sábado, 23 de dezembro de 2023

SÉRIE ESTUDOS - WONKA NOS 90 ANOS DO LIVRO CACAU DE JORGE AMADO

Wonka e a Utopia em Chocolate

Giovana Freire, Valença-Rj

 

 Com toda a cor, encanto e nostalgia que Willy Wonka o lúdico e ilustre dono da fábrica de chocolates, trás a nós que fomos criados assistindo as diversas releituras do personagem clássico de “A Fantástica Fábrica de Chocolate de 1971 estrelando Gene Wilder”, visto que já havia o encanto e ensinamentos em torno de “A Fantástica Fábrica de Chocolate de 2005 estrelando Johnny Depp”, e até a participação de “Crispin Glover em Deu a louca em Hollywood em 2007”. Leituras cinematográficas que, muitas vezes, nos faz esquecer o livro do galês Roald Dahl, escrito em 1964.

 Já o atual filme “Wonka” - estrelado pelo jovem talentoso Timothée Chalamet - estreou nos cinemas no dia 07/12/2023 com uma nota verde, ou seja, positiva, e aclamado pela crítica como em Entertainment Weekly foi publicado que “Wonka lembra que a vida se torna mais doce pelas pessoas com quem a compartilhamos”. A ideia de Richard Sennett em valorizar o encontro entre os sujeitos humanos se faz presente nesse compartilhar e sonhar.

Tendo tudo isso em mente, vamos direto ao ponto que nos interessa um filme infantil por assim dizer que faz amplas e concretas críticas sociais intensas ao capitalismo e ao monopólio empresarial e financeiro. O humor ácido e até constrangedor quase que como se fins dos “filmes musicais” mascarassem o trabalho análogo a escravidão, o trabalho infantil e até a alta taxa de analfabetismo “sim, o clássico Willy Wonka criador da maior e melhor fábrica de chocolates do mundo do cinema; não sabia ler”. Lembremos como a literatura infantil enfrenta hoje a concorrência do mundo digital na educação.

Na “Galeria Gourmet”, onde se passa todo o enredo do filme, e que também é dominada pelo “Cartel do chocolate” são os três caricatos mestres-chocolateiros, que monopolizam o império dos chocolates e assim como vivemos constantemente em nossa sociedade de desiguais.  O Jovem Wonka planejando mostrar seus chocolates voadores ao mundo. Cena impecável e nostálgica que poderia ser revista por horas e não seria pesado aos olhos. Uma vez que a leveza da cena nos inspira em projeções para um futuro.

Willy almeja que sua mãe o encontre e cumpra uma antiga promessa, pois ela nunca passou a receita secreta do chocolate como se fosse uma necessária doutrina. O filme, a todo momento, demostra que, de tão diluído os produtos de “Wonka” mal se qualifica como chocolate, pois tudo que seria sólido se desmancha no ar. Com suas invenções mágicas e coloridas, criadas a partir de ingredientes multiculturais e até impossível para o mundo de um adulto mas que causam fixação a nossa criança interior, muito mais nos sentimentos que causam ou evocam, o jovem Willy é uma ameaça porque pode mostrar aos clientes da “Galeria Gourmet” que eles poderiam ter algo a mais.


Após Wonka se encontrar falido em uma cidade é abordado e levado até um “hotel” onde é enganado ao assinar um contrato sem “ler as letras miúdas” fica trancafiado e trabalha em uma lavandeira onde cantam o que [particularmente é a música que não saiu da minha cabeça], “esfrega, esfrega”, lá ele encontra a Calah Lane que interpreta Noodle, uma órfã que que era a verdadeira herdeira do “Império chocolateiro”, porém para isso peço que assistam ao filme e sintam todas essa emoção que conta também com uma semana dos dois ordenhando uma girafa para uma das crianças do chocolateiro mágico.

 Nesse meio tempo Willy conta a Noodle que recebe a visita do “Homezinho laranja de cabelos verdes” que é estrelado por Hugh Grant no papel de Oompa-Loompa, que atrás de pega chocolate por vingança pela perda de seu “cacau”. Esse personagem que desde sua aparição e reaparições repentinas e sem aviso prévio causam boas risadas e ótimas musicas que lembram justamente os clássicos.

