terça-feira, 31 de maio de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION - NÚMERO 25 - SEGUNDO TURNO NA COLÔMBIA

O Outono do Petroarca

Por Vagner Gomes de Souza

 

Uma fábula do Nobel de Literatura Gabriel García Márquez saiu num distante ano de 1975 no qual a América Latina convivia com inúmeros projetos de Ditaduras Militares que contribuíram para o aprofundamento das desigualdades sociais neste subcontinente. Eis que O Outono do Patriarca cumpriu sua sina como um libelo a crítica ao anacronismo do autoritarismo e muitos se precipitam, erroneamente, a circunscrever o enredo do livro a situação da República Dominicana de então.

 Em seu realismo fantástico, o tempo e o espaço de curvam como se aprende na teoria da relatividade defendida por Albert Einstein. Há em sua ficção um pouco da teoria da longa duração lançada pelo historiador francês Fernand Braudel. Portanto, num universo de quase meio século a possibilidade de um outono autoritário na Colômbia é uma ameaça para as instituições democráticas na América do Sul. Com suas peculiaridades locais, Argentina (2019), Bolívia (2020), Peru (2021) e Chile (2021) inauguraram um redesenho político no qual a multidão emergiu no cenário político diante do desgaste de muitos métodos políticos.


Leitura limitada atribuir a esses resultados eleitorais como uma nova fase do populismo latino americano uma vez que há muitas mudanças no perfil das classes sociais nessa região ainda mais diante das aproximações no mercado internacional com a China e a Rússia. Diante da orientalização do CONESUL, todas as eleições locais não devem ser compreendidas como uma reprodução das eleições polarizadas norte-americanas. Eis que o sucesso da animação “Encanto” (Disney) poderia ser vista como uma reorientação da política externa de Biden para a região a partir do território amazônico.

Sai o “Zé Carioca olavista” e que venha a “Abuela” ao lado do “Trump colombiano”. Antes do segundo turno das eleições presidenciais na Colômbia, atravessaremos pela Cúpula das Américas (6 – 10 de junho) com a participação do mandatário do Brasil – um melhor modelo comparativo para pensar a realismo fantástico em nossa “realpolitik”. Já se falam do Encontro “BB” em junho meses após o Encontro “PB” dias antes da Guerra na Ucrânia. Como se manter em brasa quente a ameaça da “narcoguerrilha” do pós-Guerra Fria esteja a rondar o realismo fantástico das campanhas nas redes sociais as provocações podem surgir a cada momento até nas periferias cariocas. Então, não há um cenário kantiano que coloque Khamala Haris nas disputas eleitorais por ora seja lá, ou na Colômbia ou por aqui. 


Nesse momento um ex-Guerrilheiro chamado Gustavo Petro desponta nas eleições como favorito. Muitos jornalistas se esquecem de que Nelson Mandela e José Mujica tiveram um passado radicalizado num contexto de “Guerra Fria” e, depois, fizeram um “giro” para a política reformista em linha forte. Da ANAPO (de onde saíram os nacionalistas de esquerda do M19) até a aliança Colômbia Humana há uma trajetória política que comprova a fábula de que seria uma candidatura populista de esquerda e/ou extremista. Aliás, nos marcos da geografia política dessa candidatura estariam numa polaridade entre defensores da vida contra os defensores da morte. Esse transformismo tem sido um dos marcos políticos após a crise econômica mundial de 2008 que fraturou mais a política em segmentações. Não há mais a esquerda como nos cânones de A Era dos Extremos, o que permitiu a emergências dos ecos do ódio de uma “nova direita” mais belicista.

Petro como um Patriarca da fé hebraica reuniu na sua ampla e plural coligação uma Arca de projetos. Sua progressista gestão em Bogotá o qualifica como um bom gestor das coisas públicas, mas as eleições nacionais colombianas sofrem de ameaças do encanto carismático diante do desencanto pela ação da política. Não se pode deixar de considerar que o candidato da situação será “fiel” nessa balança eleitoral. Um pacto histórico se faz necessário mais uma vez naquele país e que reabram as negociações possíveis com os grupos políticos beligerantes.

