domingo, 12 de fevereiro de 2017

ATUALIDADE

O 18 Brumário Internacional e Nós
Por Pablo Spinelli
 
O ano de 2016, em um tom modestíssimo, foi no mínimo singular do ponto de vista internacional e nacional. Um ano que é caudatário de pendências de 2015 e que esse ainda deixará seu rastro por um tempo incerto, sua triste herança e alguns aprendizados para o que se iniciou; o ano onde o mundo falará – nostálgica ou raivosamente sobre o centenário da Revolução Bolchevique e também, talvez mais importante por conta da sua forte resistência de sobrevida na condição de clássico, a comemoração (ou não) dos 150 anos de “O Capital”, de Marx, um dos livros mais comentados, criticados, debatidos e em proporção inversa, lido da humanidade.
Na conjuntura internacional percebe-se uma lenta retomada de otimismo quanto à economia a partir dos indicadores dos EUA, com mais timidez na Europa desenvolvida e da retomada do crescimento chinês simultaneamente; no “sul do mundo”; os conflitos bélicos que permitem enormes lucros à indústria armamentista não param. A Primavera Árabe, como a de 1848, murchou. Iraque e Egito destruídos em facções, assim como a Líbia. Os caudatários da ordem autoritária desses países onde ainda persistem os pertencimentos tribais se foram e o Ocidente nada colocou no seu lugar a partir da política local com base na democracia. A Síria, numa relação com uma Rússia cujo mandatário está mais para inclinações da Grã-Rússia czarista do que para uma herança do socialismo real que muitos enxergam equivocadamente analogias – que já se extinguiu há tempos –, é um cenário de horror onde uma cidade histórica é dividida, patrimônios da humanidade são destruídos pela guerra e/ou pelo dogmatismo de grupos políticos-religiosos, como o Estado Islâmico, o que demonstra a necessidade de uma revisão do estatuto da ONU, instituição que foi esvaziada após o fim da URSS. Diante do quadro caótico permeado pela miséria, pelas guerras civis, pela ação do terrorismo onde o Estado se mostrou frágil como monopolizador do uso da violência, como defendem os liberais, assistiu-se uma das maiores migrações em massa desde a II Guerra Mundial (1940-1945). 
A Europa, como um todo, tentou se desvincular da sua "herança maldita", ou seja, tentou apagar seu passado imperialista, o mesmo o qual Edward Said havia alertado que iria cobrar seu preço. Há, por outro lado, algo a se saudar que é o posicionamento do Governo da Alemanha tendo em vista a trajetória política daquele país na primeira metade do século passado. Neste caso, as migrações serviram de mote para o endurecimento de concepções e opiniões de demagogos em épocas de crise, forma pela qual não se responde aos problemas da globalização, pelo contrário, não só não enfrenta os problemas postos por ela como a renega a partir do recrudescimento do Estado-Nação que permitiu da Grécia à Itália – berços da Antiguidade Clássica – um aumento da xenofobia e das direitas radicais, como vemos e veremos na França com uma Marine que não é a Marianne da bandeira tricolor, mas a da bandeira de cor negra de triste memória; como se percebe no surpreendente nacionalismo que o conservadorismo tradicional inglês não soube adestrar após anos de fomento, como foi o episódio do “BREXIT” quando a criatura (o nacionalismo) tomou para si o domínio da ação do Dr. Frankenstein (o liberalismo), em um dos países historicamente de maior liberdade quanto ao pluralismo de ideias, especialmente no século XIX. 
Na América Latina, o “bolivarismo”, um projeto que nunca disse a que veio, uma mistura de demagogia esquerdista com nuances keynesianas tropicais, teve seu fim para regozijo liberal. A onda neoliberal dos anos 1990 é hoje uma "marolinha" que ganha seu impulso a partir da insatisfação das camadas populares e médias diante da ineficácia do Estado assistencialista que se formou nos países que adotaram tal modelo. Mais um tento para o conservadorismo que associou – parte por culpa da retórica chavista – o Estado assistencialista com o comunismo e com isso tirou do baú os fantasmas que deixaram de ser há muito de ser um espectro - o discurso mofado do anticomunismo presente nas redes sociais à discursos de políticos na América Latina. O espectro que ronda aqui e alhures é o do fascismo, modelo que conseguiu de forma surpreendente e brilhante se reinventar no seu deslocamento do Estado para o mercado e ganhou escopo nos tecidos sociais. Nessa toada, um representante do mercado que se identificou alheio ao mundo político – e a História mostra que todos que assim o dizem são mais políticos que os que se reconhecem como tal – acabou por conquistar as mentes e corações nos EUA a despeito do establishment, inclusive do seu próprio partido. “House of Cards” foi inspirador para Trump que, por não ser leitor de Maquiavel, ao demonstrar por ora optar pela coerção sem consenso, sem a disputa da hegemonia, mas uma imposição da sua retórica aliada aos interesses corporativo caudatários da Guerra Fria tem como fiador o americano médio dos cinturões industriais que estão sofrendo o desemprego ou os grupos sectários racistas/segregacionistas, homofóbicos e outras vertentes do conservadorismo nos costumes como movimentos religiosos que apoiaram sua campanha.
Trata-se da herança da tradição do WASP ("Branco, Anglo-Saxão e Protestante" no acrônimo em ingês) do século XIX, um corpo estranho no mundo da globalização e do multiculturalismo. Por isso, seria estranho a sua simpatia entre os "mulatos e caboclos" no Brasil, mas percebemos uma cultura política alheia aos valores da democracia em diálogo com esses segmentos norte-americanos.
No Brasil, a crise econômica de 2015 deixou seu legado para 2016. Com a crise posta, a "timoneira" mudou o curso do navio sem antes expor aos navegantes a mudança da cabotagem logo após a sua segunda vitória eleitoral, como se viu na escolha do novo responsável pela Fazenda e pela fritura ao que ocupava o cargo. O mercado, ao perceber uma fragilidade na direção política aliado a uma mídia combativa como em 1954, 1964 e – após os movimentos sociais nas ruas – 1992 e aos  panelaços como os dos anos 1980 na Argentina feitos por uma classe média tradicional e também por aquela que foi batizada de “a nova classe média” (que virou nova justamente nos governos de liderança petista), acabou por optar pela especulação e rebaixou o Brasil pelas famosas agências de risco – o risco real é para quem acredita na lisura das análises dessas agências, como visto no filme “A Grande Aposta” – a despeito do enorme lucro ao mercado financeiro que o governo (desde FHC) permitiu ao colocar sua ênfase no pagamento da dívida pública. Por sua vez, a sociedade se “americaniza” cada vez mais. A pauta dos direitos ter se sobreposto aos conceitos de classe é algo que se originou nos fins dos anos 1970 e se consolidou nesse século – basta passar pelos campi universitários para ler os panfletos e ouvir as discussões dos alunos e dos professores, campo privilegiado da construção do conhecimento.
Nesse caminhar o Brasil chegou ao terreno perigoso da judicialização da política. Há, é verdade, um ponto positivo que é a descoberta de um poder que era alheio ao cidadão comum, o reforço do Ministério Público, momento em que a Carta de 1988 mostra sua face republicana, mas por outro, o efeito midiático contou como um dos alicerces das ações desse poder, como no STF, assim como a reforma ético-moral proposta pelos “tenentes de toga”, como citou um famoso cientista político brasileiro, que propuseram ações corretivas à corrupção em um grau tal que a sociedade fica descrente da política e quer um novo país – mas sem a classe política como esse país será parido?
No hibridismo de impeachment com golpe; de cassação sem a perda de direitos políticos, numa espécie de releitura do genial panfleto do século XIX, “Ação, Reação e Transação”; o Brasil ficou paralisado, a violência e o desemprego aumentaram e o vice-presidente que, desastrosamente resgata um modelo de governo à República Velha como se compreende a partir do seu slogan positivista – o que o aproxima dos “tenentes de toga” – e no Estado reformista que o aproxima de Campos Salles e Joaquim Murtinho e ressurge com nova modelagem uma "Política dos Governadores" a partir do laboratório que é o Rio de Janeiro, o estado das contrapartidas, onde após a privatização do trato público da água e do esgoto, tudo será normalizado, os salários do funcionalismo público serão colocados em dia, as esposas dos policiais militares voltarão sorridentes para suas casas, haverá menor índice de morte de PMs (ainda há de se perceber que a maioria que morreu esse ano curiosamente estava próximo ou dentro de um estabelecimento comercial - joalheria, restaurante, shopping - o que permite a leitura de que morreram por conta do "bico" e não por serem policiais). 
Por falar em Vargas, mais uma vez há uma nova volta do parafuso quanto à história do “fim da Era Vargas”. E mais um paradoxo surge. O enterro tem consigo os elementos do enxugamento da máquina pública; uma reforma previdenciária maximalista que tende a empurrar a classe média para a iniciativa privada; a racionalização burocrática.
Contudo, ao lado disso, a reforma ética-moral está com uma perigosa vida própria, um udenismo à esquerda e à direita que já derrubou seis ministros e um está sub-judice e faz o governo balançar na pinguela. Um liberalismo que se diz antivarguista, mas propõe uma reforma educacional por medida provisória, a herança do decreto-lei. O apoio de uma base congressista cuja maioria é fisiológica, cimentada em interesses econômico-corporativistas ou não republicanos apegados, como se viu na votação do impeachment, à família, à nação e à religião.
A Voz do Brasil não apenas se manteve no seu horário, saindo da pauta do Congresso a possibilidade de opção de transmissão – independente do trânsito, do futebol ou do bom-senso – como se tornou ostensivamente um mecanismo de propaganda do Executivo federal como nos tempos do presidente gaúcho que namorou de forma aberta com o positivismo e com o tenentismo. Dito de outra forma, a herança de Vargas que todos apedrejam é difícil de enterrar. 
Há por parte da sociedade o desejo da mudança, mas um repúdio aos atores tradicionais, o que numa crise de hegemonia abre uma possibilidade ao aventureirismo ou a um "bonapartismo", no clássico estudo de Marx (O 18 Brumário de Luís Bonaparte) e desenvolvido por Gramsci, com o "cesarismo". E como a História nos deixou de legado tal quadro, se confirmado,  é a derruição da democracia.
 