Após diversas e continuas tentativa. Finalmente Wonka e sua frente ampla vencem o monopólio financeiro, porém lembra-se da “Wonka mom?” Wiily passou o filme inteiro segurando uma barra de chocolate feita por ela, e esperando sua presença. Então finalmente o protagonista resolve abri-la e encontra um bilhete onde descobre que nunca houve nenhum segredo no chocolate e sim que o importante era que o mesmo fosse compartilhado.

quinta-feira, 21 de dezembro de 2023

SÉRIE ESTUDOS - 90 ANOS DE CASA GRANDE & SENZALA


Rumo ao centenário de Casa-Grande & Senzala

Ricardo José de Azevedo Marinho[1]

 

Em dezembro de 1933, publicava-se no Brasil obra fundamental para o conhecimento que até então se tinha sobre a formação da nossa civilização: Casa-grande & Senzala - formação da família brasileira sob o regime da economia patriarcal, do intelectual pernambucano Gilberto Freyre (1900-1987). Para marcar os 90 anos deste livro que revolucionou os estudos sobre nós brasileiros, a Global Editora lança uma edição especial comemorativa limitada com capa dura desta obra icônica.

Além de trazer os elementos já presentes, a versão atual traz também a apresentação de julho de 2003 do professor e ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso e dois cadernos iconográficos. A nova edição brinda os leitores com um conteúdo adicional especialmente produzido para ela: um posfácio de julho de 2023 escrito pela professora e historiadora Mary Del Priore e um terceiro caderno iconográfico, o qual oferece um passeio imagético pelas obras de pintores e desenhistas que contribuíram para as diversas edições de Casa-grande & senzala publicadas ao longo de nove décadas.

A pintura que estampa a capa desta nova edição é de autoria de Cícero Dias (1907-2003), pintor pernambucano reconhecido internacionalmente e que foi amigo de Gilberto Freyre. A obra pertence hoje ao acervo da Fundação Gilberto Freyre. É também de Cícero a famosa pintura do Engenho Noruega que vem encartada nas edições de Casa-grande & Senzala da Global Editora.

Ancorado em ampla pesquisa realizada em bibliotecas e arquivos brasileiros e estrangeiros, Gilberto Freyre construiu uma poderosa análise sobre os traços e desafios fundamentais da formação da civilização brasileira. As virtudes e os vícios da nossa colonização predominantemente ibérica no Brasil, a enorme contribuição das diversas populações indígenas e africanas na formação da identidade brasileira, tudo reconstituído a partir de uma perspectiva inovadora: lançando luzes sobre os aspectos cotidianos que estiveram presentes nas permanências e transformações de uma civilização caracterizada pela miscigenação.

Nesses vinte anos entre a apresentação do livro perene de 2003 e o posfácio do castelo de mil portas de 2023, mais de uma grande quantidade de obras, cuja grande maioria corresponde à trajetória também internacional dessa obra, foram publicados sobre Casa-grande & Senzala e o pensamento de Gilberto Freyre. Sobre sua ação como político, constituinte e deputado ainda a uma longa avenida a ser percorrida. Poucos anos depois do trigésimo aniversário da sua partida e poucos meses antes dessa edição comemorativa, buscamos aqui numa série de textos por essa efeméride, aludir ao interesse renovado e sempre ampliado, nacional e internacionalmente em estudá-la, seguir encontrando e reencontrando seu lugar e seu significado no desenvolvimento do pensamento social brasileiro na contemporaneidade, para o qual, como todos reconhecem, deu contribuições originais e duradouras.

Mas, o que significa isso? O que significa hoje refletir sobre Casa-grande & Senzala? Nas esferas brasileiras e ela no planeta é, sobretudo, o testemunho irrefutável do reencontro, cada dia mais profundo, depois de nove décadas, entre o movimento democrático de uma civilização que avança para a conquista de sua maturidade política e a direção das lutas dos outros brasileiros pela sua república, e a memória de mulheres e homens a quem deve a contribuição fulcral para o nascimento das suas primeiras organizações civilizatórias, societais e políticas brasileiras, e a ainda fecunda matriz de uma teoria e de uma orientação estratégica democrática e republicana na civilização brasileira.

