domingo, 18 de dezembro de 2022

A DOCE POLÍTICA NO CINEMA - NÚMERO 13 - AS AVENTURAS DE PINÓQUIO (2022)

As Aventuras de Del Toro

Por Vagner Gomes de Souza

 

As Aventuras de Pinóquio foi escrito em capítulos na Itália a partir de 1881. Seu autor, Carlo Collodi, lançou o livro com ilustrações em 1883. Coincidentemente, esse é o ano de nascimento de Benito Mussolini numa localidade há quase 65 quilômetros de Florença (cidade de Collodi e também de Nicolau Maquiavel). Portanto, trata-se de uma obra de literatura infantil tardia do renascimento uma vez que o boneco é a melhor expressão do conceito de antropocentrismo. Além disso, há passagens do texto que sugerem um diálogo entre O Príncipe e Leviatã até chegar ao clímax do “peixe monstro” que engoliu Gepetto. No livro há muito a valorização da educação vide o esforço do marceneiro em vender seu casaco para comprar os livros escolares do boneco.

A unificação italiana (1848 – 1871) teve um possível balanço pelas linhas que se assemelham a uma história de terror. O clássico de animação da Walt Disney (1940) buscou introduzir o reformismo liberal do New Deal associado a cobrança de uma “ética na política” que seria o incomodo em relação as forças políticas do populismo norte-americano – a força simbólica do nariz a crescer a cada mentira do boneco. Os Estados Unidos ainda não estava na Segunda Guerra Mundial que mostrava o terror do fascismo na Europa. Então, o “Grilo Falante” e a “Fada Azul” dialogavam com a ética protestante de Max Weber para que o boneco se transformasse num ser humano correto e moldado para esse novo mundo.

Entretanto, As aventuras de Pinóquio sob a direção de Guilherme del Toro nos vem depois das idas de Joe Biden para o “picadeiro” do Circo mundial numa aterrorizante pré-estreia do que pode ser uma “Segunda Guerra Fria”. Há momentos que uma obra cinematográfica está muita empenhada a falar do momento político contemporâneo. A contribuição do diretor de O Labirinto do Fauno é muito importante para todas as gerações.  Ele transmite ao público esses sinais de alerta sobre os perigos que a rotinização da democracia. Não se podem trilhar os erros americanizados, pois um sardo, provavelmente lido pelo grilo Sebastian C., escreveu que em política gera o fascismo.


O perigo do fascismo contemporâneo, com suas novas roupagens na tecnologia das redes sociais, ainda precisa de estudos aprofundados. Todavia o gênero do “terror”, que muito atraem adolescentes e jovens, poderia ser mais uma oportunidade para que façamos uma unidade. Alfred Hitchcock e o “cancelado” Roman Polanski seriam “escolas” revisitadas pelo diretor/roteirista/produtor mexicano.

 Em sua obra há uma universalidade que ganhou o mundo talvez por ter vivenciado as mazelas do hegemonismo do Partido Revolucionário Institucional – PRI (1929 – 2000) no México. E, em 2001, lançou um filme de terror ambientado na Guerra Civil espanhola (A Espinha do Diabo) o que lhe permitiu ser um cineasta com grande percepção internacional. O Brasil e a questão amazônica estão presentes no premiadíssimo A Forma da Água (2017). O público brasileiro assistiu, mas não perceberam os alertas sobre o tema da ciência que nos atingiria anos depois. Um monstro amazônico que era tratado como folclore dos povos originários. Um outro ponto para nos permitir alcunhar Guilherme del Toro como o Mariátegui do cinema na atualidade.

Agora, em As Aventuras de Pinóquio de Guilherme del Toro é uma lição sobre a biologia do fascismo. O ressentimento com a I Guerra Mundial na perda de um filho e o fator religioso. Os espíritos da floresta ganham força contra as forças ocultas da morte. Um Grilo que deixa de ser falante para ser um intelectual que narra sobre o tempo. Gepetto demora a ver no boneco o seu filho, mas a fuga do interior do monstro marinho foi um ato de unidade. Antes, que os spoilers incomodem os leitores encerrará por aqui nossas conexões possíveis, mas convidando para que assistam ou revejam ao filme como uma importante oportunidade de uma transição com todas e todos.

 


terça-feira, 6 de dezembro de 2022

SÉRIE ESTUDOS - WANDINHA


Wandinha e os monstros contemporâneos

Em memória de José Mojica Marins – o “Zé do Caixão”

Por Pablo Spinelli

Vagner Gomes de Souza

 

O lançamento da série “Wandinha” para conquistar a adolescentes/jovens em diversos países nos chama a atenção diante da apatia da juventude inerte à expansão do populismo reacionário aqui e alhures. Em Stranger Things, outro sucesso mundial, o monstro do “reaganismo” se antecipa ao “trumpismo” e outros “ismos” (como o neoliberalismo) do negacionismo da vida em prol dos interesses do presentismo num aqui e agora. Os fãs de Stranger Things devem ter na memória a temporada que ocorre na semana anterior ao Dia das Bruxas e da reeleição de ator-cowboy Ronald Reagan. Suas consequências se desdobram em tons cizentos da “franquia” Star Wars, que, paradoxalmente, muitos se encantaram com Darth Vader ao longo dessas décadas, não com Yoda. Esse poderia ser o prenúncio do fascismo americanizado normalizado na sociedade diante do enfrentamento das Corporações (modelo institucionalizado por Mussolini) à ideia de República.

Os monstros, assim como no século XIX, nos permitem uma metáfora sobre a política contemporânea. Comecemos com Mary Shelley ao escrever seu “romance gótico” Frankenstein: ou O Moderno Prometeu (1818) para demonstrar como o universo de escritoras femininas dialoga muito bem com esse conflito entre Liberalismo e Democracia. Em seguida, Bram Stoker denunciaria o legado da “era dos impérios” da questão irlandesa pela via do romance Drácula (1897). Tanto as forças da “Restauração” quanto as mutilações do “Neocolonialismo” ou do Imperialismo, de Edward Said, seriam denunciadas nesses textos literários metaforicamente.

