Experiência e Pobreza na vida de Ernesto
Por Vagner Gomes de Souza
“(...) Podemos agora
tomar distância para avaliar o conjunto. Ficamos pobres. Abandonamos uma depois
da outra todas as peças do patrimônio humano, tivemos que empenhá-las muitas
vezes a um centésimo do seu valor para recebermos em troca a moeda miúda do
"atual". A crise econômica está diante da porta, atrás dela está uma
sombra, a próxima guerra. A tenacidade é hoje privilégio de um pequeno grupo
dos poderosos, que sabe Deus não são mais humanos que os outros; na maioria bárbaros,
mas não no bom sentido. Porém os outros precisam instalar-se, de novo e com
poucos meios. São solidários dos homens que fizeram do novo uma coisa
essencialmente sua, com lucidez e capacidade de renúncia. Em seus edifícios,
quadros e narrativas a humanidade se prepara, se necessário, para sobreviver à
cultura. E o que é mais importante: ela o faz rindo. Talvez esse riso tenha
aqui e ali um som bárbaro. Perfeito. No meio tempo, possa o indivíduo dar um
pouco de humanidade àquela massa, que um dia talvez retribua com juros e com os
juros dos juros.”
Walter Benjamin (1933)
A Argentina está em “alta” diriam
os entusiasmados jornalistas. Messi e Papa Francisco. Futebol e religião seriam
os paradigmas mais simples de propaganda para o senso comum em nosso país.
Entretanto, a Argentina “política” e “histórica” é nossa desconhecida como
tantos outros desconhecimentos nossa sociedade tem sobre nós mesmos. A
Argentina é o país sulamericano que já recebeu dois Oscars de Melhor Filme
Estrangeiro (“História Oficial”, 1986 e “O Segredo dos seus olhos”, 2010) em
Cinema e ainda tem uma presença rarefeita no circuito de distribuição de filmes
apesar das recentes renovações de títulos variados em variados gêneros.
Ver um filme Argentino nos obriga
a estudar uma nação limítrofe e constatar que muito podemos aprender nesses
filmes se estamos inspirados pela aventura da pesquisa no “Google”. Diferentes
narrativas cinematográficas tem sugerido que eles não estão satisfeitos com o “kichnerismo”
além da recente polêmica do ator Ricardo Dárin referente ao patrimônio da
Presidente de seu país. Agora, a comédia “Querida vou comprar cigarros e volto
já” dos cineastas Mariano Cohn e Gustavo Duprat não fogem as raízes da reflexão
sobre a sociedade política argentina uma vez que os mesmos dirigiram o curioso
documentário “Yo Presidente” (2006) com relatos dos candidatos a Presidência da
Argentina desde 1983.
Em “Querida, vou comprar cigarros
e volto já” (2011), o artigo “Experiência e pobreza” do filósofo alemão Walter
Benjamin estaria presente ao trazer a luz o “peso” do passado nos resultado de
nossas ações presentes. Então, viria o desafio: “Você aceitaria retornar 10
anos de sua vida com os conhecimentos que tem hoje?”. Uma oferta de
provavelmente de um Anjo – não se esqueçam de que Lúcifer é um “anjo caído” –
que é personificado num mercador do Norte da África imortalizado por motivos
que vão além da estatística. Um filme da Argentina que começa num distante
passado em Marrocos prende a atenção do público desde os primeiros minutos.
O "Anjo Sinistro" (Eusébio Poncela) e Ernesto (Emilio Disi)
O “pacto sinistro” é oferecido a
Ernesto (nome sugestivo para um argentino e para a “esquerda chavista”
contemporânea), porém esse é um simples medíocre numa cidadezinha medíocre numa
vida medíocre. Aliás, o roteiro permite uma narrativa que nos apresenta ao
autor do Conto Original que inspirou o filme. Alberto Laiseca aparece em alguns
momentos do filme para comentar as ações dos personagens e suas concepções.
Temos a sugestão da influência de Woody Allen no filme argentino diante do
passado da mãe que pesa nas lembranças de Ernesto e as referências ao judaísmo.
No filme temos a psicanalítica referência materna nas lembranças do personagem
que seriam úteis para pensar seu melancólico destino. Além disso, Ernesto é o
fracassado que nos faz lembrar os personagens que Allen nos fez rir com
seriedade ao longo de sua carreira como diretor. “Alter-ego” do contista
argentino captado pelos diretores ou tudo seria ao mesmo tempo para perceber
uma sociedade argentina no Divã após anos de “Evita” e nos tempos da “mamãe”
Cristina.
Alberto Laiseca
A cada viagem de Ernesto ao
passado uma forma de perceber que o tempo é imutável em seus principais
fundamentos. Um sujeito histórico limitado sempre será limitado mesmo com a
vantagem do conhecimento. Essa seria uma importante lição diante dos fantasmas
do passado “peronista” que exorcizam os argentinos. Há uma forma diferenciada
de fazer oposição democrática nos Pampas que não perdeu senso de humor. Lições
benjaminianas para enfrentar outras variáveis do fascismo no século XXI que é
globalizado como se percebe na última cena do filme. Uma convergência a obra de
Woody Allen - “Meia-Noite em Paris” - que também é de 2011.
Sobre o filme argentino “Elefante
Branco” leiam a crítica abaixo:
http://votopositivo-cg.blogspot.com.br/2013/01/elefante-braco-critica.html