terça-feira, 23 de janeiro de 2024

A DOCE POLÍTICA NO CINEMA - NÚMERO 22 - O SOL DO AMANHÃ


 Uma História de Amor com Política ou Política com Amor

Em memória de Vladimir Ilyich Ulianov (1970-1924)

Por Vagner Gomes de Souza

 

“Ter a impressão de estar sempre no

Ponto de partida

E fechar a porta para deixar o mundo

Fora do quarto

Considerar que você é a razão pela qual eu

Vivo”

 

Trecho traduzido de “Sono Solo Parole”

Noemi

 

Lenin disse certa vez que o comunismo seria a eletrificação de todo o país. Eis que essa inspiração está presente no filme O Melhor está Por Vir (a tradução literal do italiano seria “O Sol do Futuro”) do italiano Nanni Moretti que muito bem celebra seus 50 anos de carreira como Diretor, Ator e Produtor.

Aos 20 anos, Moretti estreava um filme em super 8. O filme se chama “La sconfita” e fala sobre um militante do paradigmático ano de 1968. Esse seria talvez a marca desse intelectual da sétima arte com sua forte ligação na política italiana e mundial. O peso de 68 fez do humor de Moretti um pouco afeito as leituras um pouco sectárias as conciliações.  Sugerimos que assistam “Caro Diário” (1993) que tem um pouco de autobiografia na sua luta contra o câncer e lhe conferiu a premiação de Melhor Direção no Festival de Cannes. Entretanto, desde o surgimento de Silvio Berlusconi ele intensifica sua atividade cinematográfica como busca de resistência. Todavia, essa seria outra história e voltemos a falar de “O melhor está por vir”.

Na abertura, o título nasce de uma pichação como se fosse o famoso cumprimento de “tarefa” dos militantes comunistas. Na sequência, apresenta-se o “filme” dentro do filme aonde há a cerimônia da chegada da luz num bairro italiano na apresentação de Ennio como dirigente local do Partido Comunista Italiano. Eis que se descobre que o comunismo, como força dos movimentos reais, se preocupava em resolver os problemas dos mais necessitados. O Diretor Giovanni seria esse mesmo dirigente numa construção de roteiro de espelho uma vez que ambos poderiam estar a caminho de um abismo diante das dificuldades que enfrentam. Ennio diante de uma apresentação circense de búlgaros no ano de 1956 (ano da intervenção soviética na Bulgária). Giovanni no desafio de fazer um filme que achava ser político, mas, a todo o momento, a vida o fazia se encontrar com as amarguras e só o Amor poderia lhe fazer continuar.

Um filme que do Amor se realiza a política em sua mais fina forma de buscar compreender como de Berlusconi se chegou a Giorgia Meloni. No filme, as considerações sobre a banalização das cenas de violência na arte cinematográfica nos permite pensar se o mesmo ocorreria em relação a adesão da juventude ao gênero do terror e aos filmes Marvel e DC. Onde está o tempo gasto para a reflexão? Sem esse exercício, tudo estaria a se perder naquilo que poderíamos chamar de subversão.


Apesar de Ennio e Giovanni serem os protagonistas, as mulheres emerge como aquelas que apresentam as soluções aos problemas que surgem desde o seja para 1956 quanto para a finalização do filme pela via asiática numa referência aos novos caminhos do mercado cinematográfico. Paola e Vera são personagens necessárias aos dirigentes uma vez que a vida se constrói sempre nas contradições. Não se pode temer a vivência da experiência, pois nem tudo está acabado. Um filme que se pensa a partir de seu final pode renascer com outro amanhã.

Fujamos dos atalhos daqueles que leem o filme na chave da nostalgia. Tudo é uma declaração de Amor amadurecido e com amadurecimento. E a cada grito de “Ação” nos aparece uma canção. Moretti nos faz outra vez lembrar a importância da música no cinema. A filha de Giovanni é música e estaria a compor a trilha de seu filme. Uma crítica a aqueles que o debate seria o uso da inteligência artificial nas produções. A vitória da música como numa cena de dança de todos envolvidos na produção do filme. O mesmo se observa na cena do coral de “Sono solo parole” como se fosse o momento de se dar início as movimentações da sociedade e também do coração: “Esperar que amanhã chegue depressa e que / Desapareça cada pensamento”.

Moretti não parece fazer um distanciamento de suas convicções de juventude, porém está muito aberto a ouvir os conselhos que o tempo lhe impõe. Assim, um filme que nos aquece com seu final que reúne elenco e alguns atores que se destacaram em outros filmes de Nanni Moretti. Seria o reencontro com uma trilha, pois “as batalhas que valem a pena são aquelas que à partida estão perdidas”, como ele gosta de pontuar.

 

Um comentário:

Anônimo disse...

Bom texto.