Lincoln: O Resgate de O Príncipe
Por Vagner Gomes de Souza
“(...) Enquanto
os operários, as verdadeiras forças [powers] políticas do Norte, permitiram que
a escravatura corrompesse a sua própria república, enquanto perante o Negro —
dominado e vendido sem o seu consentimento — se gabaram da elevada prerrogativa
do trabalhador de pele branca de se vender a si próprio e de escolher o seu
próprio amo, foram incapazes de atingir a verdadeira liberdade do trabalho ou
de apoiar os seus irmãos Europeus na sua luta pela emancipação; mas esta
barreira ao progresso foi varrida pelo mar vermelho da guerra civil.
Os operários
da Europa sentem-se seguros de que, assim como a Guerra da Independência
Americana iniciou uma nova era de ascendência para a classe média, também a
Guerra Americana Contra a Escravatura o fará para as classes operárias.
Consideram uma garantia da época que está para vir que tenha caído em sorte a
Abraham Lincoln, filho honesto da classe operária, guiar o seu país na luta
incomparável pela salvação de uma raça agrilhoada e pela reconstrução de um
mundo social.”
Carta de
Karl Marx para Abraham Lincoln (22-29 de Novembro de 1964)
O
diretor Steven Spielberg mais uma vez provoca os sectários do campo ético
lembrando que a ação política é uma atuação num terreno em resposta ao mundo
real. Surpreendente as comparações “anacrônicas” de jornalistas/colunistas
sobre cinema ao comparar as articulações para a aprovação da Décima Terceira
Emenda da Constituição dos EUA e aos fatos políticos que levaram ao chamado “mensalão”
no Primeiro Governo petista. Exageros da linguagem jornalística que acabam por
limitar as grandes lições que o filme concorrente de 12 Oscars nos impõe.
Lamentamos que esses pretensos especialistas em cinema não tenham mencionado
que em 1993 o mesmo diretor brilhou na direção de “A Lista de Schindler” (1993)
que narrava os métodos “corruptos” do empresário alemão Oskar Schindler salvar
uma parcela considerável de judeus dos horrores do Holocausto.
Fazer
comparações simplistas em Lincoln desvia o expectador da atualidade da política
americana polarizada pelos Democratas (agora no Governo) e os Republicanos
(majoritários na Câmara dos Representantes). Uma polarização que está presente
em diversos pontos: Reforma da Saúde, Limites das Vendas de Armas, Orçamento,
etc. O primeiro mandato do primeiro presidente negro dos EUA não foi simples
diante dessa polarização acompanhada por uma continuidade dos reflexos da crise
econômica de 2008. Lembre-se que Spielberg lança um filme sobre a Aprovação de
uma Emenda que libertou os Escravos e muitos críticos temiam que os negros
depois começassem a votar. Imaginem se eles soubessem do futuro.
Fazer
prognósticos sobre o futuro é uma sutileza do filme. Lutar pela aprovação de
uma Emenda em “curto tempo” diante dos possíveis impactos imediatos da
eminência do fim da Guerra Civil Americana. O fim da escravidão impôs uma nova
condição para a “Reconstrução” da unidade nacional federativa dos EUA. Assessores
não compreendiam essa rápida avaliação do Presidente Lincoln. Ator e tempo em
processo de longa duração estão presentes nesse filme. Digamos que Spielberg, depois
de resgatar a memória da invasão da Normandia em “O Resgate do Soldado Ryan”
(1998), agora realiza o resgate da Política nascida em Nicolau Maquiavel.