É nesse sentido que o debate decenal rumo ao centenário de Casa-Grande & Senzala exige repensar nossas perspectivas e contribuições, confrontando as tendências atuais globais e as opções civilizatórias planetárias. Porque é no movimento de reflexão de Gilberto Freyre onde estão, sem dúvida, contidos alguns dos elementos decisivos da renovação do debate epistêmico, teórico e político que está em curso. Isto não significa, obviamente, que deixou de ser relevante e importante seguir com o que já se conquistou anteriormente, mas ao explorar o território continente Casa-Grande & Senzala sobretudo em relação à história teremos novas projeções futuras alicerçadas nas anteriores de conhecimento no caminho de um mundo plenamente democrático.

 

Rio, 20 de dezembro de 2023



[1] Presidente do Conselho Deliberativo da CEDAE Saúde e professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da UniverCEDAE.

segunda-feira, 18 de dezembro de 2023

SÉRIE ESTUDOS - QUESTÃO MERIDIONAL CARIOCA


Era uma vez o Jogo do Bicho 

Pablo Spinelli 


Há um raro e incomum interesse por parte de um setor da classe média carioca acerca de um tema que tem um corte transversal na política, na economia, na cultura e nas agruras do Rio de Janeiro, seja a cidade ou o Grande Rio. É a série documental lançada em novembro pelo streaming Globoplay: 'Vale O Escrito - A Guerra do Jogo do Bicho”, a respeito de personagens do mundo da contravenção e outras coisinhas mais. O mesmo streaming lançara em 2021 com muito sucesso o documentário “Doutor Castor”, acerca de Castor de Andrade, aquele que seria considerado o Capo di tutti capi (chefe dos chefes) termo contrabandeado da organização siciliana “Cosa Nostra”, vulgarmente chamada de máfia nos EUA e aqui - que não é exclusiva dos italianos, pois há a irlandesa e a judaica, representadas pelos filmes Os Infiltrados (2006) e Era Uma Vez na América  (1984) - fora as mais diversas espalhadas por todos os continentes.  

Nessa toada, Vale o Escrito pode ser visto como o desdobramento de “Doutor Castor” (ver antes essa série e ler o livro Os porões da contravenção: Jogo do bicho e Ditadura Militar: a história da aliança que profissionalizou o crime organizado) por onde somos guiados por viva voz pelos sobreviventes da Velha Guarda – o ex-capitão do exército Aílton Guimarães e o José Scaffura, o Piruinha e adentramos no universo da nova geração, com foco no que restou da Família Andrade – especialmente o sobrinho, Rogério e da Família Garcia, as netas gêmeas de Miro Garcia, filha do intempestivo “Maninho”. Ao longo de sete episódios temos um flerte com a história recente do país e com a sociologia e antropologia urbanas. Percebe-se que a presença do ex-capitão do Exército foi fundamental para dividir a cidade do Rio de Janeiro em áreas de influência como a Partilha Afro-asiática do Imperialismo. Antes que detratores da formação do país associem com as Capitanias Hereditárias vemos na série que a hereditariedade não é posta como algo de consenso sem coerção.  


Nas palavras do criador da série, Fellipe Awi , o interesse foi despertado a ele porque "Sempre me impressionou que, em pleno século XXI, uma atividade ilegal funcionasse ainda à luz do dia em qualquer esquina da cidade e, principalmente, mantivesse uma estrutura típica de máfia. Além da divisão de territórios, existe essa tradição quase monárquica da liderança dos negócios passada de pai para o filho mais velho"i. A despeito dos fatos narrados na série contradizerem a “nostalgia imperial” do criador pois, nem sempre rei morto será príncipe posto, cumpre destacar que a hereditariedade é marca das mais diversas esferas de ação, seja à margem da lei, como patronos da cultura carioca que permitiu com o mecenato do poder paralelo aquilo que já foi subvencionado pelo Estado Varguista – ou seja, a margem da lei não é tão diversa da cultura política do Estado – seja também em áreas como música, futebol, política, teatro, igrejas,  universidades e, claro, jornalismo. Antes que um universitário cheio de USP no sangue diga que isso é do “homem cordial” como a sarcástica narração de Pedro Bial faz supor na série, lembremos dos Kennedy (EUA), Fujimori (Peru), os Mendes Godinho (Portugal), Luksic (Chile), Grosvenor (Inglaterra). A tradição vem das monarquias e entrou no mundo empresarial, portanto, aquilo que é visto como mafioso na esquina da cidade é uma ponta do espírito empreendedor e do self-made man por aqui. O que seria somente nossas raízes ibéricas tem muito de americanismo, basta ver que a grande referência valorativa para um representante da nova guarda é um filme americano, O Poderoso Chefão.  

