A Pandemia, a Deseducação e o Amanhã.
Ricardo José de Azevedo Marinho[1]
Todos os principais jornais
norte-americanos na última semana do outubro passado dedicaram longas matérias
de várias páginas a respeito dos resultados da primeira medição pós-vacinação
na Pandemia Covid-19 do desempenho educacional nos Estados Unidos da América
(EUA).
As médias em matemática e a proficiência
em leitura caíram em quase todos os estados, de acordo com os testes da
Avaliação Nacional do Progresso Educacional (National Assessment of Educational
Progress - NAEP) de 2022.
Os testes, realizados em 450.000 alunos
de quarta e oitava séries, em 10.000 escolas em todo o país, rendeu os piores
resultados desde que a NAEP começou a crescer, no início dos anos 1990.
Em matemática, os resultados são especialmente devastadores. A eficiência média entre os alunos do 8º ano caiu de 38% em 2019 para 26% em 2022. Entre os alunos do 4º ano, a queda foi de 41% para 36%. Há estados com perdas muito maiores do que outros, mas em geral a tendência nacional é de uma elevação alarmante da tendência de queda, que já era visível antes da pandemia.
O Secretário de Educação dos EUA, Miguel
Angel Cardona, fez de tudo, menos se esquivar diante dos dados: “Quero ser
muito claro”, disse ele: “Os resultados deste teste são sombrios e
inaceitáveis. Este é o momento da verdade em nossa educação. Como responderemos
a isso dependerá não apenas de nossa recuperação educacional, mas também do
lugar de nosso país no mundo”. Os resultados são dramáticos porque vêm de um
esforço sem precedentes para conter os danos da pandemia.
Em 2021, o governo federal fez o maior
investimento em escolas da história – 123 bilhões de dólares, 2.400 dólares por
aluno – e exigiu que os distritos escolares gastassem pelo menos 20% desses
recursos em recuperação acadêmica (assunto complexo e que exigira uma
apreciação a parte).
Está claro, que muitos trilhões de
dólares adicionais e mais anos de esforço serão necessários para tentar retornar
aos resultados pré-pandemia, que já estavam em declínio, como mencionamos.
Mas se isso aconteceu nos EUA, não quero
nem pensar no que terá acontecido no Brasil, ou como poderemos descobrir quem
sabe indiretamente via Censo 2022, porque aqui o Instituto Nacional de Estudos
e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (INEP) que tínhamos foi totalmente
desmobilizado.
Com isso a realização principal deste
governo que finda em 2022, a saber, os testes padronizados - os mesmos para
todos os alunos e todas as escolas - sobre progressos ou retrocessos
educacionais desapareceram no Brasil.
O Brasil manteve uma postura
equidistante das avaliações educacionais da Organização das Nações Unidas para
a Educação, a Ciência e a Cultura (UNESCO) e da Organização para a Cooperação e
Desenvolvimento Econômico, (OCDE), a despeito de aparentemente ainda estarmos
em Programa Internacional de Avaliação de Estudantes (PISA).
O governo na última semana de maio
passado anunciou a Política Nacional para Recuperação das Aprendizagens na
Educação Básica. Ocorre que essa Política se valeu de uma Plataforma de
Avaliações Diagnósticas e Formativas que em nada é equivalente às avaliações já
citadas nem tampouco aos testes padronizados dos EUA ou de outros países.
Somado a tudo isso o Brasil com 26
semanas foi o segundo país em semanas de interrupção total das aulas
presenciais, ficando atrás apenas das 48 do México e ligeiramente a frente das
23 dos EUA.
Todos esses números mencionados abrem a
questão sobre o tamanho da perda educacional brasileira desde o inicio da
pandemia.
A perda dos EUA, e à medida, que fica
com apenas 3 semanas a menos de aulas suspensas que o Brasil teve, e com um
investimento educacional durante a pandemia de 123 bilhões de dólares, orçamento
inimaginável para a nossa experiência. O Brasil abriu mão da educação e dos
instrumentos que tinha para medi-la. É a Deseducação e a renúncia ao
conhecimento, a ciência, ao desenvolvimento tecnológico sério que lamentavelmente
podemos relatar.
Nem tudo são sombras. A cultura heroica
costuma aparecer em cenas dramáticas em momentos de transição. E agora ela está
associada à professora Simone Tebet que já se colocou a disposição para
enfrentar o desafio para dar início ao reencontro com o Amanhã e sua vocação educacional
democrática e republicana, tal como inscrita no nosso texto constitucional.
5 de novembro de 2022