No cinema, Nosferatu (1922) inaugura essa sensibilidade em tempos de pandemia da Gripe Espanhola e no nascimento do fascismo. O debate imobiliário na Alemanha dos anos 20 pouco é mencionado pelos amantes do cinema, porém desdobraram-se inúmeras lideranças de massas diante do declínio dessas forças da tradição que “moderavam” a ascensão da igualdade. Os temas fascinantes das mudanças mobilizaram muitos jovens em inúmeros ativismos políticos e culturais diante de temáticas universais. A geração das vanguardas e suas filiações políticas se desdobraram nos anos 30 com a Segunda Guerra mundial marcando essa “era dos extremos”.

A série Wandinha é herdeira de toda essa geração. Sua cena de abertura na escola Nancy Reagan com as piranhas devoradoras do neoliberalismo dos anos Reagan é o cartão de visita para aquilo que a série se propõe. Esse spin-off da Família Addams, quadrinhos de Charles Addams, primo de uma das mais importantes líderes feministas das Américas, coloca a adolescente como protagonista numa roupagem de nossa época: individualista, narcisista, apática. Ao parar em uma escola que tem como patrono Edgar Allan Poe, o identitarismo dos ditos excluídos – todos ricos – fica explícito quando se explode uma estátua por uma visão particular sem estudo ou república.


A série tem a boa fortuna de ter um dos poucos diretores do cinema que conseguem ter uma marca própria nos seus filmes. Tim Burton – fã do brasileiro Zé do Caixão -, diretor de Edward Mãos de Tesoura, Batman, Marte Ataca, Os Fantasmas se divertem, dentre outros, é o diretor americano com maior influência do expressionismo alemão e suas histórias são marcadas pelo olhar crítico liberal ao republicanismo conservador e aos interesses do mercado privatista. Portanto, por mais que a Wandinha comece como uma idólatra do self ela só avança como uma Enola Holmes gótica com a ajuda dos outros. Ela aprende a se doar numa frente que reúne lobisomens, sereias, agentes do Estado, professora, mãozinha, família para evitar aquilo que temos nos dias de hoje: a destruição mutiladora da juventude.

Além de todo o acervo literário clássico – Shelley, Stoker, Poe, Conan Doyle – a série resgata os “monstros” da Universal – Lobisomen, Drácula – e o clássico moderno literato do mundo pop, Stephen King, cuja obra sempre foi pontuada contra o individualismo (Conte Comigo), o perigo do fascismo para os jovens (O Aprendiz), a perversidade juvenil (Carrie – que tem a famosa cena do banho de sangue no baile revisitada). A série sabe dosar o tom. Além de evidenciar os desvarios do fanatismo religioso também não poupa os discursos sectários identitários. Prefere, sem causar alarme, ocupar o primeiro lugar no Brasil com referências a um casal lésbico sem que haja abaixo-assinados virtuais. Tim Burton saiu da Disney e reencontrou o que há de melhor em si mesmo. Assim como a Wandinha, que ao se deparar com os monstros que cercam a juventude recorreu aos estudos e ao trabalho em equipe.


terça-feira, 15 de novembro de 2022

A DOCE POLÍTICA NO CINEMA - NÚMERO 12 - 30 Anos de “Drácula de Bram Stoker”


 30 Anos de “Drácula de Bram Stoker”

Por Nilvio Pessanha

 

Em 1897, Bram Stoker publicou “Drácula”, o seu romance de terror gótico que o fez conhecido e cultuado mundialmente. O livro foi o resultado de uma grande pesquisa do autor sobre o folclore europeu e ajudou a fortalecer e difundir a figura do vampiro até chegar ao que conhecemos hoje.

Em 1922, o diretor Friedrich Wilhelm Murnau adaptou o romance de Stoker para o cinema com “Nosferatu”, filme pertencente ao movimento expressionista alemão e que se tornou um marco para o gênero de horror. Como o cineasta não obteve os direitos para adaptar o livro buscou trocar os nomes dos personagens para evitar ser processado, o que acabou acontecendo e quase fez com que todas as cópias de “Nosferatu” fossem destruídas.

Coincidentemente, no mesmo ano em que o filme de Murnau foi celebrado por seu centenário, outra adaptação também completa uma efeméride: “Drácula de Bram Stoker” completou 30 anos de seu lançamento agora no dia 13 de novembro de 1992. O longa foi dirigido por Francis Ford Copolla e contou com um grande elenco com nomes como Gary Oldman, Keanu Reeves, Winona Ryder e Anthony Hopkins. Com um orçamento de pouco mais de 40 milhões de dólares e obteve uma bilheteria de cerca de U$ 215 milhões ao redor do mundo, a obra se tornou não só um sucesso de público e crítica, mas também uma das mais celebradas pelos fãs do universo vampiresco. A trama do filme se passa em 1897, mesmo ano da publicação da obra original, e traz o jovem advogado Jonathan Harker (Keanu Reeves) que tem de ir a trabalho até as distantes terras da Transilvânia, na Romênia. A viagem é nebulosa e cheia de percalços até chegar ao sombrio castelo do estranho Conde Drácula (Gary Oldman) que se revela como um vampiro e aprisiona o advogado. Após vê-la numa fotografia, Drácula parte para Londres atrás de Mina (Winona Rider), noiva de Jonathan Harker.


30 anos depois na Inglaterra



Muito do já mencionado culto ao filme se deve à ótima direção de Coppola que conseguiu fazer com que seu “Drácula de Bram Stoker” se tornasse um dos filmes que melhor traduz para as telas a atmosfera típica dos romances góticos dos séculos XVIII e XIX. O cineasta lança mão de uma fotografia que explora bem o uso de sombras e névoas, bem como toda uma cinematografia muito bem construída. Os efeitos especiais, em sua maioria, são truques de câmera e efeitos práticos. Outro elemento que chama muito a atenção na produção é o figurino, fruto da parceria entre o diretor e a designer gráfica Eiko Ishioka. O figurino é algo que salta aos olhos e ajuda a criar toda a atmosfera do filme com um toque bem autêntico. Podemos pegar como exemplo dessa autenticidade o visual assumido por Drácula. A primeira vez que vemos o personagem ele está usando uma espécie de quimono vermelho que mais dialogo com a cultura oriental chinesa do que com a Europa vitoriana. Despois o personagem assume uma faceta mais sensual para ir ao encontro de Mina.