quinta-feira, 12 de janeiro de 2017

Cinema: Capitão Fantástico

Senhores e Caçadores em "Capitão Fantástico"
À memória do Major Thompson (Irmão de E. P. Thompson fuzilado na II Guerra Mundial)
Por Vagner Gomes de Souza
 
"À medida que o capitalismo (ou ´o mercado`) construiu a natureza e a necessidade humanas, a política econômica e seu antagonismo revolucionário passaram a supor que esse homem econômico existiu em todos os tempos. Encontramo-nos ao final de um século em que essa ideia tem de ser questionada. Não devemos jamais retomar à natureza humana pré-capitalista, embora lembrar-se de suas necessidades, expectativas e códigos alternativos possa dar novo alento à noção da gama de possibilidade de nossa própria natureza. Seria ao menos capaz de preparar-nos para um tempo em que as expectativas e necessidades capitalistas e do Estado comunista possam ser construídas de uma nova forma?"
E. P. Thompson (1991)
 
O filme "Capitão Fantástico" - que mereceria uma melhor atenção dos distribuidores do filme proporcionando sua exibição na periferia carioca - é a angústia ao nível de Graciliano Ramos na sua crítica ao capitalismo. Trata-se de uma polêmica sobre as vantagens e desvantagens do "orientalismo" para se fazer oposição ao "capitalismo selvagem" que potencializa a concentração da riqueza e as diferenças sociais, conforme a denúncia de Thomas Piketty em seu livro "O Capital no século XXI". Nesse filme, há um sugestivo convite para que façamos um balanço sobre o ativismo político pós-2008 (em nosso caso, brasileiros, pós-2013). O que melhor dizer sobre a referência ao linguista marxista Noam Chomsky?
O isolacionismo da política esquerdista é exposta nas brilhantes lembranças do equivocado "Oriente político", o qual a Revolução Cultural Chinesa é um triste paradigma. Trata-se de um fantasma de sectarismo nas atitudes que se apresentam no começo filme. Ao fundo, sugerimos que haja uma proposta de enfrentar os erros de uma nova "velha" esquerda socialista elibertária com vertentes de um "protoanarquismo" comunal, que emergiu na insurgência de alguns setores após 2008.
A vida familiar de Ben (protagonista do filme) mescla um comunalismo pré-capitalista e uma disciplina espartana. Gradualmente a simpatia do público nos minutos iniciais do filme entra numa encruzilhada da política. O temperamento isolacionista poderia "sufocar" personagens e público se a notícia de do falecimento da esposa do protagonista, por suicídio, não desse abertura para uma transição na narrativa. A dúvida passa a alimentar os personagens e, aos poucos, interage ao silêncio reflexivo do público quanto aos acertos e os equívocos na ação crítica a ganância do mercado.
A decisão familiar de partir para o Novo México (símbolo do expancionismo norte-americano) para se somar ao funeral da mãe permitiu ao roteiro do filme incorporar momentos de humor em pleno "road movie". Dentro de um ônibus se reunem todos e a diversidade começa a emergir. Conflitos e dissidências são expostos enquantos que os familiares entram em contato com o "mundo do capital". Na direção desse ônibus está Ben que intui que não pode ser uma nova leitura de Stalin no Meio Oeste Americano. Os erros da "miséria da teoria" do orientalismo político ganham maior nitidez e a flexibilidade da vida prática passa ser uma necessidade.
As referências iniciais a Trotsky, Mao Tsé Tung, Pol Pot e Stalin vão ser atenuadas pela transição dessa viagem em busca de um entendimento do que teria feito uma mulher budista tirar sua própria vida. Há um mistério ou não? Então, um brilhante giro no roteiro com a celebração da Declaração dos Direitos do Homem e uma referência crítica a China da atualidade. Nos dizeres da caçula da família: "Sem essa Declaração nosso país seria como a China". Olhares de espanto dos "familiares globalizados" incluindo os primos "trumpianos" e, podemos perceber, um mal estar do público esquerdista no cinema. Esse é o momento de se permitir a fazer a crítica para demonstrar que é possível um caminho democrático para esses Caçadores no combate aos Senhores do Capital. Portanto, o pacifismo oriental do budismo vai ganhando sua força na narrativa do filme. Para fazer cumprir o último desejo da mãe budista, a unidade familiar será recomposta com atitudes mais flexíveis. A cena de cremação da mãe ao som de Guns n Roses é um hino em favor do encontro democrático entre Ocidente e Oriente. Ao final, todos na mesa estudando, estudando e estudando.

segunda-feira, 19 de setembro de 2016

PARA ALÉM DA POLARIZAÇÃO: UMA ANÁLISE DA CONJUNTURA

Júlio Aurélio (Nosso Entrevistado)
 
Pouco tempo ainda nos distancia do afastamento definitivo da Presidente Dilma. Um longo processo político foi concluído, mas a crise política ainda está presente na sociedade brasileira diante de uma sequência de debates polarizados e um novo Governo de Coalizão que tateia superar a crise econômica. No momento, o Governo Temer está trilhando uma receita desenhada pelo governo anterior nos tempos de Joaquim Levy. Diante desse quadro complexo, VOTO POSITIVO convidou Júlio Aurélio Vianna Lopes para uma entrevista por e-mail. Ele é Pesquisador Titular em Ciências Sociais e Humanas da Fundação Casa de Rui Barbosa. Confiram a seguir.

 
1) Na sua opinião, o afastamento definitivo da Presidente Dilma em 31 de agosto foi um "Golpe Parlamentar"?
O procedimento inicial do impeachment, adotado pela Câmara, era uma tentativa de golpe pelo Parlamento, porque não obedecia a várias exigências da Constituição - especialmente a defesa ampla pela Presidência da República e a votação aberta (não secreta) pelos Deputados. Se assim tivesse transcorrido o impeachment, a destituição do governo teria resultado de uma ruptura constitucional.
Porém, esta tentativa de golpe parlamentar foi abortada pelo Supremo Tribunal Federal (STF) quando ele substituiu todo o procedimento da Câmara, ao lhe impor outro procedimento (extensivo também ao Senado, lugar do julgamento) com ampla defesa pelo Governo e voto aberto pelos parlamentares, em todas as fases. Cabe destacar que o procedimento definitivo do impeachment, pelo STF, resultou de seu acolhimento de todos os pedidos feitos pela Advocacia do Governo e, principalmente, por um dos partidos que o defenderam (o PC do B). Por isso, é completamente descabido - especialmente por estas entidades - alegar qualquer ruptura da formalidade constitucional (ou golpe parlamentar), já que o procedimento adotou todas as formas por eles defendidas e não as que os Deputados preferiam.
 
Assim como não houve golpe parlamentar quanto à forma - cuja ruptura é indispensável para caracterizar qualquer tipo de golpe politico (parlamentar ou não) na Democracia - também o conteúdo do impeachment pelo Senado não extrapolou a Constituição. Objetivamente, a Governante violava a lei orçamentária - do qual ela era acusada - à medida que manejava recursos do orçamento público entre órgãos (distintos e separados no interior da Administração) de maneira que, no mínimo, dificultava sua fiscalização externa. O que, proibido pela Constituição, já era uma irregularidade pontual criticada nos Governos FHC e Lula, adquiriu, especialmente durante o primeiro ano do Governo Dilma, uma constância no tempo (anual) e um montante de recursos do orçamento que impedia seu controle pelos órgãos fiscalizadores. E qualquer arbítrio presidencial no manejo do orçamento é caso para impeachment pela Constituição.
 
