quinta-feira, 20 de janeiro de 2022

A DOCE POLÍTICA NO CINEMA - NÚMERO 7

Breves lembranças de “Brave”

Por Micaela Luz

 

Rover Curiosity, uma das missões mais bem-sucedidas da NASA. Gagnam Style, do sul-coreano Psy. Corinthians bicampeão. O fim do mundo, previsto por 27 povos antigos diferentes, que não aconteceu. O lançamento do filme que uniu os principais heróis da Marvel em tela. O fim da trilogia de Nolan, com Batman – O Cavaleiro das Trevas Ressurge.

A princípio a ligação entre esses acontecimentos parece não existir, mas há sim uma característica que os une. Todos esses episódios marcaram o ano de 2012 e, agora em 2022, irão completar 10 anos.

Valente (“Brave”) possui essa mesma característica em comum. Lançado a quase 10 anos atrás, o filme conta a história de uma princesa que decide lutar pela sua liberdade e ir contra as tradições impostas a ela. Mesmo que para isso tenha que ir contra sua mãe, uma mulher estritamente rígida em relação às leis e aos costumes.

Merida, a protagonista do filme, queixa-se das expectativas, responsabilidades e deveres que a ela foram impostos pelo fato de ser uma princesa, princesa essa que precisa, acima de tudo, ser perfeita. Logo é possível ver quem é o originador de tais imposições, a mãe de Merida, Elinor. A rainha, a todo o momento, restringe a filha, colocando tradições como leis imutáveis e, de certa forma, retraindo o espírito livre que a filha possui.

Ao contrário das princesas mais tradicionais, Merida não se apaixona por um príncipe, ou espera por resgate, ela, na verdade, busca moldar seu próprio destino. O destino, aliás, é uma parte muito presente no filme, ele começa sendo entendido como algo imutável e predestinado e, no final, passa a ser entendido como um fruto das escolhas, como algo moldável as vontades e circunstâncias.

Merida é uma adolescente tentando se descobrir e sendo limitada pela visão que o mundo tem de uma princesa. Ela faz besteira, assim como todo adolescente, e depois se desdobra para tentar consertar, gerando assim um aprendizado e uma mudança, não só nela, mas também em sua mãe, mostrando como a experiência é sim algo formador de novas opiniões e visões. E, trazendo a questão da experiência, é possível trazer esse ensinamento para o mundo real, para fora da animação. A rigidez com a qual defendemos nossas visões de mundo é o que permite que loucos antivacinas e terraplanistas existam, pessoas que não se permitem experimentar um mundo fora de suas convicções.

No decorrer do filme é possível ver a personalidade de ambas, mãe e filha, por meio de traços físicos, tais quais roupas, postura e cabelo. A filha, com um espírito livre e aventureiro, possui roupas mais largas, cabelos soltos e uma postura confiante. A mãe, por sua vez, com sua personalidade rígida, possui roupas perfeitamente alinhadas, cabelos lisos e uma postura ereta, digna de uma rainha. O peso de uma tradição não pode nos aprisionar e nem as castas políticas, midiáticas, pastorais, jurídicas, dentre outras, carregarem consigo o monopólio da hereditariedade, como vemos políticos de gerações dominando o Estado com ações assistencialistas ou com uma “valentia” baseada na coerção como no caso de milícias. Nessa toada, o Rio de Janeiro nos oferece um triste cenário rico, seja o caso selvagem que nos assombrou com a morte do menino Henry Borel, seja com os “zeros” que assolaram a política fluminense.

No caso da animação, cabe destacar que foi a primeira a ter recebido um Oscar para uma mulher, a sua co-diretora, e que a produtora Pixar antecipou a conservadora Disney em um ano que foi forçada a pensar em uma dialética sem síntese com o lançamento de Frozen (cujo enfoque sobre o papel da princesa foi cobrado na UERJ em contraposição à Branca de Neve). O interessante das recentes histórias de princesas é que se não há a busca por príncipes abre-se a possibilidade pelo fim de monarquias e a criação de repúblicas democráticas inclusivas para todas e todos.

2 comentários:

@profleonunes disse...

Exelente reflexão jovem!!!!

Ricardo Marinho disse...

Muito interessante o texto que aponta sabiamente o trânsito épocal em que nos encontramos, embora também prudente em não arriscar apontar para qual destino. O triste episódio que envolve a morte de uma criança está lá assim como o germe da discussão complexa que envolve a nossa representação rustica e atrasada da cultura do familismo, ainda imperante entre nós, e em tanto outros rincões. Que nos venha a Spencer da Micaela Luz.