Por falar no Conde da Transilvânia, a representação do mítico personagem por Gary Oldman foge das emblemáticas interpretações de Bela Lugosi e Crhistopher Lee dando um toque bem original. O Drácula de Oldman é, sem dúvida, um dos mais celebrados e considerado por muitos como o melhor do cinema moderno. Seu Drácula transita, com ajuda de um ótimo trabalho de maquiagem, de uma versão idosa, porém sombria e bizarra, para uma versão mais jovem e sedutora, com o ator esbanjando versatilidade.

Como se pode ver, motivos não faltam para se celebrar os 30 anos “Drácula de Bram Stoker” de Francis Ford Coppola. Celebrar três décadas dessa obra é também celebrar toda a cultura do vampirismo. É festejar um personagem tão emblemático que a arte, seja com a literatura, com o cinema ou o teatro, o tornou realmente imortal.


Nilvio Pessanha é professor da rede pública, membro dos podcasts Trincheiras da Esbórnia e Cine Trincheiras, e amante de cinema.


domingo, 6 de novembro de 2022

BOLETIM BRASÍLIA CONECTION - BBC 001 - DESAFIOS NA EDUCAÇÃO

A Pandemia, a Deseducação e o Amanhã.

 

Ricardo José de Azevedo Marinho[1]

 

Todos os principais jornais norte-americanos na última semana do outubro passado dedicaram longas matérias de várias páginas a respeito dos resultados da primeira medição pós-vacinação na Pandemia Covid-19 do desempenho educacional nos Estados Unidos da América (EUA).

As médias em matemática e a proficiência em leitura caíram em quase todos os estados, de acordo com os testes da Avaliação Nacional do Progresso Educacional (National Assessment of Educational Progress - NAEP) de 2022.

Os testes, realizados em 450.000 alunos de quarta e oitava séries, em 10.000 escolas em todo o país, rendeu os piores resultados desde que a NAEP começou a crescer, no início dos anos 1990.

Em matemática, os resultados são especialmente devastadores. A eficiência média entre os alunos do 8º ano caiu de 38% em 2019 para 26% em 2022. Entre os alunos do 4º ano, a queda foi de 41% para 36%. Há estados com perdas muito maiores do que outros, mas em geral a tendência nacional é de uma elevação alarmante da tendência de queda, que já era visível antes da pandemia.

O Secretário de Educação dos EUA, Miguel Angel Cardona, fez de tudo, menos se esquivar diante dos dados: “Quero ser muito claro”, disse ele: “Os resultados deste teste são sombrios e inaceitáveis. Este é o momento da verdade em nossa educação. Como responderemos a isso dependerá não apenas de nossa recuperação educacional, mas também do lugar de nosso país no mundo”. Os resultados são dramáticos porque vêm de um esforço sem precedentes para conter os danos da pandemia.

Em 2021, o governo federal fez o maior investimento em escolas da história – 123 bilhões de dólares, 2.400 dólares por aluno – e exigiu que os distritos escolares gastassem pelo menos 20% desses recursos em recuperação acadêmica (assunto complexo e que exigira uma apreciação a parte).

Está claro, que muitos trilhões de dólares adicionais e mais anos de esforço serão necessários para tentar retornar aos resultados pré-pandemia, que já estavam em declínio, como mencionamos.

Mas se isso aconteceu nos EUA, não quero nem pensar no que terá acontecido no Brasil, ou como poderemos descobrir quem sabe indiretamente via Censo 2022, porque aqui o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) que tínhamos foi totalmente desmobilizado.

Com isso a realização principal deste governo que finda em 2022, a saber, os testes padronizados - os mesmos para todos os alunos e todas as escolas - sobre progressos ou retrocessos educacionais desapareceram no Brasil.

O Brasil manteve uma postura equidistante das avaliações educacionais da Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, (OCDE), a despeito de aparentemente ainda estarmos em Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA).

O governo na última semana de maio passado anunciou a Política Nacional para Recuperação das Aprendizagens na Educação Básica. Ocorre que essa Política se valeu de uma Plataforma de Avaliações Diagnósticas e Formativas que em nada é equivalente às avaliações já citadas nem tampouco aos testes padronizados dos EUA ou de outros países.

Somado a tudo isso o Brasil com 26 semanas foi o segundo país em semanas de interrupção total das aulas presenciais, ficando atrás apenas das 48 do México e ligeiramente a frente das 23 dos EUA.

Todos esses números mencionados abrem a questão sobre o tamanho da perda educacional brasileira desde o inicio da pandemia.

A perda dos EUA, e à medida, que fica com apenas 3 semanas a menos de aulas suspensas que o Brasil teve, e com um investimento educacional durante a pandemia de 123 bilhões de dólares, orçamento inimaginável para a nossa experiência. O Brasil abriu mão da educação e dos instrumentos que tinha para medi-la. É a Deseducação e a renúncia ao conhecimento, a ciência, ao desenvolvimento tecnológico sério que lamentavelmente podemos relatar.

Nem tudo são sombras. A cultura heroica costuma aparecer em cenas dramáticas em momentos de transição. E agora ela está associada à professora Simone Tebet que já se colocou a disposição para enfrentar o desafio para dar início ao reencontro com o Amanhã e sua vocação educacional democrática e republicana, tal como inscrita no nosso texto constitucional.

 

5 de novembro de 2022

 



[1] Professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da UniverCEDAE.

quarta-feira, 2 de novembro de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION - NÚMERO 36 - DESAFIOS DA TRANSIÇÃO.


Carga Pesada

Por Vagner Gomes de Souza



Carga Pesada é uma série televisiva da TV Globo que foi exibida originalmente nos anos da ditadura militar (1979 – 1981) teve um revival de sucesso no primeiro mandato do presidente Lula (2003 – 2007). Nas duas fases os protagonistas Pedro e Bino foram interpretados pelos atores Antonio Fagundes e Stênio Garcia. A criação da série original se deve aos dramaturgos Gianfrancesco Guarnieri e Ferreira Gullar e o tema de abertura “Frete” é de Renato Teixeira. No primeiro momento, há dois caminhoneiros que viviam uma amizade diante de um processo de modernização conservadora do país.

