segunda-feira, 21 de março de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION/NÚMERO 20 - ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS 2022


Bolsonaro pode ganhar sim. De novo.

 

Marcio Junior[1]

 

        

Em ano de bicentenário, se aproxima mais uma eleição presidencial. Como certa vez escreveu Luiz Werneck Vianna: mais do que uma escolha por um determinado candidato, seu partido e programa (aqui podemos e devemos não ser generosos: onde estão os programas, do ponto de vista objetivo? Temos?), significa, entre nós, uma escolha de futuro, de qual caminho queremos seguir.

Estamos, decerto, de frente a um cenário de terra arrasada já a alguns anos, o qual o atual governo não apenas contribuiu para aprofundar como se aproveitou dele anteriormente para ser eleito e governar. As transformações do capitalismo brasileiro, tendo o Estado como centro de inteligência e orientação para a expansão de uma ordem grão-burguesa, construída ao longo de décadas e que possibilita novas formas que aprofundam a concentração da acumulação de capital, minaram a política enquanto prática virtuosa de disputa republicana e democrática, que atingiu seu auge na Assembleia Constituinte em 1987/88. Essa associação entre Estado e mercado forneceu à sociedade, esta já sem luz própria, desorganizada e ressentida pela violência e pelo bolso vazio.

O "eu" do mercado, do ser que busca competir em nome dos próprios interesses e satisfações individuais, se tornou dirigente, e nas relações dele com outros sujeitos não há ou é muito restrito o espaço para a solidariedade, sendo este um fenômeno, decerto, global. Aqui, a mercantilização da vida social, algo visível  sobretudo nos coletivos e na educação (como, por exemplo, na criação de cursos de educação financeira e empreendedorismo nas escolas, equívocos que passam, inclusive, pela compreensão falha de como funciona o próprio mercado), está pulsante, tendo como suposto programa o estímulo equivocado à afirmação individual, sua identidade e busca pela saúde mental e financeira enquanto soluções suficientes para o enfrentamento e solução dos problemas históricos e sociais. O aporte emocional para o enfrentamento das mazelas da desigualdade do país viria tão somente do particular de cada um, levando as pessoas a procurarem aporte emocional em atividades que remontam ao seu interior particular, lotando igrejas neopentecostais, salas de espera para sessões de psicoterapia e não só.

Em meio a essa conjuntura de desequilíbrio de antagonismos, que ainda está a nos sufocar e já é propícia à fragmentação, as redes sociais repetem 2018 e se tornaram arena de embates, seja entre jovens ou mais velhos. Assim, o então candidato Bolsonaro, inteligentemente, percebeu a oportunidade de capturar ali os votos que o elegeram e conduziram ao centro da máquina administrativa o que há de mais atrasado entre nós. A lógica do "eu" sobre o "nós" encontra, deste modo, a sua tradução política no ideário de Paulo Guedes e não só, atuando em favor de um capitalismo sem freios, sob o “programa” de diminuição do público e tensionando com os elementos igualitários presentes na Carta de 88.

Esta problemática perceptivelmente ainda está entre nós, e há o desafio de atacar nossos problemas para que se possa direcioná-la para um caminho virtuoso, que compreenda as mudanças sociais irreversíveis que ocorrem diante dos nossos olhos. Não há como dar conta de tal tarefa sem, sobretudo, perícia política, algo difícil de ser feito em meio à “ditadura velada” das identidades, que nos sufoca e insiste em separar. O “eu” pode ser trabalhado de forma mais virtuosa e não excludente ao social, como no chaveamento teórico de um Norbert Elias em seu A Sociedade dos Indivíduos (Zahar, 1994).

Em entrevista a William Waack, realizada em 1997, o historiador Eric Hobsbawm foi perguntado por este jornalista sobre a história e o futuro, afinal, o futuro também pode ser história. O historiador, já idoso, se ajeitou em sua poltrona e chamou atenção para uma linearidade entre o passado, o presente e o futuro; quais as chances de algo que aconteceu ao longo do tempo e acontece hoje continuar acontecendo? Ou, fazendo uso do conceito da matemática, mais certeiro: qual a probabilidade? Esta, creio eu, é uma pergunta que precisa ser feita (e bem feita) por todos para se enfrentar o processo eleitoral decisivo que já acontece diante dos nossos olhos. Neste trabalho de imenso esforço há coisas que não se pode saber; porém, há outras que sim. Mesmo assim, a provocação cabível nesses tempos fraturados, que seguem seu curso, está na frase dita pelo célebre historiador: a única corrida de cavalos previsível é a que já acabou. O que podemos aprender sobre isso a partir de 2018 está aí: separar, em termos de sabotar propositalmente ou não os laços entre as pessoas, já nos levou e pode levar de novo a uma escolha funesta de futuro. Vamos em frente.




-       [1]Historiador e doutorando em Ciências Sociais em Agricultura, Desenvolvimento e Sociedade pela UFRRJ.

Um comentário:

Anônimo disse...

Tomara que ganhe mesmo����