sábado, 11 de abril de 2015

SÉRIE: DIÁLOGOS SOBRE A CONJUNTURA NACIONAL

A IRRESISTÍVEL TENTAÇÃO DO GUETO POLÍTICO
                   Luiz Eduardo Soares
 
A onda conservadora no Congresso, sob a batuta do que há de pior no PMDB --que ocupou o espaço deixado vazio pela desmoralização do PT e do governo--, ameaça tanto as conquistas sociais e os direitos civis e trabalhistas, quanto a crise provocada pelo bonapartismo arrogante e obscurantista de Dilma. A pauta reacionária no Parlamento inclui a consagração da terceirização, a redução da idade de imputabilidade penal e a revogação dos avanços no controle de armas. Por sua vez, os efeitos da crise econômica podem vir a dilapidar a redução das desigualdades e o aumento da renda dos mais vulneráveis, gerando desemprego e decepções em larga escala.
Tão dramático quanto este quadro é o seguinte: a miséria herdada mais imobiliza do que potencializa a participação cidadã e política; mas a perda do que se conquistou estimula a mobilização, com frequência, regressiva, ressentida, tendente a deixar-se capitalizar pelas forças mais conservadoras, quando não propriamente autoritárias. À direita, mais provavelmente, mas também à esquerda.
Por isso, em vez de frentes de esquerda sectárias, estreitas, enamoradas do chavismo e dos populismos autoritários, trata-se, e com urgência, de contribuir para a tessitura de uma frente ampla democrática --mais ao nível da sociedade do que dos partidos--, capaz de defender as conquistas e os direitos. A frente estreita esquerdista que está sendo construída é composta por lideranças e partidos que não foram capazes de enxergar aonde nos conduzia a política econômica desastrada de Dilma, ao longo do primeiro mandato, e que tampouco compreenderam como e por que a adesão do governo e do PT aos métodos políticos tradicionais, e sua tolerância com a corrupção, aprofundariam o descrédito da política, atingindo o coração da democracia.
Essa frente de esquerda não só é impotente para barrar os assaltos reacionários contra os direitos, como reduz as chances de que se constitua um arco de alianças suficientemente amplo em defesa das conquistas e dos direitos ameaçados, seja pela ação parlamentar conservadora, seja pela crise econômica. A frente esquerdista, entretanto, interessa ao bloco no poder, sobretudo a Dilma e ao PT, porque reproduz o discurso e o simbolismo da bipolarização. Isso é tudo o que o PT quer, reeditando a tática que aplicou na campanha. O dualismo do tipo guerra fria, em que o outro não é alvo de crítica e divergência, mas de condenação moral, em que o adversário é inimigo, em que o contencioso opõe povo e elites, bolivarianismo e neoliberalismo, este falso dualismo salva o PT e Dilma, tornando-os o eixo em torno do qual vão girar as alianças possíveis.
De meu ponto de vista, quem sustenta que a saída da crise é pela esquerda não entendeu rigorosamente nada sobre nosso passado e nosso presente, e está brincando com nosso futuro. A saída é uma ampla coalizão em torno dos direitos e das conquistas, em diálogo com as ruas, envolvendo a mobilização não aparelhada da sociedade, disputando o justo sentimento de indignação e evitando que ele seja capturado pela direita. O horizonte, isto é, o futuro a buscar é uma governança transparente, rigorosamente refratária à corrupção, aberta à participação, respeitando os direitos históricos dos trabalhadores, comprometida com a pauta humanista, os direitos humanos, os direitos dos indígenas, com a sustentabilidade e a redução das desigualdades, e refratária a improvisações irresponsáveis de efeitos destrutivos, sob a forma de um capitalismo de Estado ou de um projeto populista desenvolvimentista.
Não está na agenda histórica socialismo nenhum. Está na agenda a defesa dos direitos duramente conquistados e a disputa pelos setores de classe média --e não só-- que o PT empurrou para a direita, com seu apetite despolitizado pelo poder. As classificações simplistas e maniqueístas servem à bipolarização e ao governo e seus sócios, no Congresso. Não servem para pensar, dialogar e fazer política de novo tipo, cuja hora chegou.




sexta-feira, 10 de abril de 2015

ENTREVISTA - VLADIMIR PALMEIRA COM A PALAVRA!


 
"O PT APODRECEU."
 