Na segunda fase, Bino virou um empresário de transporte de cargas (provavelmente um sucesso da democratização do Brasil) e vai ao reencontro a amizade com Pedro diante de uma possibilidade de estar diagnosticado com câncer. A variedade de temas abordados no revival sugere uma ampla exposição da pauta do social que formalização do republicano e democrático. A criatura cresceu nos anos em que os criadores da série não mais tiveram participação nos debates do roteiro.


Não nos surpreendamos com o que ocorreu uma década depois nas estradas do Brasil. O espírito do empreendedorismo de Pedro e os valores familiares de Bino moldaram um segmento com traços políticos do populismo reacionário. Entretanto, como todo populismo, a grande política pode lhe conduzir pelos canais da democracia. Diante disso, o sucesso do bordão “É uma cilada, Bino!” ganhou o significado de quando algo não é confiável. E devemos demonstrar que há temas mais pesados a serem abordados nesse momento em que se abre a transição do atual governo para o próximo.

Entretanto, devemos relembrar que a próxima gestão será da mais ampla aliança de forças políticas do campo democrático que trouxe a presença até de grupos políticos conservadores e de direita que reconheceram os perigos para a nacionalidade brasileira no reacionarismo que o atual mandatário expressa até nos momentos de derrota. Muitos setores políticos do conservadorismo brasileiro já se aproximam dessa realidade de unidade nacional que exige dos movimentos políticos progressistas uma melhor articulação na apresentação de seu debate programático na sociedade. Não há protagonismo de nenhum segmento nessa ampla Frente e é com ela precisamos seguir nas estradas desse país.

Há um perigo de que não se entenda o recado eleitoral da vitória “apertada”. Qualquer ação que não seja consenso no campo vitorioso ou que demonstre divisão será uma derrota política a mais. Diante disso, a coordenação da transição em mãos do vice-presidente eleito Geraldo Alckmin deve ser saudada e deve ser acompanhada para que tenhamos um primeiro ano de mandato que contribua nessa travessia na solução dos problemas sociais na educação (a tragédia que alimenta a fábrica das Fake News), do emprego para a juventude ausente das manifestações políticas democráticas, da saúde entre outras cargas pesadas deixadas pelo atual Governo.

Não vamos alimentar a pauta divisionista e reacionária do campo derrotado uma vez que há muito trabalho a ser feito por setores políticos diversificados da Frente Democrática. O tema orçamentário é urgente diante do desafio da continuidade do Auxílio Brasil e da garantia da promessa de valor extra de 150 reais para cada filho. O senador Marcelo Castro (MDB) assume um protagonismo também para que os progressistas procurem encaminhar suas emendas ao Orçamento que traga benefícios, por exemplo, para a Zona Oeste e Baixada Fluminense no estado do Rio de Janeiro como resposta ao clientelismo a serviço dos reacionários. Esse é o momento de reforçar a unidade em torno da Constituição de 1988 que não foi redigida pela via da emoção mais pela via da contemporização. Sem medo de que estamos na boleia certa da história não vamos gastar nossas energias em reagir ações destemperadas. Agora é momento de chamar os mais qualificados para o próximo Governo e abrir para todas e todas as dificuldades a serem superadas. O bloqueio do crescimento econômico é o verdadeiro perigo fascista. 

quarta-feira, 26 de outubro de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION - EDIÇÃO EXTRA 3 - CARTA AOS ELEITORES DO BAIRRO DE CAMPO GRANDE (RJ)

Carta aos Campograndenses Cariocas I

Por Gabriel Nunes

 

Caro leitor,

seja bem–vindo! Se você é evangélico e Bolsonarista, pretende não votar ou ainda está indeciso em quem votar, é com você que venho falar, amistosamente, neste artigo.

Peço que averigue o que acreditar não ser verdade neste artigo, e tire suas conclusões por si só, pois seu voto, independentemente de quem seja, deve ser consciente, e a intenção deste artigo é conscientizá-lo, não dissuadi-lo.

 

É natural que sob ameaça de repreensão à nossa prática religiosa, e aos seus princípios, queiramos defender aquilo que faz parte de nós, às vezes, desde o berço. Mas também é um fato que a não assimilação de nossa própria religião, nos faz, antes de qualquer um, estar suscetível a agir contra seus princípios.

No lado Cristão, podemos citar como os mesmos que se diziam cristãos pediram a morte de Cristo, que não tinha a menor pretensão de ser entendido, mas cumpriu sua missão, atingindo àqueles que o entenderam ainda que parcialmente.

 

“Jesus disse: Pai, perdoa-lhes, pois não sabem o que estão fazendo." - Lucas 23:34

 

Ainda hoje, o homem usa da religião como um meio de satisfazer seus desejos egoístas. Estes, chamados de falsos profetas, já eram objeto de alerta de Cristo e seus discípulos em sua época:

"Cuidado com os falsos profetas. Eles vêm a vocês vestidos de peles de ovelhas, mas por dentro são lobos devoradores.

Vocês os reconhecerão por seus frutos. Pode alguém colher uvas de um espinheiro ou figos de ervas daninhas?

Semelhantemente, toda árvore boa dá frutos bons, mas a árvore ruim dá frutos ruins.

A árvore boa não pode dar frutos ruins, nem a árvore ruim pode dar frutos bons.

Toda árvore que não produz bons frutos é cortada e lançada ao fogo.

Assim, pelos seus frutos vocês os reconhecerão!"

                                                                                                            - Mateus 7:15-20

 

"Recomendo-lhes, irmãos, que tomem cuidado com aqueles que causam divisões e colocam obstáculos ao ensino que vocês têm recebido.

Afastem-se deles. Pois essas pessoas não estão servindo a Cristo, nosso Senhor, mas a seus próprios apetites. Mediante palavras suaves e bajulação, enganam os corações dos ingênuos."

