Lições
sobre a Frente Democrática
Vagner Gomes de
Souza
No ano da antipolítica,
2018, nas comemorações dos 30 anos da Constituição do Brasil, tive a lembrança
daqueles anos marcados pela esperança na conquista da democracia e na superação
das desigualdades sociais. Estávamos a 48 horas da realização do Primeiro Turno
das Eleições Gerais em nosso país e a ansiedade era compartilhada por muitos ao
meu redor em relação ao que estava por vir. Havia uma ausência de um balanço
crítico das lições da derrota política do autoritarismo que se fez nas
instituições democráticas numa sociedade conservadora. Enfim, entremos num Segundo Turno sem debate
programático que favoreceu uma onda da “nova política” que, na verdade,
expressou os ressentimentos de segmentos sociais contrários a inclusão social.
Naquele momento, o legado
da Nova República inaugurada na derrota da Ditadura Militar (1964 – 1985)
através do corajoso comparecimento ao Colégio Eleitoral foi colocado em risco.
Os desdobramentos dos fatos políticos dessa semana confirmam essa percepção. Em
décadas de negociações, os indicadores sociais foram melhorando e uma
pluralidade de leis consolidaram direitos para muitas pessoas simples. A elite
econômica se deixou levar pelos cânticos da “sereia do autoritarismo” numa
manifesta intenção de resolver o custo Brasil com a imposição da
flexibilização. Mais mercado e menos valores democráticos.
Essa é a oportunidade
de dialogar com amplos setores sobre a crise da representatividade em que o
país se envolveu desde as jornadas de 2013. Os germes da metamorfose da
política brasileira não teriam sido captados em sua profundidade. Começou um
lento esvaziamento do Centro Político brasileiro manifestado numa polarização
eleitoral instrumentalizada pelos seus principais atores políticos em 2014. Em
seguida, a Operação Lava Jato (com fortes desdobramentos no Rio de Janeiro)
permitiu que a mídia pavimentasse um processo de desqualificação da política.
Emergiu a figura de um “tenentismo togado” a procura de um ator político que
sintetizasse através da manifestação da fúria do voto.
O processo eleitoral em
curso no Brasil tem semelhanças com os casos estudados por Manuel Castells em
seu livro “Ruptura – A crise da democracia liberal” lançado em 2018. Os efeitos
da crise econômica mundial alimentam a crise da legitimidade das forças
políticas em curso. Aqui, a queda eleitoral das forças do Centro permitiu a
emergência de forças obscuras de um passado que se considerava superado. Os
conservadores se oferecem como alternativa fazendo a releitura da centralização
política e como possibilidade de viabilizar a concentração da renda. Esses
setores de linha reacionária sempre existiam às margens da política brasileira
sufocados pela prática da política de um Centro comprometido com a democracia.
As mudanças na
sociedade efetivadas pelas conquistas democráticas vivem esse risco de sofrer
retrocesso diante das manifestações do voto de fúria. Os trabalhadores têm seus
direitos ameaçados e precisam realizar alianças com outros segmentos da
sociedade. Essa ponte era feita pelo Centro político que agora se faz
necessário renascer das cinzas da política nacional. Os quadros políticos do
liberalismo democrático ainda sobrevivem em muitos setores e precisamos
dialogar com eles. Não é fácil numa época de informação em rede praticamente
instantânea fazer uma opinião democrática prevalecer. Contudo, é tempo de
reinventar a Frente Democrática que enfrentou a Ditadura Militar demonstrando
que o discurso simplificado do “Nós contra Eles” está a serviço da elite econômica.
A Frente Democrática
articula forças políticas e da sociedade na defesa da Democracia e a favor de
reformas que beneficiem um gradual processo de distribuição de renda. A linha
do desenvolvimento econômico com mais conquistas sociais sustentam um amplo “pacto
na sociedade”. Seriam equivocados aqueles que limitem o debate da Frente nas
negociações eleitorais. O tema eleitoral é precedido do tema político maior que
sempre será o aprofundamento das instituições democráticas. Portanto, o recente
discurso do Ex-presidente Lula mobilizou pontos de unidade com o centro
político que não podem ser desprezados pelo sectarismo seja de qualquer
coloração.
Nota: esse é um artigo
atualizado a partir de “Lições sobre a Frente Democrática” que está originalmente
publicado em meu livro A sagrada política / Vagner Gomes de Souza. – 1.ed. –
Rio de Janeiro: Albatroz, 2019. Pp. 64 – 66. Houve uma motivação diante de uma
nova geração de jovens que me perguntam o que seria essa Frente.
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