Assim, o segundo turno das eleições colombianas é mais um momento dessas tensões políticas às vezes apolíticas e que podem jogar mais elementos no debate sobre a crise das instituições democráticas. As soluções termidorianas da “Primavera Árabe”, a emergência do “trumpismo” após o “Occupy Wall Street” e nosso nunca bem avaliado 2013 sugere que não teremos um “céu de brigadeiro” até a data de 19 de junho uma vez que poderia antecipar outras movimentações no Brasil. Na verdade, todos temem pelo dilúvio que deve ser enfrentado com muita Grande Política

quarta-feira, 25 de maio de 2022

ESQUERDA PELAS CANELAS (NÚMERO 3)

Temas Republicanos Importam

Por John Lennon Pereira

 

O mundo clamou em 2020 que “Vidas Negras Importam” o que fez muitos jovens iram as ruas em meio a pandemia na denúncia do Racismo. Em muitos países, incluindo o Brasil, o tema ganhou destaque e muitos “influenciadores” se manifestaram sobre o tema. Todavia, se faz necessário uma maior reflexão para nos preparar para o que está no povir nesse ano de eleições presidenciais. No dia 21 de maio de 2022 se reuniu no bairro Campo Grande na cidade do Rio de Janeiro o Fórum UBUNTU que realizou um momento de troca de experiências para buscar ações com a perspectiva de mobilização.

Em momentos como estamos passando, a gravidade do processo político é marcante. A crise económica, inflação alta, desemprego estrutural, carestia diante de uma inflação com tendências ao descontrole e complicações políticas regionais/nacionais: o tempo urge. Muito importante pensar e retomar os movimentos sociais e culturais que marcaram a história carioca com a adesão de novos sujeitos sociais. Portanto, é preciso fazer uma ponte entre diversos tipos de movimentos, saindo da sua própria “bolha”, como muitos relataram no encontro.

Compartilhar culturas e experiência dentre diversos tipos de movimentos é uma das grandes iniciativas do Fórum nesse momento e há muito ainda por se fazer. A sensação de derrota não se pode deixar contaminar diante das grandes tarefas que se avizinham. Momentos e momentos fazem com que a história gire com seres humanos buscando uma construção programática.

É com essa visão que o movimento Negro vem buscando e quer fazer essa união, pois na politica não há atalhos, assim é o mesmo no ato de estar presente em todos os movimentos. Para se sair da “bolha” deve-se não só ficar no debate fraturado, e sim ampliar o debate dessa Frente Democrática em seus eixos políticos e institucionais. Negros, mulheres, índios, trabalhadoras e trabalhadores, LGBTQI+, os pobres em geral estão num mesmo processo de luta por uma República.

 Muito sabemos do sofrimento diante desse governo que tem um perfil autoritário. Derrotar esse atraso que aqui está demanda essa ponte dentre os movimentos com a política de frente. E muito necessário detalhar elementos programáticos a serem debatidos como a retomada da demarcação das comunidades quilombolas, por exemplo, que está na esteira de um tema, ou seja, agrário ou urbano. Nesse sentido, novas energias e outras produções escritas contaram para o próximo encontro.


Derrotar esse atraso não será tarefa fácil, mas o mais difícil será fazer um programa que inclua todos esses movimentos, pois não podemos ficar na narrativa como ocorre e ocorreu, "não vai ter Copa", "Ele Não", e ficar nessa narrativa pode nos levar as derrotas na política.  Vai sempre passar, não só a "Boiada", então sim é momento de uma frente ampla da cultura, desse povo brasileiro que não tem esse perfil fascista, fazer uma  autocrítica. Analisar os erros e acertos, do que poderá ser feito e resgatar personagens históricos nos diversos “territórios” como dizem na atualidade.  As literaturas ricas que temos e pensar em quais caminhos irão percorrer, pois mesmo ganhando eleições presidenciais.  Só isso não bastará.

 

sábado, 7 de maio de 2022

BOLETIM ROMA CONECTION - NÚMERO 24 - TEMPO DE DIÁLOGO (ELEIÇÕES 2022)


 Partido SOLIDARIEDADE declara apoio a Chapa Lula/Alckmin 
(Estadão Conteúdo/WERTHER SANTANA)

Compromisso Histórico

Ricardo José de Azevedo Marinho[1]


Parafraseando livremente Hegel, é curioso como a história às vezes brinca conosco e faz a confusão ser capaz de coisas que aparentemente vão contra nossos interesses.

No Brasil, nestes tempos difíceis e desafiadores, é evidente a necessidade de chegar a acordos políticos, pois a pandemia e suas amplas consequências (econômicas, sociais, culturais, educacionais, entre tantas outras) exigem a colaboração de todos para superar a catástrofe, o sofrimento e a morte.