                                                                                                         - Romanos 16:17,18

 

Os gregos apresentam o amor em três aspectos:

 Eros - o amor romântico; Philos - o amor da amizade; e por fim, Ágape - o amor imensurável, por tudo e por todos, um amor incompreensível para a mente humana, que seria o amor do coração de Cristo, e deve ser a busca constante de seus seguidores.

Como pode um verdadeiro seguidor deste Cristo, produzir maus frutos? Como podemos destilar veneno e esperar que cure alguém? Como se dizer cristão, agindo opostamente ao que Cristo viveu e pregou?

Como dito por Cristo, qualquer um pode se dizer cristão, mas apenas através de suas atitudes, de seus frutos, podemos ver se isto procede, pois o evangelho é para ser vivido, muito mais do que para falar que se vive. Não sendo cristão quem diz sê-lo numa hora, e na outra tudo o que sai de sua boca é torpe, sujo, baixo, é ódio etc., pois sabemos que a boca explana o que o coração guarda, e o amor incita ao amor, nunca à violência.

O Anti - Cristo sempre existiu, e segue existindo na consciência humana ,inclusive naqueles que se dizem cristãos, mas vivem o que Cristo repudiou; que adotam os moralismos, dizendo ser a moral. Porém, esta moral cristã independe da época, ou sociedade em que se vive, é atemporal, pois, antes ou depois de Cristo, cristão é quem vive na busca das virtudes pregadas por ele, e só assim podemos seguir a moral. Não a moral de uma época ou sociedade, mas a moral atemporal, como citei, pautada não em leis ou costumes, mas no amor.

O que vemos hoje mais do que nunca na política brasileira, são falsos cristãos, que se aproveitam da grande parcela de evangélicos em nossa sociedade, para usar de suas boas intenções e arrecadar votos, sob o pretexto de que serão representantes do cristianismo nos cargos de poder político. Não satisfeitos em fazer dos púlpitos das igrejas os seus palanques eleitorais, investem desmedidamente na propagação de Fake News, como por exemplo - as Fake News de que Lula fecharia igrejas, criaria banheiros unissex, e tantos outros absurdos que nunca foram propostas de campanha nem de Lula, ou de qualquer candidato à presidência, pois seria o mesmo que anular a própria candidatura, tendo em vista a mentalidade geral da sociedade que vivemos que é pautada numa moral evangélica.

Não me proponho aqui, a falar de direita ou esquerda, gregos ou troianos; proponho-me a levá-lo à uma breve reflexão da importância de seu voto, principalmente se é de sua intenção votar de acordo com sua consciência religiosa. Gostaria de salientar também, meu desejo de conscientizá-lo que seu voto em branco, ou nulo, pode lhe ser mais conveniente, pois, convenhamos poucos brasileiros ainda tem na política alguma esperança de melhora em nosso país. Mas pense comigo, qual candidato você pensa que está mais ou menos inclinado aos seus princípios cristãos, sendo declaradamente cristão, ou não? Perceba que não votar em quem você acha que está de acordo com seus princípios, e anular seu voto, não é se isentar de responsabilidade, mas sim dar seu voto ao candidato oposto.

 

"A religião que Deus, o nosso Pai aceita como pura e imaculada é esta: cuidar dos órfãos e das viúvas em suas dificuldades e não se deixar corromper pelo mundo."

                                                                                                               -  Tiago 1:27

 

O seu voto pode não parecer tão importante, mas determinará o decorrer do seu país nos próximos 4 anos, atingindo a vida de milhões de outros tantos brasileiros. O seu voto pode matar a fome de milhões de brasileiros, dar educação de qualidade aos pobres, gerar empregos aos necessitados, e fazer muitas outras coisas boas por seu país e seus habitantes. Então, pense bem, reflita – o país que você viu nos últimos 4 anos, é o país que você quer para o futuro?

Você pode estar se dizendo neste exato momento, que o atual governo foi prejudicado por conta da pandemia, mas se atente à como o país foi regido durante esta pandemia. O Presidente Bolsonaro, desde o início, levou este momento de aflição para nosso povo com total indiferença e desdém ao mesmo, indo contra às recomendações da ciência, comprando e fazendo campanha de remédios sem comprovações de eficácia, de forma prematura e totalmente inadequada à um Presidente da República; além de se opor ao uso de máscaras e ao fechamento dos comércios em todo o país quando necessário. E como já não bastasse, conforme o aumento do número de mortos no Brasil em decorrência da Covid-19, Bolsonaro, diversas vezes quando questionado, não se absteve de debochar dos mortos e ignorar sua parcela de culpa na dimensão gravíssima que o vírus e seus reflexos tomaram no Brasil, chegando a imitar pessoas com falta de ar, em referência à falta de cilindros de oxigênio que tivemos em hospitais por todo o país. Bolsonaro se posicionou contra a vacinação da população desde o surgimento das vacinas, dizendo que não tomaria a vacina, e que tomasse quem quisesse, mas ao mesmo tempo, Bolsonaro decretou sigilo de sua carteira de vacinação.

Então, sim, Bolsonaro tem sangue em suas mãos, apesar de se dizer Cristão. E não vamos nem nos aprofundarmos em outras polêmicas como as rachadinhas, imóveis comprados com dinheiro público, nepotismo, e tantos outros escândalos de corrupção envolvendo Bolsonaro e sua família, nem mesmo um dos últimos episódios em que Bolsonaro diz ter “pintado um clima” entre ele e uma menina de 14 anos, sendo ele o homem que se autodenomina defensor da família, vamos apenas colocar nossa consciência em uso, e analisar se Bolsonaro age de acordo com o evangelho que deturpa e profana o tempo todo.  O evangelho é amor, mas se pergunte: você vê amor em Bolsonaro?

 

“Até quando vocês vão absolver os culpados e favorecer os ímpios? Garantam justiça para os fracos e para os órfãos; mantenham os direitos dos necessitados e dos oprimidos. Livrem os fracos e os pobres; libertem-nos das mãos dos ímpios.”

