O
silêncio de Saladino
Tariq Bastos de
Souza
Vagner Gomes de
Souza
Na magnus opus de Alan
Moore, “Watchmen", observamos um personagem icônico que é Dr. Manhattan, conhecido por seus poderes
divinos, incluindo a onisciência que lhe permite ver passado, presente e futuro
simultaneamente. No desfecho da história em quadrinhos, ele ressalta que
"nada nunca acaba", enfatizando a interconexão temporal. Essa perspectiva
falta ao atual mandatário da República, como evidenciado em suas declarações
sobre eventos históricos recentes e sua postura em relação à democracia.
Falar sobre o
Holocausto deve ter criado temor ao Presidente circunscrito as “bolhas” do identitarismo.
Falaremos na Ditadura como só “direito de fala” de quem tenha vivido aquela
época. Não nos esqueçamos de sua fala sobre o AI 5 há quase 50 anos num antigo
Teatro do Rio de Janeiro. O AI 5 do trabalhador sempre foi o AI 5 foi a
correção do saudoso Luiz Werneck Vianna.
Ao minimizar a
importância de eventos passados e focar em questões imediatas, como a tentativa
de Golpe de Janeiro, a assessoria do atual mandatário da República revela uma
visão míope da história e suas ramificações. O “sindicalismo de resultados” se
transformou num pragmatismo eleitoral diante dos olhares nos índices de
popularidade. Falta-lhe o reconhecimento de que episódios como o golpe de 1964
estão intrinsecamente ligados ao presente, especialmente considerando a
retórica e práticas reminiscentes do governo anterior, que ecoava a ditadura
militar.
Uma oportunidade
perdida em se valorizar as forças políticas do centro que foram vítimas do
extremismo de uma Guerra Fria. De mãos dadas com o Presidente da França que
deixou o legado da “Liberdade, Igualdade e Fraternidade”. O silêncio do atual
mandatário da República se assemelharia ao ficcional silêncio de Saladino na
época das Cruzadas. Os tempos das Cruzadas foram evocados polos extremistas da
direita e devemos enfrentar com as sutilezas da “virtú” de Maquiavel.
Essa falta de
perspectiva histórica compromete a capacidade do governo da Frente Democrática de
consolidar a democracia, deixando espaço para a manipulação política e a
subversão dos ideais democráticos. O negacionismo da História que se trata de
uma ciência humana. Ao negligenciar essa oportunidade a partir do uso das
fontes históricas, ele inadvertidamente permite que outros preencham o vácuo
político, ilustrando assim a constante ressonância do passado no presente: nada
nunca verdadeiramente chega ao fim. Abre um espaço no vácuo do centro político,
pois se faz uma fuga para mais adiante.
Perde o presidente a
oportunidade de lutar por um Brasil que foi roubado dos brasileiros naquele
longínquo ano de 1964. Havia a perspectiva de um Brasil com reforma agrária e com
nacionalização das riquezas, independente
na política externa. O silêncio diante da Cruzada, como o presidente se
põe, nos deixa aberto para que outras forças reacionárias ou de extrema direita pautem o nosso
"presente passado", dentre elas o ex presidente que ainda não é carta
fora do baralho totalmente.
Os sinais dos
cavaleiros medievais se aproximam com a regressão da mentalidade criativa e a
negação do uso da racionalidade. O
“silêncio sectário” deixa figuras como JK e sua tentativa de frente ampla na
obscuridade, assim como os militares legalistas que foram expulsos e difamados
pelo regime militar, estes esquecidos até pela esquerda que não estuda figuras
como o Marechal Lott apenas por serem militares. Pouca política e pouco estudo
na memória de 1964 é uma demonstração do “presentismo” como tema que pauta
nosso mandatário da República.