Este impeachment teve outro motivo jurídico que o do Presidente Collor, trazendo novos desafios para aperfeiçoar nossa ordem democrática: impedir que outros Chefes de Executivos (Governadores, Prefeitos e Presidentes da República) continuem ou retomem formas de arbítrio orçamentário. Mas para que esta consequência positiva se realize, é preciso que ao impeachment se aplique a proibição temporária de função pública - cuja não aplicação pelo Senado foi a única inconstitucionalidade do processo.
 
2) Seria o momento de defender Eleições Diretas Já para Presidente? Essa é a melhor palavra de ordem para as forças democráticas?
 
O melhor para a Democracia - critério que deve orientar lideranças que se considerem democráticas - é o cumprimento das leis e da Constituição por ela adotada. Portanto, nova eleição presidencial é legitima, no momento atual, somente como resultante de uma cassação - pelo Tribunal Superior Eleitoral - da chapa Dilma/Temer, vitoriosa na eleição de 2014. Tratar qualquer eleição de modo casuístico contraria a aprendizagem cívica da população que vive em uma Democracia Constitucional (ou Estado Democrático de Direito), onde os mandatos representativos têm suas interrupções previstas na Constituição.
 
Assim, cabe ao TSE, aos partidos democráticos e à cidadania apurar ou exigir a apuração, afinal, da denúncia de corrupção eleitoral pela chapa vitoriosa à Presidência. De fato, todos têm se omitido para resolver, afinal, sobre o assunto, cuja importância, para o aprendizado democrático, é tão importante quanto o do impeachment....
3) O Governo de Michel Temer representa as forças conservadoras?
 
Sua base tem a mesma composição de lideranças que formava os 13 anos dos governos de Lula e Dilma, a qual, devido a seu estilo próprio de isolamento pessoal - governando afastada dos partidos (incluindo o PT) que a apoiavam no Legislativo - se fragmentaram durante o fim de seu primeiro mandato e, especialmente, o inicio de seu segundo mandato. Isolada por opção, logo a Presidência se tornou ainda mais solitária pelo abandono progressivo dos aliados com os quais todas as suas politicas públicas - do Bolsa-Família ao Prouni - se tornaram reais. Implodida, politicamente, pela própria Presidência da República, sua coalizão de lideranças aliadas à esquerda buscou se recompor contra Dilma, já que não conseguiam se recompor com ela.
 
À recomposição da base politica - na qual se destacava o PMDB - por ex-aliados da esquerda, se aproximaram, progressivamente, as demais tendências centristas, nas quais se destacam o PSDB e DEM. O Governo Temer reuniu, assim, todo o centro brasileiro: tanto o que esteve junto ao PT em seus governos, quanto o de fora deles, ampliando a centro-direita em sua composição. Uma tensão interna entre suas tendências mais patrimoniais, de um lado, e mais neoliberais, de outro lado, acompanhará sua trajetória.
No contexto imediato - onde a dissolução econômica (cuja ponta é o desemprego disseminado) atual reflete a dissolução politica anterior - se deveria exigir do Governo Temer o papel de recomposição social e econômica do País. O que implicaria transpor seu perfil ideológico, através de um pacto nacional por uma retomada do crescimento sem penalizar a população mais vulnerável: apoiar quando assim o fizesse e criticar quando não o faça.
 
4) Há 30 anos o PMDB foi o maior vencedor das eleições para a Assembleia Constituinte de 1987/1988, em três décadas, como avalia o quadro partidário brasileiro diante uma fragmentação do Congresso Nacional em mais de 28 agremiações partidárias?
 
De fato, o PMDB de 30 anos atrás reunia todas as principais tendências centristas como nunca - inclusive uma relevante centro-esquerda que se dissolveu e uma centro-direita (organizada como "Centrão") que dele se descolou, ambas progressivamente, ao longo das décadas. A Constituição de 1988 - como tenho ressaltado em minhas obras - é o maior fruto das transações programáticas entre estas tendências centristas, mas abertas às esquerdas, pelas quais o PCB (original) contribuiu com o único e, por isso, influente projeto partidário de Carta Constitucional.
 
A insuficiente adesão à Democracia como valor universal - característica infeliz que ainda permeia as várias tendências ideológicas brasileiras - levou, porém, à subestimação constituinte do tema eleitoral/partidário, apesar de sua óbvia importância já na época. Ele foi o tema institucional mais desprezado pelos debates na Assembleia.
 
O resultado foi uma liberalização partidária à qual não correspondeu uma responsabilidade partidária equivalente. Mesmo a fidelidade entre partidos e membros - remetida a uma lei posterior que nunca foi feita - só começou a ser, minimamente, efetivada pelo STF. Mas, além de longe do ideal, uma regulação democrática do sistema partidário continua essencial para um funcionamento mais programático e menos pragmático entre as lideranças parlamentares e a Presidência da República. Pois a ética representativa começa nos partidos e eleitos ou sempre estarão à mercê do Poder Executivo, através de relações nas quais os eleitores não comparecem.
 
5) Seria conveniente uma Assembleia Constituinte Exclusiva para a "Reforma Política"?
 
 Como o sistema politico em geral - de governo (presidencial ou parlamentar), eleitoral (cômputos de votos e eleitores) e partidário (organização dos partidos) - continua sendo, desde o fim da Assembleia Constituinte eleita em 1986, sua principal falha e da nossa Democracia, novos esforços são necessários para o estabelecer. Neste sentido, além de juridicamente possível - apesar de controverso entre juristas da Constituição - uma Assembleia Constituinte exclusiva (seguida de consulta popular ou referendo) ou um Plebiscito constitucional (como de 1993) são alternativas cuja viabilização politica, junto ao Legislativo, trariam a principal reforma da Magna Carta: a reforma do seu sistema politico, assentando um modelo adequado à nossa experiência democrática de 30 anos. A melhor alternativa é a que for, politicamente, mais viável - importa desatar a reforma politica....
 
Desde logo, porém, enquanto se trabalha para construir uma alternativa constituinte que complete a ordem democrática, não se deve esquecer que, para muitas questões do sistema politico - regulação de Medidas Provisórias presidenciais, proibição de coligações eleitorais para Legislativos e fidelidade partidária - bastam leis e não se exigem mudanças constitucionais.

6) Diante das possíveis Emendas Constitucionais sobre a Previdência Social e Legislação Trabalhista, poderíamos dizer que o "Centrão" da Constituinte de 1987/88 estaria de volta?
 
A rigor, tanto os Governos FHC e Lula - cada qual a seu modo - confluíram, em seu interior, ambas as tendências constituintes fundamentais: tanto ao "Centrão" quanto aos seus adversários. Como demonstrei em "Como foi feita a Constituição de 1988" (Ed. Cultura), a derrota do "Centrão" adveio de sua decomposição e absorção pontuais, pela centro-esquerda, em cada tema constituinte votado pela Assembleia. Foi esta mesma confluência que viabilizou, politicamente, as hegemonias posteriores do PSDB e do PT.
 
Se conseguirmos transcender as retóricas da polarização atual, conseguiremos perceber que a agenda Temer/Meireles, essencialmente, não difere da agenda Dilma/Levy. Ambas as iniciativas que você citou já vinham sendo formuladas - basta verificar, no Governo passado, a Medida Provisória que permitia reduções negociadas de salários ou ampliação de idade mínima para aposentadoria, para a qual já se conversava com o sindicalismo.  
 
Tal como o Governo Dilma, o Governo Temer não tem apresentado criatividade diante do ajuste fiscal, cuja abrangência revela sua diferença de métodos: enquanto antes se apostava na reintrodução da CPMF, agora se dedicam a fixar um teto geral aos gastos públicos. O qual, sem excepcionar Educação e Saúde, seria tão socialmente regressivo quanto o imposto extinto....
 
7) A chamada judicialização da política brasileira não tenderia em afastar ainda mais a participação política da maioria da sociedade?
 
Ela tem um duplo aspecto contraditório: tanto amplia a democratização politica, de um lado, quanto a torna problemática, por outro lado.
 
Sua potência democrática - só há judicialização da politica em Democracias - está em facultar o exercício da cidadania por segmentos sociais cuja exclusão partidária não os impede de, através da provocação direta (ações individuais ou coletivas) ou indireta (órgãos públicos não-governamentais como Defensoria ou Ministério Público) do Judiciário, serem incluídos em politicas públicas contidas em decisões judiciais.
 