Sobre a Nova Guarda há um paralelo com a diacronia no mundo da política e das ações societais da juventude. Paradoxalmente, os mais novos são mais ibéricos que os pais. Nasceram em rico patrimônio, nascidos na Zona Oeste Mall, não tem pudor em ostentar marcas ou a si mesmos. Sem juízo de valor é como se Abel, Moisés, Adílio fossem substituídos por Gabi, Kaká e Yuri Alberto, ou ainda, saem Monarco e Almir Guineto para entrar Silva e João Martins.  Um certo ar gourmet. Sai o talonário de apostas e entra o game. A virada do século XXI parece que goumertizou essa “garotada”, o que implica numa atomização - que gera mais violência, mais fragmentação - com a perda do centralismo democrático da “Cúpula” ou Comitê Central no “Partido dos Trabalhadores do Bicho”, metáfora usada pelo “Capitão” Guimarães, cuja eficácia é a presença de “diretórios” em todos os municípios do Estado.  


A série, com um episódio dedicado a um perfil do mundo da contravenção com mais ênfase no sangue do que nas rosas, representadas pela fala de Neguinho (ainda pode ser chamado assim?) acerca do libanês Aniz A. David. É muito bem editada, com depoimentos importantes, e põe luz à metástase societal carioca na relação entre milícia, mundo do bicho, política e, mídia, numa discreta autocrítica a mostrar a relação da Globo com os patronos do Carnaval. Por fim, mas não menos importante, como diria o engenheiro Leonel Brizola, o Rio de Janeiro é a “caixa de ressonância” do Brasil, logo, vemos a ex-juíza Denise Frossard como o experimento laboratorial da toga da velha UDN no mundo da política. O resenhista não sabe explicar a causalidade, mas curiosamente, foi ali que o Rio faliu. E jovens, uma indagação: como aguentam assistir a 7 episódios de 50 a 60 minutos de uma só vez, mas não vão ao cinema ver um filme de 2h30? Respostas para o autor desse VOTO POSITIVO.  

sábado, 16 de dezembro de 2023

BOLETIM BRASÍLIA CONECTION - BBC 029 - UM BALANÇO SOBRE A EDUCAÇÃO

Educação e Futuro da Democracia

Vagner Gomes de Souza

 

Estamos num ano de encerramento do ano letivo no país. Valeria um balanço do primeiro ano de gestão do Ministério da Educação no Governo Lula – Alckmin. Como em diversos segmentos do governo, observamos que a Frente Democrática ainda se encontra desafiada pelas mazelas da pandemia no qual o antecessor nada fez como se a sociedade estava aprisionada a um “Game”. Essas seriam, em breves linhas, nosso balanço para que a educação tenha um trabalho contínuo para que o futuro da democracia não esteja sob ameça.

Os números das avaliações indicam o retrocesso na educação brasileira em apenas quatro anos. Esse retrocesso colaboraria com o negacionismo científico em inúmeras situações. Por exemplo, se um aluno do ensino médio explica com naturalidade que as chuvas caem porque há nuvens acionadas pelos raios, observamos que estamos no limiar do “fundo do poço”. Imagine os olhares de desconhecimento para temas da saúde, por exemplo, a diabetes.

Seriam dois temas em que suas habilidades estariam abordadas no ensino fundamental. Aliás, diversos especialistas em educação adoram enumerar que a situação do ensino fundamental estaria melhor que no ensino médio. Dependeria dos parâmetros a quais se referem. Muitas vezes usam os números de evasão escolar e de aprovação nessas opiniões comparativas. Muitos se silenciam sobre os impactos de uma “aprovação automática” disfarçada e, sem critérios pedagógicos, uma fantasia de relatórios que ficarão a ser lidos pelos “ratos da História”.

A manutenção do gestor no Ministério da Educação, ainda que haja ajustes a serem feitos, seria um desafio no comparativo a gestão anterior. Aos poucos, a Secretaria de Ensino Superior consolida um perfil mais expansivo na abertura de novas vagas no ensino universitário público. Todavia, assim como os alertas sobre o ensino básico, devemos estar atentos a descaracterização do ensino EAD que seria mais complementar, porém está assumindo força sem um balanço. No nível do Ensino Básico, a necessidade de uma melhoria na articulação política do Ministério com os entes da federação seria urgente.