                                                                                                            - Salmos 82:2-4   


domingo, 23 de outubro de 2022

SÉRIE ESTUDOS - SOBRE O POPULISMO REACIONÁRIO

Sobre o populismo reacionário

 

Ricardo José de Azevedo Marinho[1]

 

Lynch, Christian e Cassimiro, Paulo Henrique. Populismo reacionário: ascensão e legado do bolsonarismo. São Paulo: Contracorrente, 2022. 209 págs.

 

A noção de populismo encontra-se em discursos muito diferentes e, claro, em diferentes realidades. Christian Lynch e Paulo Henrique Cassimiro propõem-se reconstruir em nossa história recente os elementos que lhe deram vida aqui e fazem uma crítica mais pertinente do que nunca. Para além das especulações de todo tipo e das diferentes abordagens acadêmicas, a verdade é que o fenômeno tem impactado e desgastado ao extremo – e talvez irreversivelmente – as democracias. Não é uma questão restrita às universidades e faculdades, mas está no núcleo do debate e da preocupação pública.

Os autores resgatam elementos constituintes da construção narrativa da política populista reacionária: uma concepção do povo, uma modalidade de representação, uma política e uma filosofia da economia e um regime de paixões e emoções. Cada um desses elementos é analisado e, em seguida, são reconstruídos alguns dos episódios que deram azo a esses momentos que podem ser considerados como irrupções do populismo reacionário, para finalmente realizar uma crítica perspicaz e pertinente.

O livro vai longe. O componente e nutriente emocional do populismo reacionário mobiliza ressentimentos de forma destrutiva, colocando ácido nas balizas do acordo democrático, mas também deslocando a tradição que lançou a arquitetura da ilustração entre nós; uma arquitetura que apostava na razão, no conhecimento e na ciência como características modelares da conversa pública, da convivência e até mesmo da luta política.

Quando se mobilizam retoricamente as paixões, sempre se coloca sob suspeição a civilidade e se constitui uma ameaça à democracia. Inclinada a falsificar julgamentos, desviar comportamentos, perturbar as relações com os outros e derruir a convivialidade na sociedade, isso pode engendrar nos grupos humanos, compostos de indivíduos isoladamente racionais, um sentimento de multidão incontrolável e até criminosa. Primeiro em linguagem comum e, depois, mesmo na ordem intelectual, a conotação reacionária se firma. Por referir-se ao excesso, a uma força descontrolada, tudo passa a ser quase como um sinônimo de “emoção” ou mesmo mais uma variável da ação humana. No entanto, seu uso em linguagem cotidiana gera muitas apreensões, uma vez que se mostra relevante quando as paixões extremas (em oposição à razão) inundam o espaço público.



É claro que paixões e política não podem ser dissociadas. Elas são combustíveis fundamentais para mobilizações de todo tipo. Muitas vezes, para quem a encarna, a política está cheia de emoções, tratando-se de matéria de graus. Não estamos, quando falamos de política, diante de uma atividade “fria” e/ou apenas racional, mas, se a racionalidade estiver nublada – ofuscada – pela emoção, todos estarão em dificuldades.

O populismo reacionário soube capturar e explorar essas emoções. O sentimento de raiva, de não ser considerado, produto de uma divisão entre o mundo dos poderosos e o resto dos mortais, foi colocado à flor da pele. E esse ressentimento tornou-se um poderoso nutriente para o discurso populista.

Paradoxalmente, nas sociedades democráticas, a informação corre com enorme velocidade e combina verdades com inverdades descaradas. As redes aumentam o poder das trocas e a leitura do significado do que está acontecendo torna-se mais difícil. Há uma catarata imparável de informação, quase impossível de digerir e ordenar. Nesse roldão, as versões conspiratórias acabam maculando as tentativas políticas de restaurar a coerência em um mundo vivido como indecifrável e ameaçador. O populismo reacionário atua como uma espécie de sedativo, oferecendo ordem à desordem e suposta compreensão ao caos. E somado a isso há erosão da confiança nas instituições democráticas, o ambiente armado para a exploração de visões simplistas, como a contundente contraposição entre “nós, o povo” e “a máfia no poder”. Na percepção de Tocqueville, uma ideia falsa, mas clara e precisa, terá sempre mais força no mundo do que uma ideia verdadeira e complexa.

Não é então apenas a expansão de um impulso reacionário, mas algo mais profundo. É um composto discursivo que atenta contra os grandes pilares civilizatórios que apostam no conhecimento científico e no humanismo como forja de um espaço público conhecedor e razoável, promotor de diálogo e debate informados, uma sociedade de indivíduos e não alguma forma de rebanho.

Kant disse que o Século das Luzes significaria o abandono pela humanidade da condição de minoridade. Esse abandono da minoridade significava vencer a eventualidade de ser usado ou ser guiado por outra pessoa. O populismo reacionário marcha na direção oposta: o mito parasitário – nos termos de Manuel Bomfim – pastoreia uma visão de mundo como um mingau simplista e contundente, explorando as emoções e oferecendo-lhes uma sensação de falsa transcendência.

É necessário recordar, como o fazem Christian Lynch e Paulo Henrique Cassimiro, que foi o momento civilizatório das Luzes que forjou usos e costumes, bem como direitos, instituições e normas que permitem uma convivência cidadã. O mais preocupante com a proliferação das alavancas populistas reacionárias é que elas não apenas minam o arranjo democrático, mas também vão de encontro a muitos dos hábitos que permitem uma vida democrática e republicana.


[1] Professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da UniverCEDAE.

BOLETIM ROMA CONECTION - EDIÇÃO EXTRA 2 - CARTA ABERTA AO LULA

 

JFK@gov para Lula@pres

Ítalo Calvo 

(Pseudônimo de um rubronegro muito famoso)

Prezado Lula

Estava conversando com o Roosevelt e o Vargas com a intermediação de San Tiago Dantas e eles me contaram que você representa o último líder do movimento operário do século passado, uma classe praticamente extinta como os camponeses. Vendo a sua campanha e seus debates com o seu adversário fiquei rindo pensando que Nixon era um escoteiro comparado com o que vocês criaram no Brasil, terra que ajudei com o “Aliança para o Progresso” e ganhei como retorno um local na periferia chamado “Vila Kennedy” com gente sofrida, mas alegre.