Seu risco autoritário - que não se cancela mesmo pela eleição de juízes - reside na aplicação das leis como única forma ou objetivo da cidadania. Dentro do Estado moderno e sua tripartição de Poderes, só há uma solução compensatória: o acompanhamento ou até a ratificação de decisões judiciais com impacto coletivo pela sociedade civil. Em meu próximo livro - sobre o tema do papel politico de redes sociais - pretendo demonstrar a viabilidade atual de instituições que superam o dilema da judicialização atual, ao torna-las canais pelos quais a diversidade cultural aponta para uma sociedade democrática como intercomunitária.

8) Para onde foi a esquerda brasileira após 13 anos de "Ciclo Petista"?
 
O PT não se tornou Governo, nem implementou as politicas públicas e sociais que o caracterizam  através da politica de alianças - exclusivas à esquerda - que sempre vocalizou. Foi pelo reconhecimento de que tanto o desenvolvimento nacional quanto a inclusão social - agenda que continua atual, mesmo com os inegáveis avanços do período petista - são questões atinentes também, no mínimo, às várias expressões (incluindo algumas conservadoras) do centro político brasileiro.
 
Entretanto, ao exercer, ineditamente, alianças amplas para além das esquerdas, seu maior partido não as adotou como programáticas - em torno da formulação de politicas públicas especificas, embora as tenha implementado - mas como meramente pragmáticas: elas se assentaram sobre exclusivos cálculos eleitorais. Seu pragmatismo o fez ingressar - como sua manifestação extrema - até mesmo no patrimonialismo brasileiro, atualizado sob a Democracia Politica por relações corrompidas entre órgãos públicos e empresas privadas, agora mediadas por lideranças partidárias.
 
Romper o caráter corrupto do capitalismo de Estado brasileiro, democratizando sua relação com o empresariado e interditando seu papel na corrupção eleitoral - valiosa sua proibição no financiamento de eleições pelo STF - é uma meta indispensável que a esquerda tem de assumir, conscientemente, na autocrítica efetiva da qual depende sua recomposição para enfrentar a extrema desigualdade social brasileira que continua intocada.



segunda-feira, 12 de setembro de 2016

ELEIÇÕES CARIOCAS 2016

 

A Esquerda na Encruzilhada das Eleições Cariocas

Por Vagner Gomes
 
Alessandro Molon (REDE), Jandira (PCdoB) e Marcelo Freixo (PSOL)
 
Já se faz muito distante os anos em que o Prefeito Saturnino Braga (então filiado ao PSB) decretou a falência da Prefeitura do Rio de Janeiro. Vivíamos altos índices de inflação no final da década de 80 e a pressão social era muito forte associada aos debates constituintes que inseriram novos direitos a Carta Constitucional de 1988. Foram meses de atrasos salariais e 1988 se encerrava com a eleição do candidato do PDT que migraria para o PSDB. Esse foi o desfecho de uma experiência de "centro-esquerda" na Administração Municipal que muitos do campo da esquerda faziam oposição. Uma experiência única na história eleitoral do Rio de Janeiro pós-1985 sem o devido balanço político para compreender os motivos de nunca uma candidatura da esquerda carioca ser vitoriosa para além de manifestações fortes no decorrer da campanha. Lembremos que Saturnino Braga foi eleito em tempos de eleições sem 2 Turnos, ou seja, teve uma votação próxima aos 50% dos votos válidos mas não superou esse patamar. 
 
Ao longo das eleições posteriores, o eleitor carioca sufragou candidaturas com perfil de "Centro" e com discurso de bons gestores públicos. Além disso, com a adoção do sistema de reeleição, em duas eleições o mandatário foi reeleito no Primeiro Turno (2004 - César Maia e 2012 - Eduardo Paes). E a esquerda carioca fez de tudo um pouco para não se reconhecer como força política minoritária no campo eleitoral da cidade.  Contudo, se o objetivo é vencer, só poderá ganhar para Governar o município se transitar políticamente para o "Centro" se aproximando da vertente do que foi a candidatura de Fernando Gabeira (PV - PSDB - PPS) em 2008. Há um patamar máximo eleitoral da esquerda carioca o qual verificamos nessas eleições mais uma vez, ou seja, o limite é 25% do eleitor. Portanto, nesse Primeiro Turno, as candidaturas de PSOL/PCB; PCdoB/PT; REDE/PV já se aproximam dessa faixa considerando a margem de erro. Trata-se do momento de viabilizar quem será o representante desse campo para um Segundo Turno com possibilidades de vitória.
 
Nos anos recentes, PPS, PSB, PT e PCdoB compartilharam alianças com o governismo local do PMDB sem questionar a perpetuação dos sistemas de trocas políticas nos suburbios cariocas. Deixaram o legado do chamado "lulismo" sob a hegemonia dessas forças políticas conservadoras a medida que o ativismo político do petencostalismo se consolidou. À margem da política, muitos jovens se radicalizaram e não estão ingressos no sistema da política eleitoral, o que criou mais constrangimentos para a configuração de uma política de aliança mais ampla para agremiações como o PSOL. Por outro lado, a REDE não ganhou capilaridade política na sociedade carioca pelos posicionamentos "bovaristas" da esquerda de classe média. Como se percebe, há um "dilema do prisioneiro" na mobilização pelo voto da esquerda carioca. É preciso demonstrar que é capaz de governar para além de um posicionamento ideológico. Mostrar que é possível governar para todos os cariocas é sair da da "zona de conforto"das teses esquerdistas.
 
Transitar para o "centro político" é o desafio para a esquerda carioca reforçando um programa político que lute pela radicalização das instituições democráticas já existentes. Deve-se reforçar e ampliar os mecanismos democráticos já existentes. Valorizar as eleições de Direção das Escolas Públicas sem critérios limitadores de candidaturas de educadores e abri-las aos finais de semana. Lutar pela transparência nas contas da Previdência dos Servidores municipais (PREVIRIO). Defender um Orçamento Participativo.  Falar mais em ciclovias nas periferias cariocas. São propostas de quem deseja governar para todos como essas, que farão o eleitor médio reconhecer na esquerda carioca um articulador de uma hegemonia do sentimento político democrático. Para sair da encruzilhada é necessário que a esquerda carioca faça sua mobilidade.
 
 
 


domingo, 10 de julho de 2016

Os Intelectuais e a Política no Brasil

 
O Historiador Caio Prado Júnior - Nossa homenagem

Historiadores por Mais Democracia

Por Pablo Spinelli
Vagner Gomes de Souza
 
Acompanhamos surpresos a recente polêmica em relação ao posicionamento político de um grupo de intelectuais chamados "Historiadores pela Democracia". Defendem a legalidade da continuidade do mandato da Presidente da República e ganharam notoriedade pela própria mídia ao qual eles acusam de "golpista". Não devemos aqui tecer comentários se estariam antecipando uma sentença da História uma vez que esse é um debate Político ao contrário de acadêmico. A imprensa hegemônica ganha na possibilidade de permitir a continuidade de uma falsa polarização entre aqueles grupos que estiveram por mais de uma década governando sustentados pela ressurreição do "Centrão".
 
Desde 1994, PSDB e PT estiveram no comando de Governos sem conquistar a hegemonia no Parlamento. Nas margens de seus programas políticos, cederam espaço para grupos políticos de um mosaico partidário conservador, porém que deu a estabilidade política e econômica para um tripé monetarista. Se a referência ao século XIX é permitida, nada como estabelecer uma comparação histórica com a alternância histórica entre Luizas e Saquaremas no Império Brasileiro. Contudo, não compactuamos com a observação de alguns politicólogos que enunciam PT e PSDB como Luzias e Saquaremas respectivamente. Ambos seriam segmentos do campo "Luzia" brasileiro sob a roupagem de uma tênue socialdemocracia. A medida que, a sustentabilidade, ora garantida pelo antigo PFL (no caso do PSDB) e ora pelo PMDB (no caso do PT), sempre estaria em mãos do campo "Saquarema" brasileiro. Desde 1994, melhor seria comparar com os tempos do "Gabinete da Conciliação" do Marquês do Paraná. Há um silêncio dos "Historiadores pela Democracia" em relação aos novos Tempo de Saquarema na defesa da Presidente da República.
Se, por um lado, no governo tucano houve como priorização a estabilidade da moeda e a acessibilidade mais flexível à entrada dos capitais de origem financeira, por outro, sem discordar da linha adotada, o governo petista sem se dissociar dos grandes bancos e empresas acabou por priorizar o social. A agenda petista foi mudando de acordo com as desventuras do seu timoneiro. O discurso antiamericanista, por exemplo, que julgava o Brasil como subserviente ao "Grande Irmão" do Norte, acabou por ser substituído pela ênfase de Obama ao fato do nosso presidente "ser o cara", noves fora, após a boa convivência com George W. Bush. O discurso antiamericanista hegemônico nas universidades não só não deixou de fazer a sua autocrítica como reforçou práticas do americanismo em curso no Brasil, basta olhar a agenda das cotas e das políticas de afirmação dos mais diversos matizes. 
 