A inserção das mudanças ao projeto original de ajustes ao Novo Ensino Médio, relatado por um parlamentar de um partido da base do Governo, não pode ser visto como se fosse um revanchismo político ou com a nova onda do neoliberalismo pedagógico. Números de aulas aula não são critérios para serem polarizados num debate político sobre a Educação. Ser mais criterioso nas ofertas de ensino presencial se faz necessário uma vez que a juventude pobre tem todas as cores e o princípio da universalidade do acesso a educação pública deve atender todos os segmentos sociais. Os ajustes necessários no Novo Ensino Médio devem agregar esse princípio político republicano e democrático.

Apesar dos deslizes sobre as manifestações de alguns assessores sobre o ensino nas escolas civil-militares, devemos sempre estar abertos a inclusão de todas e todos. Vejam um exemplo do governo de Centro-esquerda da capital carioca para perceber que a ascensão do Partido dos Trabalhadores a gestão municipal não foi condicionada a suspensão desse projeto em algumas unidades escolares. Esse amadurecimento deveria se espalhar para outras esferas do Governo Federal.

Ainda temos o desafio da leitura e escrita numa sociedade cada vez mais digitalizada. O Ministério da Educação, com auxílio de especialistas da educação e da saúde, precisa promover uma campanha de esclarecimento aos pais e a juventude sobre o uso excessivo dos canais digitais em celulares. A ansiedade na juventude provavelmente cresceu nas últimas décadas e a educação está se adaptando com o problema ao contrário de ser um espaço para fazer valer a orientação educacional. Se um professor não pode criar suas regras de convivência com as novas tecnologias na unidade escolar, tudo é fruto da ausência de uma parceria com a família. Esse debate deve incluir os responsáveis para que tenhamos uma melhor valorização do uso do tempo livre para o lazer e a leitura. Todavia, faltam espaços públicos federais apresentados uma diversidade de programação cultural. Enfim, está faltando diálogo entre os Ministérios da área social. Esse seria o papel de um Ministro da Casa Civil promover.

Um Brasil de livros se faz com leitores motivados nas escolas e nas famílias. Não se cria mais leitores com disciplinas como “Circulo de Leitura” ou “Rodas de Leituras”. Essas iniciativas são sinalizações de estimulo pedagógico que precisam ser acompanhadas por outras iniciativas, por exemplo, “Caravanas dos Livros” (levar bibliotecas móveis em comunidades da periferia). Por fim, diante de um Governo que deseja ter a marca na busca da igualdade de gênero, não podemos ter ainda um enorme déficit de creches públicas no país. E Creches que estejam abertas até 18 horas, pois temos as creches que encerram suas atividades às 15 horas diante do silêncio de parlamentares até do campo da Esquerda.

sábado, 9 de dezembro de 2023

BOLETIM BRASÍLIA CONECTION - BBC 028 - RECOMPOR A GRANDE POLÍTICA

                                    Fotografia Cristiano Mariz (Veja 2016)

A Frente Democrática desafiada

Vagner Gomes de Souza

 

Não foi por falta de avisos que chegamos a dezembro afogados em números de duas pesquisas relevantes de opinião que vaticinam para a Democracia no Brasil um futuro incerto. O difícil mês de novembro foi apenas uma ponta do iceberg da complexa sociedade em que estamos a viver, uma vez que, a campanha eleitoral de 2022 se fez com uma fuga do debate programático e mais se desenrolou num sentimento de rejeição ao governo anterior. Entretanto, na prática da pequena política, há ainda muitas lideranças no campo progressista no cálculo de que houve uma ampla margem de vitória como nos sugerem as assustadoras negociações pré-eleitorais daqueles que alimentam a ideia de que o Governo avançará mais diante de inúmeras “frentes de esquerda” nas capitais e principais cidades do país.