Vladimir Palmeira é sempre lembrado como a liderança estudantil que fez história na luta contra a Ditadura Militar (1964-1985) no Brasil. Na redemocratização pós-anistia, ele foi um destacado dirigente do Partido dos Trabalhadores (PT). Entretanto, em 2011, com o reingresso de Delúbio Soares ao Partido, ele pediu sua desfiliação. Nos dias atuais, tempos de crise, a voz de Vladimir é coerente com seu passado à esquerda de muitos. Nessa entrevista para o VOTO POSITIVO, colhemos alguns momentos que vão incendiar a reflexão dos leitores. Vejam a seguir...

 
VOTO POSITIVO. Para onde vai o Brasil com essa Crise? A crise atual se assemelha a alguma anterior?

VLADIMIR PALMEIRA. Não se sabe. Não se assemelha a nenhuma anterior.
 
 
VOTO POSITIVO. O Governo Dilma tem condições de superar a Crise?
 
VLADIMIR PALMEIRA. Dificilmente, a crise foi criada pelo próprio governo, que continua a mudar de posições a cada momento. Apesar de proclamada autoritária, a presidente nunca teve rumo certo. Daí a falta de confiança dos agentes políticos e econômicos.
 
 
VOTO POSITIVO. Qual o papel da Oposição nesse momento?
 
VLADIMIR PALMEIRA. Que oposição? A oposição do PSDB é lamentável. Não há efetiva oposição de esquerda.
 
 
VOTO POSITIVO. Para atravessar o ano de 2015, qual seria o melhor conselho político?

VLADIMIR PALMEIRA. Que as principais autoridades renunciassem: Presidente da República, vice-Presidente, e os presidentes das duas casas do Congresso.
 
VOTO POSITIVO. O Senhor foi Dirigente do PT, como analisa a situação desse partido no cenário político atual? A Esquerda ficou órfã?

VLADIMIR PALMEIRA. O PT apodreceu. Não quer dizer que vá acabar como partido, mas perdeu inteiramente seu rumo.

VOTO POSITIVO. Será o PMDB, mais uma vez, o fiel na balança da política brasileira?

VLADIMIR PALMEIRA. Está sendo. O problema é que não se sabe para que lado balança.
 
 
VOTO POSITIVO. Alguma força política seria capaz de assumir um protagonismo semelhante ao "Podemos" na Espanha  ou o SYRIZA na Grécia?

VLADIMIR PALMEIRA. Não. Pelo menos por enquanto. Só um amplo movimento de massas pode gerar uma nova organização política.
 
 
VOTO POSITIVO. Por que a "Terceira Via" a polarização PT X PSDB tem dificuldades políticas para se consolidar nos movimentos sociais?

VLADIMIR PALMEIRA. Quem seria a terceira via? O PSOL apoiou Dilma, a Rede apoiou Aécio.
 
VOTO POSITIVO. As manifestações desse ano influenciarão nas eleições do próximo ano? Particularmente, o PMDB na Capital carioca ainda tem condições de se manter no Poder?

VLADIMIR PALMEIRA. É cedo para dizer.

sexta-feira, 3 de abril de 2015

ENTREVISTA - PROFESSOR ALBERTO AGGIO

Alberto Aggio
 
"CREIO QUE O PT REALMENTE PASSA POR UMA CRISE PROFUNDA."
 
 
No dia 30 de março o Professor Alberto Aggio teve seu artigo "O bumerangue e o 15 M" publicado em O Estado de São Paulo (leia o artigo nesse link http://gilvanmelo.blogspot.com.br/2015/03/alberto-aggio-o-bumerangue-e-o-15m.html ).
 
No artigo, o historiador chama as manifestações de 15 de março como o 15 M brasileiro para esclarecer que as ruas foram ocupadas por manifestações que não podem ser comparadas a nenhum momento histórico anterior. Nosso BLOG, atento ao debate sobre a atual conjuntura política, entrevistou Alberto Aggio e colheu novas interpretações sobre a nossa situação política. Leiam abaixo:
BLOG VOTO POSTIVO- Para onde vai o Brasil com essa Crise? 
        
É difícil dizer. Por agora está havendo um desgaste muito grande da presidente da República e do seu partido, o PT. O que é evidente pelas manifestações de rua e pelas pesquisas. A crise depende dos desdobramentos da operação Lava-Jato. Ela pode atingir políticos de diversos partidos, além do PT. Inclusive, o principal partido da Câmara que é o PMDB. Como muitos não creem no impeachment da presidente, se suspeita que uma das alternativas para a crise seja um grande acordo, uma espécie de novo transformismo com o PMDB no papel dirigente, o que não é o mesmo PMDB nem da transição democrática, nem o protagonista das sombras dos últimos governos.
 
BLOG VOTO POSTIVO- O Governo Dilma tem condições de superar a Crise?
 
