Ricardo José de
Azevedo Marinho[1]
Savater, Fernando. Carne Governada: De política, amor y deseo.
Barcelona: Editorial Ariel, 201. 176 págs.
No Agosto Lilás de 2022 fiz uma breve resenha de um livro sem
tradução em nossa língua vernácula da mexicana Cristina Rivera Garza intitulado
El invencible verano de Liliana.
Ciudad de México: Penguin Random House, 2021. 304 págs. Poucos meses depois,
para nosso aprendizado coletivo, saiu a nossa tradução pela Autêntica
Contemporânea.
Fiz a resenha por conta de um assunto medonho que ainda se
encontra entre nós e que não conseguimos erradicar que é o feminicídio.
No início desse 2024, foi publicado o último livro do espanhol
asturiano Fernando Savater chamado Carne
Governada: De política, amor y deseo. É uma fruta deliciosa da árvore da
sabedoria do “estilo tardio”.
“Estilo tardio” refere-se ao modo de escrever após uma vasta
experiência de vida de autoras e autores notáveis, que deixam para trás as
pretensões estilísticas da juventude, e escrevem buscando sua simplicidade
essencial.
Um exemplo de estilo tardio é o fabuloso O informe de Brodie, onde o argentino Borges (1899-1986) diz que
finalmente tenta o que sempre admirou como o sardo italiano Gramsci
(1891-1937), o estilo dos contos simples do crioulo britânico Kipling
(1865-1936).
Isto é o que acontece com Carne Governada, talvez o livro mais pessoal, iconoclasta, mais livre,
mais tematicamente diverso, mais erótico, mais reflexivo, mais político e mais
alegre em sua anarquia juvenil, moderada pela idade, que Savater já escreveu.
“Carne governada” é o nome de um prato asturiano. Refere-se à
carne que o preparo e o tempo de cozimento amaciam a ponto de adquirir sua
textura mais macia e o melhor de seu sabor. Hoje em dia é raro encontrar esse
prato. Mas foi isso que a idade fez com Savater.
Se você acha que estou andando por Savater para evitar escrever
sobre o nosso momento eleitoral, você está errado. Faço isso para chegar a uma
das passagens de Carne Governada
sobre o que está acontecendo no Brasil e em grande parte do planeta.
Rapidamente um trecho sequenciado do Capítulo 4:
Porque é que a esquerda mantém
uma reputação tão boa, apesar dos crueis fracassos históricos que sofreu onde
quer que tenha prevalecido? Por causa de uma visão tendenciosa que estabeleceu
a norma de julgar a esquerda pelas suas intenções e a direita pelos seus
resultados. Se proclamamos que queremos acabar com a miséria e a desigualdade,
só podemos aplaudir estes objetivos generosos. Que diferença das propostas da
direita, que falam da prosperidade alcançada através do trabalho remunerado, da
propriedade privada, de uma ordem social baseada no cumprimento das leis! É
verdade que os belos planos da esquerda nunca foram concretizados (...) Mas
qual é a culpa do ideal (...)? O que é excelente continua a ser excelente mesmo
que aqueles que se dedicam a pregá-lo não tenham ideia de como consegui-lo ou,
pior ainda, consigam com as suas medidas políticas o contrário daquilo que
perseguem.
Parece familiar para você?
22
de setembro de 2024
[1] Presidente do Conselho Deliberativo da CEDAE Saúde e
professor da Faculdade Unyleya, da UniverCEDAE, da Teia de Saberes e do
Instituto Devecchi.
Um comentário:
iNTERESSANTE RESENHA E BEM ACERTIVA DE CERTA FORMA...
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