Afogados nos números das pesquisas, o mal estar da crise da política ainda se mantém num fogo brando no aguardo da “picanha da autocracia” se não retornarmos ao fio da meada no desenho político das forças presentes na composição do Governo, que encerra seu primeiro ano com a Frente Democrática desafiada a se fazer presente apesar de todos os devaneios que testemunhamos nesses meses aparentemente perdidos se continuarem os lugares de fala de quadros políticos formados num “Asilo Arkham”. Diante disso a percepção da insegurança pública cresceu assim como os números do feminicídio puxados pela “locomotiva do voto retrógrado” no estado de São Paulo.

Enquanto a Frente Democrática é desafiada no terreno carioca pelo messianismo da Praça de São Salvador sob lideranças de beatos à esquerda, a Zona Sul (base eleitoral do que sobrou da chamada esquerda carioca) enfrenta a emergência dos “Justiceiros”. A derrota já se anuncia por antecipação para todos nós democratas por conta de articulações que não se atentam que o momento pede um passo atrás para se dar dois adiante. Os desafios cariocas seriam mais ousados, pois temos o maior bairro da América Latina (Campo Grande) com uma sociedade psicologicamente pressionada em fortes mutações e os valores da civilização se perdem numa velocidade assustadora. Aparentemente, não leram as linhas escritas por nós sobre a série “Cangaço Novo” que indicava referências do pensamento social brasileiro para se partir para uma nova tipologia da interpretação sobre os desafios postos nesse momento.


 Na verdade, grau da leitura política equivocada é proporcional a baixa densidade de leitura dos quadros intermediários envolvidos na política. Vivem de vídeos ou áudios com velocidade acelerada que simplificam a análise política, se foram as urnas com os livros nas mãos, o desafio será lê-los a cada mês. Portanto, a alta dos preços dos livros está nos rondando sob o silêncio dos Ministérios da Educação e da Cultura. A identidade do cinema brasileiro está sob pressão da ausência da reserva de espaços nas redes de cinemas por um possível descuido da assessoria parlamentar do ministério responsável pelo tema. Aliás, triste é a situação política de um governo em que os assessores ganham o protagonismo de atos falhos como se fossem encontrados numa plenária de estudantes secundaristas.

Falemos sobre a juventude. Com certeza os números das pesquisas não estão a sorrir para a Democracia. Na avaliação do Governo, o segmento de 16 – 24 anos ficam no “muro” da avaliação regular acima dos 40% como de além de nem trabalhar, nem estudar tenhamos também o nem opinar. Essa “massa incógnita” se transforma em seguida em opiniões mais reacionárias no segmento posterior. Logo, a juventude está abandonada nesse esvaziamento da Frente Democrática. Uma vez que os grupos juvenis mais articulados seriam os evangélicos e o a política organizada na criminalidade com bases com tamanha capilaridade nas periferias dos grandes centros urbanos, sugerimos que a incerteza para os próximos anos se acentuem se não modelarem um olhar para uma cultura política democrática na base da sociedade. Ainda mais num contexto de globalização da inteligência artificial ameaçando a existência dos empregos numa velocidade para além das condições de respostas dos diversos segmentos da gestão pública federal.

Entretanto, a democracia ainda é defendida como um valor positivo e as diversas vertentes da política brasileira defendem a liberdade em suas diversificadas nuances. Esses elementos nos permitem reconhecer que ainda temos um tempo para os ajustes necessários. Os sinais positivos já surgem no promissor encontro entre o atual Vice-Presidente da República e o ex-Governador de São Paulo que foi responsável por um amplo embate contra o negacionismo em relação a eficácia das vacinas contra a COVID-19. Devemos estimular novos reencontros como se seguíssemos o legado de Betinho que, em seu equilíbrio político, afirmava que quem tem fome tem pressa. Temos que olhar para os movimentos reais da sociedade e abandonar essas fantasias de narrativas pós-modernas, pois essas posturas estão fornecendo o combustível dos adversários do nosso marco civilizatório. 

 

segunda-feira, 4 de dezembro de 2023

BOLETIM BRASÍLIA CONECTION - BBC 027 - BUSCA DA SERENIDADE

Resgatar o fio da meada

 

Ricardo José de Azevedo Marinho[1]

 

Deixa a vida me levar em nossa linguagem é uma expressão que se refere à necessidade de agradecer o livramento cotidiano face às questões de caráter dramático que ela pode ou não possuir, algo que pretende ou não alimentar as tensões de um ou mais conflitos ou de situações que parecem ser mais graves do que realmente são. Ao subir o tom do cancioneiro popular, se salienta que não chegamos ao abismo, ao irreparável, nem às portas do inferno nem tão pouco às do paraíso.