As Universidades deveriam repensar de que forma está seu diálogo com a sociedade. Muitos dos jovens que ali estudam têm uma sobrecarga de trabalho com estudos onde a sua intervenção na sociedade resume-se a um diploma para supostamente se qualificar melhor no competitivo mercado, uma forma de sair da "ralé brasileira" das gerações que os antecederam. Por outro lado, uma boa parcela da juventude ainda está presa aos cânones ideológicos dos anos de 1960, onde 68 realmente é o ano que não termina, para inglória posição dos intelectuais que deveriam superar discursos anacrônicos com uma "estatolatria" que paradoxalmente se coaduna com a defesa dos direitos societais. Temos uma Universidade bifronte, a reação dos historiadores pela democracia não é pela democratização. Quando a maioria dos cursos determina o atrelamento do bacharelado à licenciatura ou o contrário, determina  um tempo maior dos jovens aos pilotis e gera um atraso da entrada de profissionais no mercado de trabalho e de cientistas nas universidades, logo, cria um déficit de professores nas escolas ou de pesquisadores nas universidades. Mais Democracia também é necessário defendermos nas Universidades Públicas brasileiras nesses tempos sombrios.
 
Uma luta pela democracia com um discurso único não é democracia. O clima de Fla x Flu não é bom para o debate acadêmico e cada vez mais os historiadores têm que fazer uma reflexão sobre o papel do historiador: ser um intelectual de gabinete da torre de marfim escrevendo artigos que serão lidos pelos seus pares na scielo ou patrocinados pela Biblioteca Nacional ou irão entender e dialogar com o que houve em 2013? Um balanço político da agonia de nossa sociedade que existe desde as jornadas de Junho de 2013 se faz necessária. Abriu-se uma crise do velho modelo da política centralizadora em que os herdeiros do Visconde de Uruguai seja à direita ou seja à esquerda não compreendem que esse Estado não é Democrático, mas centralizador. Compreendemos que há um outro caminho possível na radicalização da Democracia nos ganhos nascidos na Carta Constitucional de 1988 que foi fruto de um acordo político das forças políticas brasileiras. Uma centro-esquerda renovada se faz necessária nessa crise política para além de alinhamentos doutrinários.

segunda-feira, 6 de junho de 2016

CONJUNTURA CARIOCA - ENTREVISTA COM O VEREADOR PAULO PINHEIRO (PSOL)


"É necessário mudar os rumos dessas políticas, ou, a médio prazo, a solvência do instituto de previdência do servidor carioca estará ameaçada."
 
Vereador Paulo Pinheiro (PSOL)
 
A crise financeira do Estado do Rio de Janeiro acendeu um sinal de alerta para todos os servidores públicos da Capital, além da população carioca, quanto a possibilidade de que a crise se repita na Cidade Maravilhosa após as Olimpíadas de 2016. 
No dia 26 de maio, no artigo "O PMDB errou" (O Globo), o Vereador Paulo Pinheiro (PSOL) fez um balanço sobre os anos de gestão do PMDB na gestão estadual. Um possível fim de ciclo estaria se aproximando na Capital?
Atentos a isso, o BLOG VOTO POSITIVO foi ouvir a opinião do Vereador, que também falou sobre Saúde, Educação e a situação dos servidores públicos municipais.
 Leiam a seguir a Entrevista.
 
 
Vereador Paulo Pinheiro (PSOL)

 
1) No dia 26 de maio, O Globo publicou seu artigo "O PMDB errou", que faz um balanço dos 13 anos de gestão desse partido na administração do Rio de Janeiro. Você avalia que estamos no final de um "ciclo" na política estadual?
 
Sem dúvida! O final desse ciclo coincide com o final do ciclo do PT na política federal. Os reflexos dessa parceria PT/PMDB para o Rio de Janeiro foram nefastos. No município do Rio isso se materializou no desrespeito ao cidadão e no incentivo da chamada "cidade de negócios", um claro favorecimento aos grandes conglomerados econômicos, sobretudo às empreiteiras.
Precisamos dar novos rumos à política fluminense e carioca!
 
2) Em seu artigo, há uma citação de aproximação política entre o ex-Presidente Lula e o ex-Governador Sérgio Cabral com fundamental na construção dessa hegemonia política. Nesse caso, derrotar o PMDB no Rio de Janeiro seria o mesmo que enfrentar o chamado "lulismo" (alianças oportunistas e sem conteúdo programático feito pelo PT na história recente de política brasileira)?
 
 Creio que o próprio PMDB se encarregou de abandonar o "lulismo", por puro instinto de sobrevivência. E fez isso sem nunca considerar alianças programáticas, o que para eles sempre foi irrelevante. Para o PSOL, qualquer aliança sempre deverá passar por programas de governo, o que equivale dizer: jamais haverá qualquer aproximação com o PMDB ou com o PT.
 
3) Diante do quadro de crise financeira do Estado do Rio de Janeiro, podemos considerar que a eleição da Capital será importante para interromper esse longo ciclo do PMDB? De que maneira, com tantas pré-candidaturas originadas na base política de apoio do PMDB?
 
O próprio fato de diversas candidaturas se originarem desse grupo político evidencia a falência desse modelo no estado do Rio. Houve uma implosão dessa aliança nefasta que ocorreu pela "fadiga de material" que apresenta. Por isso, a eleição na Capital é fundamental no enfrentamento desse modelo. É esse o nosso desafio.
 
4) No seu artigo, você faz uma rápida menção as UPP´s (Unidades de Politica Pacificadora) limitadas pela falta de recurso público. Qual sua opinião sobre as UPP´s?
 
 Trata-se do melhor programa de segurança pública já implementado no país. Infelizmente, foi desvirtuado por interesses eleitorais e não teve a necessária contrapartida de investimentos sociais absolutamente essenciais para que alcançasse os resultado esperados. Mais uma oportunidade desperdiçada pela inoperância do Estado!
 
5) Em relação a sáude pública no Rio de Janeiro, como avalia a transferência de alguns Hospitais Estaduais para a gestão do Município do Rio de janeiro? Quem ganha com isso?
 
 A municipalização dos hospitais de emergência é algo que deveria ocorrer sistematicamente como previsto originalmente pela lei do SUS. Ocorre que, na forma como foi feita, isoladamente e sem planejamento sistêmico, só serve para dar prosseguimento à política de terceirizações posta em marcha há mais de vinte anos no país e que vem corroendo todo o sistema de saúde pública.
 
6) Algumas Clínicas da Família são anunciadas por seus colegas da Câmara de Vereadores como se fossem uma conquista do mandato deles no legislativo. Essa prática política é próxima ao que a ciência política chama de "clientelismo". Seu mandato como Vereador atua em outro sentido? De que forma?
 
 Nosso mandato combate o clientelismo político em todas as áreas, sobretudo, no atendimento à saúde do cidadão. A terceirização do atendimento na saúde só serve àqueles que se utilizam de indicações e apadrinhamento políticos para uso eleitoreiro. Para estes, o pleno funcionamento do SUS, inteiramente público, não interessa, pois perderiam o poder de indicar funcionários e de encaminhar pacientes. Para combater essa prática é que pregamos o concurso público como única forma de ingresso no serviço público.
 
7) Na educação, seu artigo menciona a profunda crise na gestão democrática que levou a ocupação de algumas escolas da Rede Estadual (além da Secretaria Estadual de Educação) pelos estudantes. Por outro lado, em relação ao Município do Rio de Janeiro, podemos considerar que a gestão da Capital na Educação erra em quais aspectos?
 
 É mais um exemplo da gestão privatista e de incentivo à cidade de negócios implantada pela prefeitura. As novas unidades como EDIs e Escolas do amanhã foram entregues às fundações privadas, desvalorizando o profissional de educação concursado e privilegiando as indicações políticas. trata-se de um processo que visa desmobilizar o servidor e facilitar a privatização da rede como um todo.
 
8) Se é verdade que o PMDB errou, podemos dizer que a esquerda carioca está começando a acertar?
 
 Não sei se podemos falar em "esquerda carioca", uma vez que alguns partidos tidos historicamente como de esquerda embarcaram nessa aliança com o PMDB desde o começo. Com certeza, nós do PSOL somos uma voz verdadeiramente de esquerda que esteve no campo de oposição desde que o PMDB chegou ao poder.
 
