quinta-feira, 18 de março de 2021

TEXTOS DA JUVENTUDE


                                                       Qual é o valor da morte?

Por Lucas Soares

 

”A vergonha já é uma revolução; [...] Vergonha é um tipo de ira voltada para dentro. E se toda uma nação realmente tivesse vergonha, ela seria como um leão que se encolhe para dar o bote” (MARX, 2015, p. 14).

 

“Não se humaniza a vida numa sociedade como a nossa sem conflito”. Foram estas as palavras proferidas pelo líder religioso e membro da Pastoral do Menor da Arquidiocese de São Paulo, Júlio Renato Lancelotti quando tomado por críticas e ataques do campo reacionário, derivadas de suas ações assistencialistas em prol dos moradores de rua, em setembro de 2020, na cidade de São Paulo. Curiosamente, sob aquele mesmo contexto, encontrava-se o Brasil otimista em virtude do segundo mês de involução nos números de óbitos pelo vírus que devastava todo o mundo e colocava em xeque, como em uma partida de xadrez, peões e reis.

 Oposto ao jogo de origem asiática onde elementos inanimados do exército, separados em dois segmentos, batalhavam por posições no tabuleiro em prol da vitória de seus respectivos reis, o novo contexto pandêmico, ao contrastar peças políticas de forças nada equivalentes, evidenciava cada vez mais um velho dilema: Quem deve sobreviver? Os Peões  ou os Reis; A Grande Burguesia ou o Trabalhador; A economia ou vida; Seriam estes, utilizando a categoria de Georg Lukács, existências reificáveis? Existia mesmo uma linha tênue entre os pólos? Era realmente preciso salvar um, ao preço da morte do outro? Analogias e questionamentos à parte se sabem que hoje, seis meses após a declaração do muitíssimo bem intencionado pároco da pequena Igreja São Miguel Arcanjo, decidiu-se, no bojo de declarações das autoridades federais, dotadas de omissão e negacionismo ao conhecimento científico, por uma política pública desumanizante que tenta desastrosamente dar vida ao mercado e ao “empreendedorismo tacanho” enquanto transforma em números a morte de milhares de seres humanos.

Exposta a catastrófica e fúnebre conjuntura a qual nos encontramos, realinhemos nosso foco ao que motiva a declaração de Júlio Lancelotti  e consequentemente traz a tona nossos questionamentos: A defesa da vida. O que a sociedade civil, respeitando as respectivas impossibilidades de nossa realidade pandêmica, tem mobilizado para efetivamente conflitar essa sociedade que, como dissera Rousseau, mais se assemelha a uma “selva habitada por feras selvagens”? A reabilitação do amor ao próximo, - sentimento assiduamente presente nos sermões e ensinamentos de um importante personagem histórico – quase uma utopia frente à ideologia individualizante do neoliberalismo, deve servir como a base da retomada pela valorização da vida e para o enfrentamento das contradições resultantes do processo reificante dos setores que não estão protegidos pela invisible hand, resultando, sendo assim, em incontáveis mortes chanceladas por um discurso de irresponsabilidade teórica e por seguidas demissões no cargo que deveria capitanear as gestões de risco e, sobretudo, salvar vidas.

Por fim, reitero a necessidade do compromisso com a defesa do Sistema Único de Saúde, como política pública de caráter social; com a manutenção da autonomia e dos investimentos nos institutos públicos de pesquisa; e na seguridade da fraturada democracia que vez ou outra se encontra em ameaça da “cadela do fascismo” que, segundo o dramaturgo Bertold Brecht, está sempre no cio.

16 comentários:

Ana disse...

Reflexão incrível sobre o momento pandêmico que estamos vivendo, texto incrivelmente coeso. Temos que continuar lutando pelo SUS e pelo bem público contra as forças neoliberais.

Alice Marçal disse...

Ficou muito bom, Lucas!!

Maria Clara disse...

Texto importantíssimo para refletirmos em que sociedade estamos vivendo hoje. Como bem dito, devido às políticas neoliberais, o individualismo reina em nossa sociedade. Como consequência, pessoas que pertencem à classe trabalhadora tem suas vidas consideradas sem nenhuma importância. Precisamos, de maneira urgente, pensar se é essa a sociedade que queremos para um futuro muito próximo. Obrigada por essa reflexão e por dar ênfase a políticas públicas de saúde!

Lucas Mattos disse...

O Sistema Único de Saúde precisa ser defendido! Fico feliz por ter concordado com as ideias.

Lucas Mattos disse...

Obrigado, Alice!!!

Lucas Mattos disse...

Perfeito, Maria! Precisamos, dentro da realidade, de uma juventude disposta a superar esse individualismo liberal. Conto com você!

VAGNER GOMES disse...

O artigo tem uma precisa imagem de um filme o que demonstra uma crítica do autor ao fator religioso nesse momento da Pandemia. A Epígrafe resgata um livro de Karl Marx da Juventude que quase ninguém leu ou compreendeu. Agora, o autor tem o desafio de 40 anos no deserto para explicar o apoio de 44% dos jovens entre 16 - 24 anos ao Presidente. Aguardaremos.

John Lennon disse...

Muito bom Lucas, acho importante que os Jovens tenham mais responsabilidade com a situação caótica, temos que por os pés no chão, e partilhar dos conhecimentos e ser solidários nesses momentos, aonde o Brasil está entrando em colapso.

Luiz Otavio disse...

Ficou top irmão discordo mas ficou top te amo sucesso sempre

Unknown disse...

Enquanto,vivemos esse dilema,vidas são ceifadas por não haver políticas públicas em prol de nós.

Lucas Mattos disse...

Explicarei no próximo artigo!!! Quanto ao Marx, tive um velho camarada muito bom em formação. Enfim, a juventude, a partir de agora, tem algumas tarefas.

Lucas Mattos disse...

Hora de partir para a ação!!!

Lucas Mattos disse...

E nem há a preocupação, pelo menos nesse governo, de superá-lo.

Lucas Mattos disse...

Me manda suas discordâncias, irmão. Precisamos voltar a conversar.

Unknown disse...

Parabéns pelo artigo, ficou incrível!!!!

Lucas Mattos disse...

Obrigado!!! ❤️