Essa é a atmosfera que por vezes surge, e por vezes também, surgiram ao longo do primeiro ano do governo Lula-Alckmin, mas, mais genericamente, à atmosfera briguenta e turbulenta que se intensificou no debate político, à atmosfera de suspeita, grosseria e raiva permanente entre aqueles que governam e a oposição.

E essa percepção já se avizinha em torno da agenda de 2024 que é por vezes imatura e outras vezes exala mau humor, pois o carácter informativo necessário para não embarcar nessa canoa furada é pobre e a exacerbação da propaganda cobre tudo, parece que os defeitos ou virtudes do governo e da oposição não foram considerados como foco, mas sim sobre uma luta entre mundos opostos, onde o outro é a encarnação do mal. Os efeitos que isso tem desenvolvido é algo muito distante de uma cultura cívica saudável.

É claro que este espírito é resultante de não se ter construído de forma límpida e não ziguezagueante o governo da Frente Democrática que poderia compor um acordo aceitável para todos, ou pelo menos para o Grande Número.

Tal como num andamento anterior, a então dita esquerda radical, inflada pela sua suposta efêmera vitória, age de forma irresponsável e messiânica, com uma ideologia de reconstrução que contém aspectos delirantes, que alimenta uma extrema direita que se deseja divina pela sua política eleitoral motivada por um impulso hegemônico e imoderado em sua arrogância, ambas distantes em tudo da busca dos antagonismos em equilíbrio.


A grande maioria dos cidadãos, que certamente não conseguem explicar como é que a Frente Democrática não chegou a um acordo, acreditam com muito bom senso que ela ainda pode e deve acontecer, trazendo certamente boas surpresas reservadas para nós, mas não sabemos ainda o que vai ser.

O que sabemos é que as mudanças devem ser feitas pelas atuais instituições democráticas através do caminho testado e aprovado das reformas, como acontece nas democracias, sem gritar para o céu e removendo qualquer conotação apocalíptica.

Para tanto devemos tomar consciência, de uma vez por todas, de que, como todos os outros, atravessamos tempos sombrios, de dificuldades econômicas, em que estão ocorrendo guerras longas e sangrentas, e onde a democracia está desafiada (A democracia desafiada: recompor a política para um futuro incerto de Marco Aurélio Nogueira, Ateliê de Humanidades: São Paulo, 2023) em muitas latitudes e regiões, e não muito longe de nós. Estes ainda são tempos, como disse no final do século XIX o historiador suíço Jacob Burckardt, que no século seguinte as pessoas procurarão “salvadores” que oferecerão soluções duras e simples: “les terríveis simplificadores”.

No Brasil vivemos um momento complexo. Começamos a lembrar de que o bem-estar social requer uma economia bem arrumada. Se não tivermos recursos e investimentos produtivos, não haverá reforma tributária que ajude.

Isto não é inevitável e ao valorizar as reformas positivamente isso pode nos levar a transição bem-sucedida no desenvolvimento das forças produtivas como estamos vendo com a nossa bela atuação na COP 28 nesse quase fechamento de 2023 bem como na assunção do Rio de Janeiro como capital do G20 em 2024. Essas são as ações que podem permitir um novo impulso propulsivo e nos tirar do forte sonambulismo que já nos acometeu, como mostrou o historiador australiano Christopher Clark sobre o universo de 1914.

Isto requer uma atitude diferente de todas e todos. Requer um forte compromisso de cooperação para obtermos os resultados desejados. É necessária uma forma de convivência onde prevaleçam as boas razões, as boas palavras, lidar com a realidade de forma saudável e que se reduzam os maus sentimentos. Digamos que sejam reduzidos porque o seu desaparecimento é estranho à natureza do estado de coisas que aí está, que é, como sabemos, demasiado esquizoide. Daí que para o nosso bem-estar social, será necessário mais espírito coletivo, mais cooperação democrática e um pouco mais de ideais exequíveis.

 

Por um bom Natal e um 2024 sereno que permita um país e um mundo estável e próspero. Domingo, 3 de dezembro de 2023



[1] Presidente da CEDAE Saúde e professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da UniverCEDAE.