao viver há europeização, um processo complexo e tortuoso de transformação em curso, percebeu que sua ambivalência pois se, por um lado, permitiu à Grécia libertar-se da sombra projetada pela sua história autoritária em plena era dos extremos, por outro, criou um conjunto de efeitos colaterais, que virou a vida das pessoas ao preconizar a teoria da omelete. Pior: a europeização desenvolveu-se através da cooperação transnacional das elites com os seus próprios critérios. O resultado está à vista de todos: uma Europa sem europeus, uma Grécia avessa à cidadania grega.
O que aconteceu na Grécia, nos últimos dias de 2014, foi à falta de alguma ideia de metamorfose social. Só a sinalização de alguns passos para uma política fiscal sem passo algum para uma política de investimento social foi o que ocasionou a dissolução do Parlamento e a convocação de eleições para 25 de janeiro de 2015.
Naquele momento crepuscular o Syriza, a força politica de oposição, fez exatamente contrário, ou seja, sinalizou com medidas modestas relacionadas à proteção social como renda mínima e auxilio desemprego sem apontar nada sobre a política fiscal. Agora, no transcorrer dos dias de 2015, além de seguir apontando para programas destinados a atualizar as capacidades e qualificações dos trabalhadores aponta que a Grécia a partir de agora poderia construir a sua competitividade com base na competência - e não na politica deliberada de baixos salários. Ou seja, se uma politica fiscal precisa ser realizada, ela será a partir das classes subalternas e não pelo tirocínio de alguns supostos iluminados das elites.
Assim, a Grécia dos efeitos colaterais de uma europeização por cima precisa de uma experiência de europeização construída de baixo para cima. Não sabemos o que surgirá do laboratório eleitoral de janeiro de 2015 da Grécia mas não temos dúvida de que se há um caminho a ser percorrido esse se faz com uma sociedade civil europeia forte baseada na democracia, na participação e na identificação desses cidadãos europeus com o futuro da Grécia na Europa e no mundo.
 
Rio de Janeiro, 8 de janeiro de 2015




[1] Ricardo José de Azevedo Marinho, Bacharel em História pela Universidade Federal Fluminense - UFF, Mestre em Sociologia pelo Instituto Universitário de Pesquisa do Rio de Janeiro - IUPERJ, Doutor em Ciências Sociais em Desenvolvimento, Agricultura e Sociedade pela Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro - CPDA/UFRRJ e Pós-Doutor em Políticas Públicas e Formação Humana pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro - PPFH/UERJ. Atualmente é Assessor da Presidência da Companhia Estadual de Águas e Esgotos - CEDAE, Professor da Universidade do Grande Rio - UNIGRANRIO e Membro do Comité Consultivo da Cátedra José Carlos Mariátegui.