9) Em 2012, seu partido lançou a única candidatura viável do campo da esquerda? Esse ano será possível a unidade?
 
 Como pregamos, qualquer tipo de conversa em torno da unidade deve girar em torno de pontos programáticos, o que, pelo menos no primeiro turno, nos parece inviável no momento, já que os partidos apresentam programas bastante distintos.
 
10) Muitos servidores públicos municipais temem que a crise financeira do Estado também aconteça na Capital após as eleições. De que forma seu mandato tem acompanhado a situação fiscal das contas do Município e do PREVIRIO?
 
 Esse é um temor fundado na realidade do Estado brasileiro que não pode ser descartado no Rio. O município se endividou para realizar as grandes obras olímpicas e essa conta vai chegar. Além disso, o fato de não promover concursos públicos vem provocando o desequilíbrio das contas do PREVIRIO. Nosso mandato está atento a esse fato e vem se utilizando do Tribunal de Contas do Município para fiscalizar a situação fiscal e previdenciária do Rio de Janeiro.
É necessário mudar os rumos dessas políticas, ou, a médio prazo, a solvência do instituto de previdência do servidor carioca estará ameaçada.
 
 
 
 
 
 
 

quarta-feira, 27 de abril de 2016

Nosso Momento Político

 
Michel Temer no fio da navalha
 
Por Vagner Gomes de Souza
 
Nem a admissibilidade do processo de impeachment foi aprovado ou rejeitado no Senado e o Vice-presidente da República atravessa um doloroso fio da navalha. Tudo indica que a atual mandadária presidencial esgotará todos os recursos políticos para em seu provável afastamento definitivo levar o governante pós-impeachment a começar muito desgastado. O Governo Interino nasce sob a pressão política de resultados imediatos que muitos especialistas muito bem sabem que é impossível. Ganha o "lulismo" um segmento político forte na sociedade que lhe garante uma base para uma futura eleição presidencial. Tudo são movimentações políticas que se encaminham numa falsa negação do "Centro Político" brasileiro.
 
O PMDB encerrou o ano de 2015 com o documento "Uma Ponte para o Futuro". Uma revisão política na tradição republicana brasileira em sua relação com a sociedade. O documento, sem uma precisa avaliação da esquerda democrática até o presente momento, foi midiaticamente divulgado como uma Plataforma de Governo a ser implementada após as eleições de 2018. Contudo, as forças ultraliberais deram uma nova tradudibilidade política ao texto: poderia ser uma plataforma de transição com fortes ajustes fiscais. O PMDB foi deixando de tar a paternidade do conteúdo programático de questionar a "estadolatria" em tempos de crise por seu viés pragmático. A vertente de crítica a "estadolatria" foi alçada ao patamar de uma guianada liberalizante. "Uma Ponte para o Futuro" seria menos Democracia com mais movimentações ao mercado.
 
Numa provável interinidade de Governo, Michel Temer já sabe que não terá a adesão majoritária das forças que hoje convergem para o Impeachment. Não há condições de adotar um Programa a ser debatido pela sociedade em plena competição eleitoral. Contudo, significativos setores das classes dominantes adotaram "Uma Ponte para o Futuro" nessa nova linha interpretativa e sinalizam para que o principal partido da Oposição (PSDB) não assuma cargos. Não há uma saída viável pela Unidade Nacional. E o PSDB se orienta, até o presente momento, para uma alternativa oportunista. Não se afasta do PMDB para forçar uma guinada de reformas sociais que deveria ser o compromisso da socialdemocracia, mas para se preservar de desgastes eleitorais e assumir um compromisso com o "tripé macroeconômico" em uma nova versão da "Carta aos Brasileiros" (divulgada pelo pré-candidato Lula em 2002).
 
O "lulismo"e o "social-liberalismo" do PSDB convergem para que o "Centro Político" seja esvaziado em tempos de profunda crise política e econômica. A ética da responsabilidade não se faz presente e muito menos poderemos crer numa ética de convicção. São duas faces de uma mesma moeda que se faz na agenda econômica Palocci - Henrique Meirelles. Trata-se de uma antecipação das eleições de 2018 sem que avance no debate das eleições municipais com crise fiscal de Governos Estaduais e Municipais como observamos no simbólico caso do Rio de Janeiro às vésperas das Olimpíadas. O "lulismo", com o slogan do "Não vai ter Golpe!", imobilizou uma parcela significativa da esquerda para debater os problemas substantivos da crise. Além disso, se confirmar a ausência de PSDB e PSB no "Ministério de Salvação Nacional", a REDE Sustentabilidade não se fará diferente na conjuntura política nacional. Salvo um "aggiornamento" dos Marineiros que eram muito críticos ao PMDB em 2014 numa improvável adesão à tese da "Salvação Nacional".
 
Contudo, do que se espera de uma provável interinidade?  Na economia, deveria voltar os elementos de confiança de que teremos condições de atravessar o deserto da recessão econômica com uma gradual redução dos juros. Na política, o PMDB deveria abrir um processo de afastamento do Deputado Federal Eduardo Cunha de seus quadros partidários. Se o rito da expulsão soaria como excessiva, uma suspensão até que o mesmo fosse julgado no STF pelas acusações que lhe são atribuídas pela Procuradoria Geral da República. Duas sinalizações para que o "Centro Político" ocupe o cenário brasileiro com um perfil democrático. Entretanto, as forças políticas do "Pântano" da política brasileira ganham espaço nesse momento nas "Bancadas da Bala" e "Bancadas Evangélicas". As forças democráticas precisam estar atentas que um fracasso do Centro na política brasileira só beneficia as aventuras autoritárias e centralizadoras. O fio da navalha de Michel Temer poderá ser o labirinto de nossa democracia.
 

sexta-feira, 8 de janeiro de 2016

CINEMA: Opinião

 
Tal Lá, Tal Cá

Por Pablo Spinelli

Dedico à Walkiria Campanha, que sabe o valor da democracia e do amor.