Eu entrei para a História por vários motivos, uns bons, outros ruins, como o meu fraco por mulheres e o que fazia na Casa Branca. Vi que Trump fez muito pior, segundo me falou George Bush pai. Um dos motivos pelo qual sou lembrado é o debate que fiz com Nixon na televisão. Ele suava, eu fiquei mais calmo. Ele não sabia usar a televisão, eu aprendi a usar a essa máquina fazendo o papel de bom-moço. O programa dele era melhor que o meu, mas queriam “comprar” um produto e não, ouvi-lo. Nixon e eu rimos disso outro dia num pôquer. Ele perdeu porque eu sei blefar melhor. Minhas sugestões para essa reta final:

- Esqueça o voto evangélico. Não use essa expressão. Eu fui o único católico que presidiu os EUA e levei muita pedrada e nunca precisei fazer um pedido para qualquer outra religião. Na minha época já existia líder religioso picareta que depois entrou para a televisão. Eu incluí os negros, os latinos furiosos com Fidel. Acenei para os jovens. Fale para os jovens. Vi um rapaz fumando algo esquisito num programa e você falava sobre o que fará pelos jovens na geração 4.0. Foi algo positivo. Fale para os pobres. E diga algo legal: chame os evangélicos de Protestantes. Lembre que eles começaram protestando, Lutero era um revolucionário. Dica do Luther King que foi um ex-presidiário, como o Mandela.


- Os jovens têm hormônios em ebulição como eu. Fale de novo que todo mundo vai namorar. Só não diga “quem quiser”. Só namorar.

- Eu vi uma parte do seu debate falando sobre Petrobras. Não entendi nada. Perguntei ao Lacerda, com quem tenho boas relações e ele me disse: Lula nesse você “cirou”. Não entendi a piada interna. Só sugiro: evite números demais. Nunca precisamos disso para ganhar eleição nos EUA. O Dewey me falou que a garotada hoje presta atenção só uns 5 minutos no que se fala. Menos número e mais emoção. Mas controle seu tempo.

- Gostei da gravata. Ela chamou a atenção. Repita. Faça a sua marca. Aposente as vermelhas. Tem uma menina aí que já falou sobre isso. Teu povo fala sobre não ser vermelho e esquece que o nome do país vem de brasa, vermelho. Fale mais do futuro. O JK me disse que o slogan dele falava sobre futuro. Vargas me contou que ele sofreu porque só falavam de passado.

- Eu não bato papo com o Mussolini, mas meu pai tinha amizade secreta com ele por mais de dez anos. Meu pai me disse que não adianta chamar fascista de fascista. É elogio. Mussolini não gostava de lembrar das derrotas, como o desgaste na Etiópia e a vergonha na II Guerra. Fale mais da pandemia. E lembre que Bolsonaro foi expulso do exército. Patton ouviu uma frase um aliado seu e gostou: Quem nunca foi um bom soldado, jamais será um bom comandante. Lembre que seu adversário tem que sair expulso da presidência como saiu do Exército. Isso mexe com quem tem o cheirinho fascista. Imagino que deva ser esquisito ter um adversário que não é da sua praia. Tenha calma. Controle seu tempo. Ria. Roosevelt sepultou o Lindbergh (o nosso) com temperança.

- Por último, o “sonho americano” chegou com 100 anos de atraso. Os pobres não gostam mais de serem chamados de empregados ou funcionários. Todos são colaboradores. E o “sonho americano” agora é dizer que é “empreendedor”. Você teve e criou nos anos 1980 o sonho americano no sindicalismo. Não bata nisso dizendo que as pessoas são exploradas etc. Diga que vai ajudar no sonho. Sabemos que é um pesadelo, mas as pessoas gostam de sonhar.

Jacqueline mandou recomendações. Disse que a anterior na sua campanha é melhor que a atual. “O menos é mais”. Não entendi o que ela quis dizer.

Atenciosamente,

John Fitzgerald Kennedy


sábado, 22 de outubro de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION - NÚMERO 35 - ESTAMOS DE FATO NA RETA FINAL?

Sob a ameaça de Torquemada

Em memória de Lyncon Guidion

Vagner Gomes de Souza

 

Tomás de Torquemada foi um inquisidor-geral espanhol que viveu no século XV. Esteve a serviço da Igreja Católica em nome de um fanatismo que lhe qualificaria em muito a mentalidade distinta do iberismo hispânico em relação ao português. Sebastián de Olmedo o chamou de "O martelo dos hereges, a luz de Espanha, o salvador do seu país, a honra da sua ordem". Essa era a “espinha” dorsal de uma unificação sob a égide da religião como discurso de Estado. Estima-se que foi responsável por aproximadamente 2200 pessoas levadas ao suplício da fogueira.

Nesses tempos de “linchamento virtual” presentes em tantos quadrantes políticos, expor o ódio contra a afeição se tornou cada vez mais uma ameaça a Democracia no mundo. A mobilização nas redes sociais contribuiu para aceleração da individualização da sociedade numa lógica de um profundo individualismo metodológico em que muitas vezes as instáveis aproximações seriam em contextos de tentar ter algum benefício individual como se fosse um “efeito carona”.


Novos inquisidores se materializaram como vozes rudes que refletem uma sociedade fraturada e muito mais aberta aos pronunciamentos reacionários. O medo dos fantasmas de um sistema político que deixou de existir desde a queda do “Muro de Berlim” se observa muito nesse universo inquisitorial de Torquemada na sua busca identitária. Nada abala as concepções dos fanáticos como observamos nas lições sobre o fascismo (uma das múltiplas correntes do extremismo de direita) surgido no entre guerras junto com a pandemia da “Gripe Espanhola”.

Não nos estranha que o temor de que tenhamos “Casas de Banho” Unissex não tenha sido solidário no repúdio as falas e práticas infelizes sobre as jovens venezuelanas. Os olhos estariam vendados para a sensibilidade e a racionalidade numa política cada vez mais “Barroca”. O mundo do absolutismo está se tornando mais forte nesse contexto que se permite condenar a globalização ao contrário de orientar para sua republicanização. Os desafios são inúmeros, mas percebemos na leitura da fundamentação programática do bloco governista a “manipulação do medo” em relação ao novo e as mudanças.

