O
que a votação na Assembleia Geral da ONU revela sobre a relação do Brasil com
os Estados Unidos e a China?
Por
Rodrigo de Sousa Escaño¹
Uma
grande questão nas Relações Internacionais e Ciência Política é se é possível
medir o alinhamento entre países de maneira quantitativa. Uma medida aproximada
(proxy) para responder à questão seria calcular a convergência da
votação deles na Assembleia Geral das Nações Unidas.
É
fácil pensar em países que seriam interessantes para entender a relação com o
Brasil: os Estados Unidos são o país mais poderoso do mundo desde o fim da
segunda guerra mundial, e depois do colapso da União Soviética restou como
única superpotência mundial. Posição esta que passou a ser questionada
recentemente com a ascensão econômica e militar da China.
Como
a posição brasileira variou ao longo da Nova República em relação a esses
países? A mudança de presidentes ao longo desse período pode ter influenciado
algo?
Para
responder a essas perguntas, este artigo irá fazer uma análise exploratória da
base de dados mantida por Erik Voeten, professor da Georgetown University,
disponível no Harvard Dataverse². O percentual de alinhamento está calculado na
própria base. Iremos percorrer desde o governo de José Sarney até o último ano
de Jair Bolsonaro, separadamente para cada país de interesse.
Estados Unidos
Gráfico
1- Convergência Brasil e Estados Unidos na Assembleia Geral da ONU
Ao
contrário do que o autor esperava, o governo Collor (1990-1992) apresentou
declínio no alinhamento com os Estados Unidos em relação ao seu antecessor, José
Sarney. Em contraste, os governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso
(FHC) foram marcados por alto alinhamento, caindo nos dois últimos anos do mandato
deste.
A
convergência diminuiu drasticamente depois de Lula assumir o governo (2003), atingindo
o pico negativo de todo período analisado em 2007, porém voltando a subir a
partir do ano seguinte. O mundo então passava pela crise econômica de 2008, e
talvez a eleição de Barack Obama no mesmo ano tenha influenciado.
O
governo Dilma I manteve a tendência de alta no começo, começando com 41% logo
em 2011, porém observou uma forte queda a partir de 2013. Isto se deu
provavelmente ao escândalo da espionagem, onde se descobriu que a própria
presidenta havia sido grampeada pela Agência Nacional de Segurança dos Estados
Unidos, mais conhecida pela sigla em inglês, NSA.
O
governo Temer assistiu o pico histórico de convergência, 50% em 2016, porém viu
um leve declínio nos anos seguintes. A tendência geral do governo Bolsonaro foi
de alta, chegando a 48% em 2022.
China
Gráfico
2- Convergência Brasil e China na Assembleia Geral da ONU
A
convergência das votações na ONU entre Brasil e China são significativamente
maiores do que em relação aos Estados Unidos. Talvez isso se dê à similaridade
de interesses em diversas matérias entre países do chamado terceiro mundo ou
sul global, em oposição aos países ditos “ricos”. Porém, a ascensão chinesa
como potência econômica e militar mundial parece ter um efeito reverso ao
estudarmos o alinhamento brasileiro com ela.
A
série histórica chinesa começa altíssima, tendo mais de 90% de alinhamento em
todos os anos do governo Sarney e Collor. Porém, o Massacre da Praça da Paz
Celestial em 1989 pode ter afetado a relação entre os dois países. Já nos anos
finais de Collor se observa um declínio, que piora a partir de Itamar Franco
(1992), se mantendo por todo o governo FHC. O menor valor desse período foi 2002,
com 81%.
Com
os governos Lula I e II os valores voltam a aumentar levemente, ficando acima
de 85% durante este período. Esta tendência se manteve com Dilma I, chegando a
93% em 2013.
Após
Temer assumir (2016) há uma forte queda no alinhamento, quadro que se manteve
no governo Bolsonaro (2018-2022). Este observou o menor valor do período
analisado, 71% em 2022.
[1]
Doutorando em Ciência Política pela UNIRIO, pesquisador do Grupo de Relações
Internacionais e Sul Global (GRISUL).
Um comentário:
Obrigado companheiro Vagner pelo espaço cedido! Estou aberto ao debate, dúvidas ou sugestões.
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