O título acima poderia ser de uma letra de um tango argentino mas é uma proposta de uma análise comparativa da realidade trágica – as ditaduras militares apoiadas por vários elementos da sociedade civil - que se abateu na parte sul da América nos anos de 1970, período embrionário para muitos dos problemas que nos afligem na contemporaneidade.
Há um senso comum midiático e até mesmo acadêmico que aponta a grama do vizinho mais verde. Dito de maneira clara: a ditadura argentina teria dois componentes que nos seus extremos nos fazem inferiores histórica e analogamente – a ditadura argentina foi mais dura, repressiva, violenta que a brasileira, a ponto de filhos de presos políticos serem sequestrados e colocados para adoção a militares que os desejassem (o filme “A História Oficial”, de Luiz Puenzo, 1985, trata do tema) enquanto que a ditadura brasileira foi mais branda pela contagem do número (oficial) de mortos ao se comparar com o caso dos vizinhos platinos, como se o número de mortos fosse determinante quanto à maior ou menor brutalidade ou violência de um governo repressor.
O outro ponto refere-se ao fato de que os governos civis que se sucederam à ditadura – e não é o caso aqui de falar como foi a postura de Carlos Menem a respeito do tema – não foram complacentes com os horrores dos porões e a democracia argentina acabou por punir os seus algozes, algo que os aproximaria dos chilenos e os distanciaria do Brasil que optou por uma solução moderada e extremamente favorável ao enterro da memória do período que foi a Lei da Anistia; lei essa que na sua essência acabou por perdoar tanto os membros da esquerda “subversiva” quanto os opressores do regime. Em suma, enquanto que na Argentina houve uma revisão radical do seu período negro, aqui houve uma transação que permitiu a inatingibilidade da lei sobre os representantes agressivos do Estado brasileiro.
A produção cinematográfica argentina tem ocupado um espaço similar, salvaguardando as devidas proporções, ao que foi ocupado pelo cinema italiano nos longínquos anos 1960 e 1970, no Brasil. Enquanto que as produções brasileiras em sua maioria carregam no tom ensaístico, um olhar sociológico ou antropológico que predomina sobre o enredo, a produção argentina tem uma preocupação mais feliz nos seus roteiros e não deixam de produzir críticas políticas, sociais e econômicas, como se viu em indicações recentes ao Oscar do vitorioso “O Segredo dos Seus Olhos” [2009] e de “Relatos Selvagens” [2014]. No mais recente candidato argentino ao Oscar – isso não quer dizer que a Academia de Hollywood o escolha -, a película de Pablo Trapero, “O Clã” [2015] é mais uma abordagem sobre o tema da ditadura argentina – porém, aborda mais o seu crepúsculo - que de forma tangencial também foi tratada em “Um Conto Chinês”[2011] - do que os seus momentos mais duros como em “O Segredo”.
O filme já provoca um estranhamento quando aparece a figura do ex-presidente Raúl Alfonsin (1983-1989) que faz um discurso sobre como o seu governo democrático iria tratar o sistema de coerção, vigilância e violência criado pelo Estado ditatorial argentino. Esse estranhamento é por conta do apagar da memória das novas gerações, parafraseando “Vai Passar” de Chico Buarque, acerca do processo de redemocratização na América do Sul, algo um tanto desconhecido para aqueles com menos de trinta anos. À época, a redemocratização causa um impacto nos agentes da repressão, pois o mundo deles desabou em efeito similar ao que aconteceu com comunistas ortodoxos com o fim da URSS. O desmantelamento do Estado ditatorial provocou em muitos dos seus artífices o caminhar por senderos nada luminosos.
O caso do filme é exemplar. Uma família típica de classe média onde o pai é agente civil do Estado repressor, a mãe, uma dona de casa e professora (!), os filhos, estudantes tenazes e dois deles atletas profissionais, sendo o mais velho um atleta premiado de rugby. Diante dos problemas de ordem econômica que veio como consequência da ditadura militar – como no caso brasileiro – o pai não hesita em melhorar o status quo: usa o conhecimento adquirido nos porões estatais dos generais para sequestrar filhos de classe média alta, inclusive, amigos do seu filho famoso. A partir daí vemos episódios que mostram a permanência da violência instituída na sociedade pós-ditatorial; sequestros, homicídios, chantagens, tudo é feito por Arquimedes Puccio que dizia aos familiares de suas vítimas que tudo era operado por fantasiosos grupos extremistas de esquerda. Qualquer semelhança com o caso do Riocentro (1981) não é mera coincidência. Aos familiares – dos outros e depois para os seus – uma palavra que permeia o filme: “tranquilo, tranquilo”. Palavra que reforça a certeza da impunidade para o Sr. Puccio.
Os sequestros se tornam escabrosos a partir do momento em que mesmo após o pagamento do resgate a vítima é morta. A família Puccio sabia de tudo o que ocorria no porão de sua própria casa, destino dos reféns. O mais jovem acaba por se exilar da família e do país. O jovem atleta é atormentado entre o dever com o pai e o status adquirido e os imperativos morais; a mãe, uma lady Macbeth passiva que no seu silêncio afirma sua solidariedade ao patriarca. A filha mais velha naturaliza o ocorrido como se nada acontecesse. Essa Família Addams seria algo próximo de personagens de um diretor como Tarantino, mas o horror vem de que todos são personagens reais num episódio que expôs a continuidade do antigo regime na democracia política.
Para uma reflexão de paralelos com o nosso país, para além do futebol onde ambos perderam para o mesmo país, a Alemanha, de também triste e tenebroso passado no século XX, na última Copa do Mundo, o antigo regime ainda se fez e se faz presente em ambas as sociedades. Violência e corrupção policial, uma parte da classe média e da classe subalterna que apoia o extermínio dos “indesejáveis” à sociedade, o enraizamento de antigos membros do exército, da polícia e do aparato coercitivo do Estado nas áreas de segurança pública ou privada. O oficial que matou Carlos Lamarca já foi Secretário de Segurança do Rio de Janeiro, por exemplo. Um capitão reformado do exército, um dos melhores quadros para os interrogatórios e tortura de presos políticos acabou na contravenção como um dos mais famosos “banqueiros” do jogo do bicho, patrono de uma escola de samba e um dos fundadores da entidade privada que organiza os desfiles das escolas de samba na cidade do Rio de Janeiro (aqui cabe a sugestão de leitura do muito bom livro de Aloy Jupiara e Chico Otávio, “Os porões da contravenção – jogo do bicho e ditadura militar: a aliança que profissionalizou o crime organizado. Editora Record), isso para não falarmos da organização das milícias aqui e alhures.
O epílogo do filme onde mostra os destinos dos personagens principais acaba por desconstruir a tese posta acima que os argentinos foram mais punitivos que o caso brasileiro; pode-se perder de 7 a 1 ou de menos, mas derrota é derrota, cabe a nós, defensores da democracia, aprender e apreender com as realizações do “clã” (uma provocação argentina à família que acabou de sair da presidência algo similar – num outro paralelismo aos “hermanos” - ao que já aconteceu no governo do Estado do Rio de Janeiro, mas isso é outra história) a herança a qual devemos renunciar.

sexta-feira, 27 de novembro de 2015

A REPÚBLICA NO MUNDO DE HOJE

Mariana & Marianne

 
Ricardo José de Azevedo Marinho
15 de novembro de 2015 - 194º da Independência e 127º da República
 
 
Mariana & Marianne, duas damas, duas mulheres, duas moças, duas meninas que se encontram hoje a chorar conosco os seus. As dores, entretanto, não cancelam a esperança que ambas carregam. Doce é o Rio que as banha em bacia ainda que hoje esteja enlameada de sangue.
Estamos em tempos fraturados onde o que viceja é a escassez de agendas positivas. Olhamos, por toda parte e não encontramos boas palavras para essas horas aziagas.
Aqui, ao contrario, estamos dispostos a seguir em sua busca. E Mariana& Marianne estão conosco nessa labuta. O G20, que começou hoje em Antalya, na Turquia, precisará olhar com os valores humanos do Ocidente a forma de abrigar todos os refugiados e as refugiadas, uma vez que o país anfitrião abriga quase três milhões de sírios fugidos da guerra. Para o momento, Marianne escuta os falcões a convocarem outra guerra. Aquela que começou a se cantar nos idos de 2001.
 
 
Os relatos que nos chegam de viajantes da Europa e da Turquia, é que as refugiadas e os refugiados estão em toda a parte: pedindo esmola nas ruas ou amontoados em campos montados as pressas para eles.
Ou seja: inexiste visão humanitária disponível no mundo Ocidental. E tão pouco no Oriente. Essa era a hora para a concessão de vistos humanitários para as refugiadas e os refugiados e imigrantes.
Não! Aponta-se para a guerra como o caminho a ser perseguido. Se alimentar aquilo que gera o estado de coisas que ai está não pode ser uma proposta a se apostar. A xenofobia é o que alimenta essa visão anacrônica diante dos direitos humanos.
Ao mesmo tempo Mariana também se ressente dos seus que se foi com o rompimento das barragens de rejeitos da Samarco, que destruiu um vilarejo, matou várias pessoas e deixou outras tantas desaparecidas.
Não resta dúvida que foi desastrada e descuidada a forma pela qual os governos (federal e estaduais) lidaram com os efeitos do desastre.
De igual maneira se está adentrando em terreno nada proveitoso a humanidade com as soluções de velho tipo para a hora global.
Por isso precisamos de Mariana & Marianne irmãs nessa hora triste mas também noutras horas alegres da história mundial e suas inspirações não serão apagadas.
 
 


