domingo, 21 de abril de 2013

"Querida, vou comprar cigarros e volto já" - MINHA OPINIÃO



Experiência e Pobreza na vida de Ernesto

Por Vagner Gomes de Souza

“(...) Podemos agora tomar distância para avaliar o conjunto. Ficamos pobres. Abandonamos uma depois da outra todas as peças do patrimônio humano, tivemos que empenhá-las muitas vezes a um centésimo do seu valor para recebermos em troca a moeda miúda do "atual". A crise econômica está diante da porta, atrás dela está uma sombra, a próxima guerra. A tenacidade é hoje privilégio de um pequeno grupo dos poderosos, que sabe Deus não são mais humanos que os outros; na maioria bárbaros, mas não no bom sentido. Porém os outros precisam instalar-se, de novo e com poucos meios. São solidários dos homens que fizeram do novo uma coisa essencialmente sua, com lucidez e capacidade de renúncia. Em seus edifícios, quadros e narrativas a humanidade se prepara, se necessário, para sobreviver à cultura. E o que é mais importante: ela o faz rindo. Talvez esse riso tenha aqui e ali um som bárbaro. Perfeito. No meio tempo, possa o indivíduo dar um pouco de humanidade àquela massa, que um dia talvez retribua com juros e com os juros dos juros.”
Walter Benjamin (1933)

A Argentina está em “alta” diriam os entusiasmados jornalistas. Messi e Papa Francisco. Futebol e religião seriam os paradigmas mais simples de propaganda para o senso comum em nosso país. Entretanto, a Argentina “política” e “histórica” é nossa desconhecida como tantos outros desconhecimentos nossa sociedade tem sobre nós mesmos. A Argentina é o país sulamericano que já recebeu dois Oscars de Melhor Filme Estrangeiro (“História Oficial”, 1986 e “O Segredo dos seus olhos”, 2010) em Cinema e ainda tem uma presença rarefeita no circuito de distribuição de filmes apesar das recentes renovações de títulos variados em variados gêneros.
Ver um filme Argentino nos obriga a estudar uma nação limítrofe e constatar que muito podemos aprender nesses filmes se estamos inspirados pela aventura da pesquisa no “Google”. Diferentes narrativas cinematográficas tem sugerido que eles não estão satisfeitos com o “kichnerismo” além da recente polêmica do ator Ricardo Dárin referente ao patrimônio da Presidente de seu país. Agora, a comédia “Querida vou comprar cigarros e volto já” dos cineastas Mariano Cohn e Gustavo Duprat não fogem as raízes da reflexão sobre a sociedade política argentina uma vez que os mesmos dirigiram o curioso documentário “Yo Presidente” (2006) com relatos dos candidatos a Presidência da Argentina desde 1983.
Em “Querida, vou comprar cigarros e volto já” (2011), o artigo “Experiência e pobreza” do filósofo alemão Walter Benjamin estaria presente ao trazer a luz o “peso” do passado nos resultado de nossas ações presentes. Então, viria o desafio: “Você aceitaria retornar 10 anos de sua vida com os conhecimentos que tem hoje?”. Uma oferta de provavelmente de um Anjo – não se esqueçam de que Lúcifer é um “anjo caído” – que é personificado num mercador do Norte da África imortalizado por motivos que vão além da estatística. Um filme da Argentina que começa num distante passado em Marrocos prende a atenção do público desde os primeiros minutos.


 O "Anjo Sinistro" (Eusébio Poncela) e Ernesto (Emilio Disi) 


O “pacto sinistro” é oferecido a Ernesto (nome sugestivo para um argentino e para a “esquerda chavista” contemporânea), porém esse é um simples medíocre numa cidadezinha medíocre numa vida medíocre. Aliás, o roteiro permite uma narrativa que nos apresenta ao autor do Conto Original que inspirou o filme. Alberto Laiseca aparece em alguns momentos do filme para comentar as ações dos personagens e suas concepções. Temos a sugestão da influência de Woody Allen no filme argentino diante do passado da mãe que pesa nas lembranças de Ernesto e as referências ao judaísmo. No filme temos a psicanalítica referência materna nas lembranças do personagem que seriam úteis para pensar seu melancólico destino. Além disso, Ernesto é o fracassado que nos faz lembrar os personagens que Allen nos fez rir com seriedade ao longo de sua carreira como diretor. “Alter-ego” do contista argentino captado pelos diretores ou tudo seria ao mesmo tempo para perceber uma sociedade argentina no Divã após anos de “Evita” e nos tempos da “mamãe” Cristina.


Alberto Laiseca


A cada viagem de Ernesto ao passado uma forma de perceber que o tempo é imutável em seus principais fundamentos. Um sujeito histórico limitado sempre será limitado mesmo com a vantagem do conhecimento. Essa seria uma importante lição diante dos fantasmas do passado “peronista” que exorcizam os argentinos. Há uma forma diferenciada de fazer oposição democrática nos Pampas que não perdeu senso de humor. Lições benjaminianas para enfrentar outras variáveis do fascismo no século XXI que é globalizado como se percebe na última cena do filme. Uma convergência a obra de Woody Allen - “Meia-Noite em Paris” - que também é de 2011.

Sobre o filme argentino “Elefante Branco” leiam a crítica abaixo:
http://votopositivo-cg.blogspot.com.br/2013/01/elefante-braco-critica.html

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