sábado, 8 de outubro de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION - NÚMERO 33 - DESAFIOS NO SEGUNDO TURNO

Prorrogação

 

Ricardo José de Azevedo Marinho[1]

 

Os resultados do primeiro turno das eleições brasileiras trazem várias lições para o país e para toda a América, que valem a pena assimilarmos. São de vários tipos, mas gostaríamos de nos concentrar em três: para os pesquisadores de toda a região; para Lula, para seu partido, para sua coligação eleitoral; e para os progressistas do continente.

Pela segunda vez em poucos meses, as pesquisas subestimaram o eleitorado de centro-direita e de direita na América. Foi o que aconteceu no Chile, tendo em vista a proporção muito maior do que as pesquisas apontavam, no referendo sobre a nova Constituição, no início de setembro. E agora, claramente, as pesquisas no Brasil também operaram em desenhos análogos sobre o voto a favor da centro-direita e da direita. Algumas pesquisas que lhe deram 48% estavam corretas na estimativa do percentual de Lula, mas quanto às centro-direita e a direita, a maioria das pesquisas previa entre 35 e 40% dos votos, e elas terminaram com 43%, uma diferença considerável.

A explicação mais provável em ambas as experiências – Chile e Brasil – é algo que já havia sido visto nos Estados Unidos da América (EUA) e em alguns países europeus, a saber: eleitores de centro-direita, de direita e/ou de extrema-direita relutam em confessar sua verdadeira intenção de votar ao pesquisador.

Essa síndrome, que nos EUA é uma teoria chamada de efeito Bradley, nasceu com a eleição para governador da Califórnia em 1982. Nessas eleições, o prefeito de Los Angeles, Tom Bradley (1917-1998), negro, estava à frente em todas as pesquisas. Ele perdeu para seu rival republicano George Deukmejian (1928-2018). A explicação encontrada pelos pesquisadores, que previam a vitória de Bradley, é que grande parte dos eleitores, mais de centro-direita, não quiseram admitir que jamais votassem num negro.

A lição para Lula e sua aliança é que, além da fragilidade que certamente se percebe nas duas casas do Congresso, onde a centro-direita e a direita alcançaram números melhores do que o esperado, o país permanece muito dividido. Se olharmos para os resultados desastrosos da gestão de Bolsonaro, em questões econômicas: na gestão da pandemia, na defesa do meio ambiente e no seu ridículo papel internacional, racionalmente poderia se esperar uma rejeição muito mais retumbante do eleitorado. Mas não é por esse parâmetro que as pesquisas deveriam ter ido. O povo obviamente votou; em parte contra o PT, em parte por causa do reacionarismo de Bolsonaro; mas não o abandonou por causa de critérios racionais por seu péssimo desempenho como presidente. Obteve quase dois milhões de votos a mais do que em 2018.


Isso significa que Lula, na prorrogação, tem tudo menos um programa para um mandato. Inteligentemente, o ex-presidente antes do início da prorrogação, falou pouco sobre o que planejava fazer e muito sobre o que havia feito durante seus anos como presidentes. Mas agora, por necessidade, terá que dizer, moderadamente, suas ambições sociais, ambiental, econômica e internacional dada a força que consolidou a centro-direita e a direita brasileira. Lula é um político inteligente, e com certeza saberá se alinhar com a realidade.

A lição para os democratas ibero-americana é que, apesar da pandemia, da contração econômica derivada dela a partir de 2020, da desigualdade, da péssima gestão da centro-direita e da direita em muitos desses países, os eleitores da região estão não estão dispostos a dar a seus governantes um mandato fora da revolução passiva. Querem alternância, querem mudança, querem uma política social ambiciosa, ousada e eficaz, mas não procuram uma revolução que não seja passiva. Concretamente, a centro-direita e a direita continental existe. Os resultados do Brasil e do Chile confirmam isso.

Teremos que ver com mais detalhes nos próximos dias e semanas porque os brasileiros votaram como votaram, qual é o perfil preciso das eleitoras e do eleitor da centro-direita e da direita, o porquê da opção inicial pelo reacionarismo de Bolsonaro e das eleitoras e eleitores de Lula, tanto em termos regionais quanto étnicos, em termos de gênero, religião, idade e inclinação política. Mas, por enquanto, essas três lições preliminares parecem ter chegado do primeiro turno das eleições brasileiras.

 

7 de outubro de 2022



[1] Professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da UniverCEDAE.

Um comentário:

José Bezerra de Oliveira disse...

Temos uma questão psicológica, não política!