As palavras do candidato a reeleição ressoam forte ao vaticinar na noite do dia 2 de outubro sobre os perigos de abraçar as mudanças. Todavia, desejam que se ande para trás em inúmeras conquistas sociais em relação ao poder de compra dos assalariados e aposentados/pensionistas. No país da “fila do osso” há aqueles que acreditam nos devoradores de cães acima da linha do Equador. Aqueles que desacreditaram que havia mortos nos caixões por conta da COVID-19 seriam os mesmos a acreditar numa ameaça a liberdade religiosa. Não confortaram as famílias e órfãos da COVID-19 e cinicamente dizem que defendem os valores da família. Não é somente as perdas da pandemia,  mas também a perda gradual da afeição. O mundo reacionário é movido pelo ódio e pela mentira.

A Carta Constitucional de 1988 está sob a ameaça dos visionários fechados as boas novas anunciadas na partilha do Pão. E anunciam cada vez mais novos retrocessos que vão atingir as mulheres e a juventude uma vez que há fratura em nossa Terra Prometida uma visão do paraíso. Sob ameaça de Torquemada surgem parlamentares que insinuam a inquisição de jovens universitários que seriam “taxados” como “filhos de papai”. Esse é mais um exemplo do perfil ignóbil de uma sociedade adoecida uma vez que se indultou um parlamentar condenado por atacar um dos Três Poderes (ao mesmo tempo em que mais de 19% de eleitores sufragaram, mesmo sub judice, esse candidato ao Senado enquanto que o mesmo teve aproximadamente 25% dos eleitores num bairro predominantemente evangélico na capital carioca).

Não é liberdade de expressão que está sob ameaça, mas seus limites republicanos impostos pelos marcos legais. Nesse momento a força da Cruzada Iliberal contra um Brasil muito abalado economicamente pela pandemia precisa de que a juventude dedique mais tempo de ocupação das ruas para dialogar com eleitores indecisos. A fase das Lives e dos influenciadores já passou. As ruas estão abertas para que os jovens falem para os jovens que se deixaram mobilizar pelas fake news. Os segmentos mais idosos precisam ser acolhidos pelo ânimo desses eleitores novos para que suportem a travessia de reconstrução nacional. Por fim, as mulheres seriam mais bem acolhidas pela juventude nessa dinâmica eleitoral. Aqueles que não tenham tempo nesses próximos dias que justifiquem no futuro, aos seus filhos e netos, o motivo de sua omissão. Não façam como o memorialismo sob a Alemanha Nazista registrou diversas respostas evasivas sobre atitude: “Não sabíamos de nada”.


terça-feira, 11 de outubro de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION - NÚMERO 34 - PANTANAL E O BRASIL REAL

Pantanal e as eleições

Por Pablo Spinelli

 

Acabou Pantanal, um dos poucos casos raros de remake de uma novela que deu certo no mesmo nível que a anterior. A original, exibida por uma emissora carioca – rompendo o monopólio global – rompeu com uma estética convencional da teledramaturgia que ainda era presa ao teleteatro e aos planos da televisão americana. Num misto de ousadia e inventividade por falta de recursos financeiros, a Rede Manchete mostrou para o país aquilo que o presidente JK, amigo do então dono da emissora, Adolpho Bloch, realizara no governo: a marcha para o Oeste brasileiro, pelo bem e pelo mal.

Curiosamente, a conjuntura brasileira não era de boa fortuna para a democracia e instituições brasileiras, assim como a do remake: um presidente que foi eleito com discurso da antipolítica; do anticomunismo; defensor da moralidade pública e nos costumes e defensor do neoliberalismo. Esse era o perfil de Fernando Collor, esse ano derrotado fragorosamente em Alagoas e aliado de primeira hora do atual presidente e candidato à reeleição.

Muita coisa mudou de lá para cá. A Manchete faliu e dois impeachment depois, a sociedade brasileira tem que fazer um ato da ética da responsabilidade acima da ética da convicção pela manutenção da democracia, do pão, da razão e da própria existência do pantanal. Para a Aliança Democrática de oposição o tema tem que sair da antropofagia modernista e entrar no Brasil real que não é o da USP, mas o do patriarcado de capitalismo moderno e avançado representado pelo Marcos Palmeira e seu José Leôncio.

A oposição tem que parar para pensar que o Brasil conservador e a panaceia do “voto evangélico a favor da teocracia” assistiu a uma novela que tinha um “Cramulhão”; um espírito das águas e das matas, quase um orixá caboclo vivido pelo Osmar Prado, o mesmo que os mais velhos riam das estripulias do poliamor do Tabaco na novela Roda de Fogo. Os conservadores não fizeram um abaixo-assinado e nem passeatas ao ver dois peões se beijando no último capítulo – como aconteceu com outras novelas. Há necessidade de paciência com o mover do mundo, já nos dizia Joaquim Nabuco.

Um país formado por rupturas pelo transformismo não irá ver uma sociedade feita à fórceps pelo identitarismo americano que tomou força nos discursos neo-anarquistas do mundo acadêmico. As palavras perdem força diante dos fatos: Maria Bruaca, interpretado com força de Isabel Teixeira, defendida pelas feministas, nada mais queria que ser a única esposa de sua família. Fez de tudo para seu casamento não ruir, inclusive propor o trisal, para manter o marido. Todas as mulheres queriam não outra coisa a não ser um casamento (Filó, Zefa), ser mãe (Juma, Guta) e felizes (todas). Nessa reta final para o segundo turno a candidatura da Aliança Democrática tem que entender a novela pela sociologia e pela política. O cantor Sérgio Reis, autor da música mais tocada na roda dos peões, apareceu na festa de José Leôncio. Que a mulher do Pantanal, Simone Tebet, possa ajudar a campanha para um “larga mão” da Avenida Paulista pelo futuro dos filhos dos filhos dos nossos filhos no embarque da chalana da Esperança.