sábado, 7 de novembro de 2015

CONJUNTURA - BRASIL

 
Teses de Novembro sobre a Conjuntura Brasileira
Por Vagner Gomes de Souza

1. Uma grande virada mundial ocorre no mundo contemporâneo como consequência da crise econômica financeira inaugurada em 2008. Nesse momento, o Brasil tem a oportunidade de participar desse processo de modernização desde que empreenda mudanças importantes para a grandeza que a conjuntura se impõe. Os recentes alinhamentos da política externa precisam ser revistos pois reeditam uma ultrapassada orientação do "Bloco dos Países Não Alinhados". Contudo, em tempos pós-guerra-fria.
2. A cultura da paz. A defesa dos Direitos Humanos. As graves implicações dos múltiplos fundamentalismos. A questão ambiental. São problemas internacionais que as forças democráticas tem dificuldades em encaminhar entre a sociedade brasileira uma vez que muitas forças progressistas se confundem no campo de nacionalismo e de um "bolivarismo" sectário.
3. A inserção soberana do Brasil no cenário internacional se fará pela ampliação dos valores da democracia num caminho institucional e humano. Entretanto, nossa viabilidade como referencial dos valores humanos nesse momento são impactados pela gravidade de nossa atual crise política. Trata-se da maior crise desde a redemocratização em 1985, o que impõe novas posturas do campo democrático e progressista.
4. Uma nova geração emergiu em mais de duas décadas de Plano Real alheia ao mundo político. A estabilização da economia gradualmente foi reforçando o afastamento dessa vertente em relação a política. Nossos quadros políticos são netos e filhos de políticos profissionalizados há quase 30 anos. Por outro lado, a esquerda brasileira encontra-se distante de qualquer linha interpretativa renovada para o país. O vazio de lideranças na política brasileira que contribuam para enfrentar a crise é demonstração de que nenhum personagem da "pequena política" esteja disposto a renunciar o cotidiano de sua sobrevivência eleitoral para se tornar um "ator político".
5. Esse diagnóstico poderia explicar esse "mal-estar" com a política que observamos na sociedade, porém ela precisa estar organizada para enfrentar os problemas que se avolumam para os próximos meses. Não se observa uma "luz ao final do túnel" sem que haja forças políticas comprometidas e realizando um diálogo nacional ao redor de um programa de reformas.
6. Seja a "Agenda Brasil" ou "Uma ponte para o futuro". Dois momentos de inspiração em que nada se encaminha de real para a sociedade. Não se pode permitir um silêncio por mais tempo pois presenciamos um perigo para a institucionalidade democrática. Nada se fará sem o centro político. Portanto, devemos zelar para que esse campo não se deixe encantar pelo conservadorismo.
7. Diversas frentes e/ou manifestações de conservadorismo aparecem no meio desse "turbilhão" que é a crise política brasileira. Trata-se de ensaios da ante-sala da volta de um Antigo Regime mais centralizador, ou seja, o pior dos mundos para as forças democráticas e progressistas. Mas, o que dizem essas forças democráticas e progressistas? Nada que tenha grande impacto ou visibilidade para a sociedade. Deixaram a sociedade a deriva nesses tempos de crise pois estão analisando a crise com o "retrovisor" de um Brasil do pré-1964.
8. O capitalismo veio para ficar por um bom tempo. Há décadas. Agora, o capitalismo brasileiro precisa estar comprometido com a democracia. Esse deve ser o elo político renovador de uma esquerda democrática e das forças novas da política. Ou não temem um fantasma "pinochetista"?
9. O debate deve ser para além do apoio ou condenação do "impeachment". O desgaste político é grande pela falta de iniciativa política do Governo e da Oposição em realizar algo mais sensível para a população. Por outro lado, os setores sociais organizados aparentemente empurram essa crise em "banho maria" numa espera de uma solução no "sebastianismo" do Lulismo. Virar a página do Lulismo é fundamental para termos novos sujeitos políticos no campo democrático e progressista.
10. Nesse momento, as eleições municipais do próximo ano parecem numa distância política de séculos porque não estamos respondendo no dia a dia os problemas da sociedade. Esse é um cenário político que exige novos caminhos que não renunciem a nossa democracia. Por isso, cada tempo gasto na reflexão da política atual é um ganho de dias a mais para nossa sociedade que desperte na efetivação de uma "revolução passiva" de baixo para cima.

quinta-feira, 1 de outubro de 2015

VAI QUE COLA - UMA OPINIÃO

 
O Macunaíma do Subúrbio
 
Por Vagner Gomes
 
Paulo Gustavo é de uma nova geração de humoristas que surgiram com peças lotadas nos últimos anos. "Minha mãe é uma peça", "Hiperativo" e "220 volts" são exemplos desse sucesso de público nas artes cênicas que também se estendeu ao cinema com "Minha mãe...". Na televisão, sua atuação na série "Vai que cola" garante muitos "cacos" que mantêm a continuidade da audiência num canal da TV por assinatura.
Trata-se de "Vai que cola - o filme" uma iniciativa ousada para que refletirmos nesse momento político. O roteiro, muito bem desenvolvido, permite que vejamos a volta do personagem Valdomiro Lacerda - Valdo (Paulo Gustavo) para a sua cobertura no Leblon. Trata-se de mais uma implicação do mesmo na trama sobre seu envolvimento na corrupção como "laranja" de uma grande corporação de Engenharia que ganha uma licitação para construção de abrigos para idosos.
 Um bom entendedor, perceberá que nem tudo seria mera coincidência no submundo em que o simpático Valdo se envolve. Um "anti-herói" do humor apresenta-se diante do público em pequenas doses que fazem a sátira e pode estabelecer momentos de reflexão sobre a cultura cívica de nosso país.
Além disso, há uma visão inteligente na abordagem sobre a Cidade Partida nesse filme ao vermos uma paródia comparativa sobre a forma de vida no Méier. A Zona Norte carioca é um microcosmos para diversas periferias do nosso país. Contudo, há a visão romântica da formação ética forte nessas localidades mesmo que tenhamos personagens dúbios quanto ao uso da verdade.
Os personagens da pensão de "Dona Jô" lembram muito dos perfis antropológicos de uma sociedade americanizada e muito influenciada pelas redes sociais. Uma antropofagia da Zona Sul é feita no subúrbio de Vai que Cola. Por isso, o filme ganha muito de dramaticidade política pela via do humor como se ilustrou na presença da expressão "delação premiada".

sábado, 11 de abril de 2015

SÉRIE: DIÁLOGOS SOBRE A CONJUNTURA NACIONAL

A IRRESISTÍVEL TENTAÇÃO DO GUETO POLÍTICO
                   Luiz Eduardo Soares
 
A onda conservadora no Congresso, sob a batuta do que há de pior no PMDB --que ocupou o espaço deixado vazio pela desmoralização do PT e do governo--, ameaça tanto as conquistas sociais e os direitos civis e trabalhistas, quanto a crise provocada pelo bonapartismo arrogante e obscurantista de Dilma. A pauta reacionária no Parlamento inclui a consagração da terceirização, a redução da idade de imputabilidade penal e a revogação dos avanços no controle de armas. Por sua vez, os efeitos da crise econômica podem vir a dilapidar a redução das desigualdades e o aumento da renda dos mais vulneráveis, gerando desemprego e decepções em larga escala.
Tão dramático quanto este quadro é o seguinte: a miséria herdada mais imobiliza do que potencializa a participação cidadã e política; mas a perda do que se conquistou estimula a mobilização, com frequência, regressiva, ressentida, tendente a deixar-se capitalizar pelas forças mais conservadoras, quando não propriamente autoritárias. À direita, mais provavelmente, mas também à esquerda.
Por isso, em vez de frentes de esquerda sectárias, estreitas, enamoradas do chavismo e dos populismos autoritários, trata-se, e com urgência, de contribuir para a tessitura de uma frente ampla democrática --mais ao nível da sociedade do que dos partidos--, capaz de defender as conquistas e os direitos. A frente estreita esquerdista que está sendo construída é composta por lideranças e partidos que não foram capazes de enxergar aonde nos conduzia a política econômica desastrada de Dilma, ao longo do primeiro mandato, e que tampouco compreenderam como e por que a adesão do governo e do PT aos métodos políticos tradicionais, e sua tolerância com a corrupção, aprofundariam o descrédito da política, atingindo o coração da democracia.
Essa frente de esquerda não só é impotente para barrar os assaltos reacionários contra os direitos, como reduz as chances de que se constitua um arco de alianças suficientemente amplo em defesa das conquistas e dos direitos ameaçados, seja pela ação parlamentar conservadora, seja pela crise econômica. A frente esquerdista, entretanto, interessa ao bloco no poder, sobretudo a Dilma e ao PT, porque reproduz o discurso e o simbolismo da bipolarização. Isso é tudo o que o PT quer, reeditando a tática que aplicou na campanha. O dualismo do tipo guerra fria, em que o outro não é alvo de crítica e divergência, mas de condenação moral, em que o adversário é inimigo, em que o contencioso opõe povo e elites, bolivarianismo e neoliberalismo, este falso dualismo salva o PT e Dilma, tornando-os o eixo em torno do qual vão girar as alianças possíveis.
De meu ponto de vista, quem sustenta que a saída da crise é pela esquerda não entendeu rigorosamente nada sobre nosso passado e nosso presente, e está brincando com nosso futuro. A saída é uma ampla coalizão em torno dos direitos e das conquistas, em diálogo com as ruas, envolvendo a mobilização não aparelhada da sociedade, disputando o justo sentimento de indignação e evitando que ele seja capturado pela direita. O horizonte, isto é, o futuro a buscar é uma governança transparente, rigorosamente refratária à corrupção, aberta à participação, respeitando os direitos históricos dos trabalhadores, comprometida com a pauta humanista, os direitos humanos, os direitos dos indígenas, com a sustentabilidade e a redução das desigualdades, e refratária a improvisações irresponsáveis de efeitos destrutivos, sob a forma de um capitalismo de Estado ou de um projeto populista desenvolvimentista.
Não está na agenda histórica socialismo nenhum. Está na agenda a defesa dos direitos duramente conquistados e a disputa pelos setores de classe média --e não só-- que o PT empurrou para a direita, com seu apetite despolitizado pelo poder. As classificações simplistas e maniqueístas servem à bipolarização e ao governo e seus sócios, no Congresso. Não servem para pensar, dialogar e fazer política de novo tipo, cuja hora chegou.