domingo, 16 de junho de 2019

SÉRIE ESTUDOS: RESENHA DE LIVRO

 
 
Um Manifesto a procura de um Ator

Por Vagner Gomes de Souza

(Resenha do livro Lilla, Mark. O Progressista de Ontem e o do Amanhã. São Paulo, Companhia das Letras, 2018)

Dedicado ao Vereador Paulo Pinheiro (PSOL – RJ)

Muitos livros, a exemplo dos filhos, seguem uma vida própria que ultrapassam fronteiras territoriais para os quais foram escritos. Mark Lilla, aos poucos, começa a ser lido e conhecido nos meios acadêmicos do Brasil graças ao livro O Progressista de Ontem e o do Amanhã. Os paralelos entre a gestão do atual mandatário presidencial no Brasil com o populismo de direita conhecido como “trumpismo” suscita curiosidades nos leitores brasileiros mais atentos aos caminhos e descaminhos do nosso americanismo.

O livro foi lançado nos Estados Unidos no primeiro ano da gestão de Donald Trump não como ato de resistência política, mas como convite aos movimentos sociais voltarem ao campo da política. No diagnóstico do autor, as forças liberais norte-americanas (mais próximas do pensamento social-democrático europeu) abdicaram da tarefa de fazer uma política de unidade em defesa da cidadania. Trilhando o caminho da valorização das políticas identitárias, eles aprofundaram a “privatização” das ações dos sujeitos sociais num conjunto  de partículas atomizadas.

A atomização da sociedade seria um problema a ser contornado segundo Antonio Gramsci em suas anotações sobre o americanismo. A obra de Mark Lilla faz semelhante alerta, porém sugere, paradoxalmente, que estaríamos em tempos de uma crise da hegemonia do pensamento reaganista (ou seja, os fundamentos de um fundamentalismo liberal e individualista). Contudo, digamos que o velho modo de pensar a política estaria morrendo ao ponto que a nova forma de fazer política progressista ainda não surgiu.

Diante da dificuldade de se fazer política por parte das forças oposicionistas ao individualismo do mercado, Lilla expõe que os movimentos sociais foram “cooptados” pelo senso comum do falar par si próprio ao contrário de fazer um discurso mais amplo para todos da sociedade. Aprofundar a identidade de segmentos sociais simplesmente afasta a preocupação do uso da política democrática em favor de uma mediação. Essa seria a tarefa do ator-político conhecido como Partido.


A epígrafe do livro cita um discurso do Senador Edward M. Kennedy no qual há a valorização do partido que defenda os cidadãos. Um manifesto se desenha desde então pelas mudanças de cunho superestruturais no qual as forças progressistas norte-americanas necessitariam sair de uma pseudopolítica para reaprender a fazer a política. Sugerimos que seja um manifesto para um “moderno Príncipe” em tempos de ativismo digital soa como uma refundação de Que fazer? do marxista Vladimir Lênin. Contudo, identificamos no livro as linhas da política como vocação de Max Weber quase como se tivéssemos que atuar aos passos de uma ética da responsabilidade para conquistar o eleitor comum à medida que a ética da convicção só coloca as forças progressistas no “beco da política”.

Além da ação política weberiana, os ensinamentos de Tocqueville sobre a importância da educação para um mundo democrático surgem em passagens de um livro com esse aporte de manifesto político que conclama ao Partido Democrata fazer uma política de formação de quadros paralela aos meios acadêmicos. A formação política de uma nova geração para além das fronteiras dos campi universitários para inspirar os jovens a pensar de forma coletiva. Portanto, há um tensionamento na busca de um ator político para aproveitar um momento de enfraquecimento do ciclo reaganista. Não nos iludamos. Temos um longo caminho para caminhar diante do vazio de propostas políticas que falem para os cidadãos. Muito semelhante aos ataques sofridos a esquerda brasileira sem que a mesma saiba responder buscando sair das suas fronteiras de sectarismo conhecido como Frente de Esquerda.