Estamos já adentrando no terceiro ano pandêmico global que quando finalmente parecia poder ser domada pela ciência, brota novamente mudanças de sua dinâmica onde a experiência chinesa de Xangai e Pequim estão demonstrando, e esse seu ressurgimento se dá de forma mais sorrateira quando estamos cansados, "cansados ​​da pandemia" como se diz e, consequentemente, revoltados com o mundo e com a coisa mais próxima que temos: o governo.

Na verdade, este, como alguns outros no planeta, cometeu erros em demasia diante do perigo da pandemia que não descansa em sua revivência cega e ao declarar encerrada a Emergência em Saúde Pública de Importância Nacional (ESPIN) em decorrência da infecção humana pelo coronavírus (2019-nCoV) é uma medida que exige um esforço de coordenação que não se fez presente neste governo desde o início dela.

Novas estratégias programáticas terão que ser buscadas, mas qualquer uma delas será muito mais eficaz se for realizada em um país cuja convivência seja pacífica, que gere serenidade e otimize a busca de equilíbrios que ajudem a lidar com a pandemia e minimizar seus efeitos nocivos sobre o trabalho, educação, economia, entre tantas dimensões, para poder, uma vez que a tempestade passar, recomeçar, quando possível em melhores condições.

Infelizmente não é o espírito social e político que vemos hoje em nosso país. Em muitos, o aspecto agressivo aparece bastante acentuado, a busca de ressentimentos e culpas, sobretudo, em que pensam diferente, a tendência a desprezar o que a democracia alcançou nestes anos pós-ditatoriais, e pior, a desqualificar a democracia tout court numa espécie de eterno retorno aos tempos de violência física e intolerância intelectual.

O espírito virulento faz crescer a desconfiança, o espírito cívico desaparece e enfraquece a atitude solidária. O sistema político e as instituições democráticas, que com todas as suas fragilidades e limites têm sido um fator fundamental para o progresso do país, estão sendo confundidas o que faz perderem a sua capacidade. Estes tendem a agir de forma reativa, respondendo apenas ao dia a dia, esquecendo completamente as necessidades de futuro, que podem acabar delineando um mundo ulterior de mediocridade e decadência.

Quando as lideranças políticas encolhem, as ideias e propostas também encolhem; por outro lado, os ouvidos dos cidadãos ficam surdos e só predominam as emoções e os ressentimentos.

Consequentemente, o debate político se transforma em puro marketing fragmentado que concorre em ofertas e lisonjas, num leilão de sonhos, que não propõe nem esforço nem sacrifício; irresponsabilidades e ideologias aparecem em todo seu esplendor soturno.

No entanto, o enredamento emaranhado e a confusão abrangem todo o arco político, desde a extrema direita governamental nostálgica pela ordem autoritária até a extrema esquerda alérgica às instituições democráticas e aos compromissos históricos políticos.

Aqueles que durante anos insultaram a democracia e seu andamento que foi capaz de realizar mudanças graduais (os governos de 1995 a 2010), não podem reclamar, eles alcançaram seu objetivo, hoje essa visão está muito diminuída até mesmo em seus próprios partidos e eles têm pouco espaço e menos tempo ainda para recuperar um significativo lugar na nossa vida política.

Mas a mudança não é impossível e não tem nada a ver com um retorno ao que já foi feito, e o que deve ser orientado no Brasil de hoje é propor novas mudanças que tenham em comum com aqueles tempos o respeito às liberdades e a busca incessante pela igualdade nas suas várias dimensões. Mas para isso é preciso perder todos os complexos e sentir orgulho em representar o caminho do diálogo, da busca de acordos, de sermos promotores de compromissos viáveis.

Sentindo que esse movimento de Alckmin e Lula condiz com este espírito que nos permite avançar de forma pluralista para uma melhor democracia e que uma maior transparência, essencial na sociedade da informação, não significa anular a mediação reflexiva característica da política democrática. Entre outros sinais, assim devemos ver o aceno respeitoso de Doria.

Chega de farsas e palavrões! É preciso desacreditar a barbárie violenta, é preciso desacreditar a barbárie verbal e acabar com a desconfiança. É preciso voltar à sanidade, dialogar, debater e construir acordos. A verdade na política é sustentada assim e não por ninguém em particular, nem por aqueles que, tendo obtido um voto “regular”, venham a pretender encarnar a construção social imaginária que chamam de povo.

 

3 de maio de 2022



[1] Professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da UniverCEDAE.