sexta-feira, 8 de julho de 2022

SÉRIE ESTUDOS - STRANGER THINGS

 

O Mistério de Stranger Things[1]

Por Vagner Gomes de Souza


Na distante década de 80 do século passado um vírus foi responsável pelo desaparecimento do ator e dramaturgo Charles Ludlam. Diagnosticado com AIDS em 1986, veio a falecer em maio de 1987. Sua obra teatral mais conhecida foi O Mistério de Irma Vap que misturava as referências de filmes de terror com muito do burlesco é de 1984. O sucesso do texto teatral atravessou as fronteiras de seu país de origem – os Estados Unidos da “Era Reagan” para chegar aqui no Brasil da “Era Collor”. O Clip “Thriller” de Michael Jackson talvez tenha inspirado Ludlam, pois foi lançado em 1983. E muito poderíamos hipoteticamente escrever sobre a resistência do mundo da cultura a ascensão do neoconservadorismo através de uma nova linguagem no suspense e no terror. Portanto, o mundo do mistério e do encanto se fez presente nas possíveis interpretações daqueles anos 80 que a nostalgia contemporânea esconde seus tempos sombrios. No Brasil, a novela Roque Santeiro projetou o sucesso do professor Astromar Junqueira que se transformava num lobisomem.

Os anos 80 foram anos de um escurecimento da vida social com as aberturas para as fraturas nas relações sociais na década seguinte. A individualização suprimindo as amizades e outros laços afetivos. O medo como constante exercício do controle das pautas progressistas. Então, poderíamos identificar uma leitura desse contexto no desenvolvimento da série Stranger Things que ganhou uma audiência mundial e crescente desde seu lançamento em 2016. A muito da memória coletiva da cultura pop e de sua força no processo de globalização. Mas persiste o mistério em relação a adesão de segmentos juvenis a um seriado no qual há muito de altruísmo em seus personagens principais. Essa preocupação com o outro e a localidade em que vivem é uma mensagem que nos permite ter esperança com os passos das futuras gerações diante dos enfrentamentos do provir. Todavia, devemos atravessar o rubicão em algum momento diante dos desafios do conhecimento que um dia teriam sido ensinados pelos “Jedis”.


Ronald Reagan antes do Demogorgon

O professor Scott Clarke é uma sútil homenagem aos educadores que alimentam o exercício da curiosidade com os benefícios da dúvida em seus alunos. Não se distanciava de seus alunos mesmo naqueles tempos dos anos 80. Busca ser um “tradutor” dos mistérios do universo para aqueles que desejam crescer em tempos turbulentos. Se há um delegado investigador (Jim Hopper), não se esqueçam das chaves abertas pelo professor investigador.

O desafio do conhecimento científico é instigado em Stranger Things seja pela complexidade da explicação da aplicabilidade da “Teoria do Universo Paralelo” assim como para que as novas gerações identifiquem passagens e referências históricas daquele momento. Como se o tempo fosse visitado por um “portal” de análise no qual se faz necessário a mediação em que ainda mais a leitura e a ressurreição da educação se faz ainda necessária. O ambiente escolar se faz presente no desenvolvimento das tramas. A sua relevância já se faz presente na primeira temporada com seu clímax no último episódio.

 Demogorgon depois de Reagan

A primeira Temporada do seriado seria um alerta sobre os perigos que circulavam nos Estados Unidos de 2016 (ano da vitória de Donald Trump) no centro oeste norte-americano. Se Hawkins é uma localidade imaginária, o mesmo não ocorre com os resultados eleitorais no estado de Indiana, aonde ela se localizaria massivamente favorável a candidatura antissistema. Nada mais semelhante ao “mundo paralelo” quanto a busca de superações das crises através da antipolítica. Então, o desaparecimento de Will anuncia a chegada do Demogorgon como “provedor do mal”. Não deixemos de estar atenta a possível liberdade interpretativa em que o “tempo de Reagan” teria se congelado na mentalidade política de muitas pessoas. A referência a sobrenatural pela via grega muito nos revela também quanto a Democracia estaria sob ameaça nos dias atuais. O lado sombrio e seus “devoradores de mentes”. E desvendar esse mistério em Stranger Things é um estimulante desafio para aqueles que desejam lembrar que sempre se derrota o inimigo comum através de unidade de todas e todos.


[1] Esse artigo será o primeiro de uma série de artigos reflexivos sobre o que já se chama “Universo Stranger Things”.


4 comentários:

Pablo De Las Torres disse...

Excelente, aguardemos o próximo. E que educadores vejam a série e extraiam dali a importância da sua função em tempos fraturados.

Anônimo disse...

excelente!!

Anônimo disse...

Parabéns 👏 👏 👏 👏 como sempre excelente!!!

Marli disse...

Parabéns!
Perfeito.