A crise afeta muito o governo, inclusive para a reposição de suas peças principais, com a saída de alguns ministros, mas ainda não jogou o governo no chão. Ele está, por assim dizer, nas cordas, mas não caiu. E é óbvio que pode se superar. Mas não dá sinais claros qual o caminho que adotará para isso. Ao que tudo indica navegará lentamente tentando suportar a tormenta. A sua dependência em relação ao PMDB, que tem a presidência da Câmara, do Senado e a vice-presidência da República faz com que seja desaconselhado um caminho solo para o PT e Dilma superarem a crise, mesmo com um protagonismo forte de Lula.
 
BLOG VOTO POSTIVO-  Qual o papel da Oposição nesse momento?
 
O papel da oposição é se manter ativa, de preferência, nas ruas, protestando, buscando sua rearticulação, renovando sua política e sua cultura. Como não se deve esperar uma saída rápida para a crise, a oposição também tem que buscar um ativismo no interior da mudança do quadro partidário que se esboça no país. A reforma política deverá exigir a fusão de partidos no campo da esquerda democrática, o PSDB deve buscar um caminho de renovação da sua política e abrir-se mais à sociedade, e novos agrupamentos políticos estão surgindo ou se legalizando oficialmente, como a REDE, o movimento RAIZ, etc.
 
BLOG VOTO POSTIVO-  Para atravessar o ano de 2015, qual seria o melhor conselho político?
 
Manter-se atento e ativo, interessado nos acontecimentos da política; procurar participar com responsabilidade, agregando o maior número de pessoas para aquilo em que se acredita. Mas é preciso ter paciência e compreender que a política não é um resultado mecânico nas nossas vontades. Ela é um mundo complexo já que a nossa sociedade também é uma sociedade complexa e governar a complexidade não é uma questão simples.
 
BLOG VOTO POSTIVO-  Como analisa a situação do PT no cenário político atual? A Esquerda brasileira acabou?
 
Creio que o PT realmente passa por uma crise profunda. Na verdade, uma crise que revela muito do que ele realmente é e estava oculto, ofuscado. Ele sempre foi um partido que agregou interesses de diversos setores. No poder passou a lidar com isso de maneira mafiosa, criminosa. E mesmo assim, ou até por conta disso, adotou uma linguagem é uma missão de polo excludente. Esse modelo evidência agora sua crise parece que é terminal. Mas não por isso o PT irá desaparecer, apenas não se sabe muito bem o que resultará disso. Só se sabe que o passado das suas origens retóricas, de marcas dramatizadas da luta social, isso não voltará mais a convencer o conjunto da sociedade.
 
BLOG VOTO POSTIVO-  Será o PMDB, mais uma vez, o fiel na balança da política brasileira?
 
Não tenho dúvida disso. Perdeu-se muito tempo na discussão da polarização entre PT versus PSDB e não se atentou devidamente para os limites mas também as virtudes de um partido de centro como o PMDB. A rigor, o PMDB nunca levou uma política que atentou contra a democracia da Carta de 1988, muito ao contrário. É um partido moderado que tem setores ideológicos que percorrem todo espectro político. Não é um centro político com projeto de sociedade definido, de cunho ideológico. É isso o favorece como negociador. Mesmo porque a polarização PT X PSDB não é também uma polarização ideológica, com projetos à esquerda e à direita; ambos seriam moderados em suas pretensões. O PT leva uma política de polo no sistema político, mas não é um partido que leva uma política revolucionária; o PSDB é uma partido do liberalismo democrático no Brasil, bastante aberto a uma política de conciliação e só não faz isso pela política de rechaço que adota o PT. Nesse quadro tudo parece estar empastelado e de difícil manejo. A cena brasileira, portanto, necessita de muita arte política e o PMDB parece estar numa posição mais confortável para fazer isso.
 
BLOG VOTO POSTIVO- Alguma força política seria capaz de assumir um protagonismo semelhante ao "Podemos" na Espanha  ou o SYRIZA na Grécia?
 
Creio que não. Nem mesmo os novos agrupamentos políticos que citei acima em outra resposta. E diga-se de passagem que a experiência do Podemos e do SYRIZA estão ainda por se efetivarem. É preciso observá-las com maior atenção para extrair um bom diagnóstico delas.
 
BLOG VOTO POSTIVO- Por que a "Terceira Via" a polarização PT X PSDB tem dificuldades políticas para se consolidar nos movimentos sociais?
 
Imagino que seria pelo fato de que os movimentos sociais devem atuar de maneira menos partidarizada. Nem PT, nem PSDB ou qualquer outra força política deve ambicionar controlá-los, e sim conviver, dialogar e construir alternativas positivas junto com eles.