A SAGRADA (DES)POLÍTICA DA JUVENTUDE
“Quem vive de verdade
não pode não ser cidadão e não tomar partido. Indiferença é abulia, é
parasitismo, é covardia, não é vida. Por isso odeio os indiferentes”.
(Antonio
Gramsci)
Por Lucas Soares
Existem limites para a ação conjunta entre
teoria e prática? De que vale a ação sem a análise, ou vice-versa? Reformulo: É
possível solucionar um problema de uma dada realidade, sem que tanto o
problema, quanto as suas soluções tenham sido geradas pelas contradições
existentes entre a própria realidade material e o problema?
Esta
equação que a priori demonstrava-se solucionada no século XIX pela teoria
marxiana, hoje desmonta-se no seio da sagrada juventude brasileira a qual
afirma “conjurar os espíritos do passado” sob justificativas pseudo-revolucionárias
invejáveis aos antigos jovens amantes do Espirito Absoluto. Justificativas que,
apesar de ousarem relegar as premissas teórico-práticas que solucionaram os
paradoxos que nos introduzem às indagações de escrita deste manifesto, atropelam
os mesmos teóricos e intérpretes, de forma a negarem-se da análise tanto das
origens de nossos problemas políticos, quanto das intervenções consequenciais
dessas origens na conjuntura curta e atual.
Isto posto, miremos ao alvo: A fuga da
análise do concreto, dada pelas sandices e desvios de caráter de alguns dos
postulantes a preencher o vácuo existente nos espaços de atuação e teorização
da grande política, lida e centrada em alicerces de bases reais, assim como em
problematizações, teses, hipóteses e manifestações de cunho político e nada
mais que isso, apresenta um problema que poderá ser crônico caso não se
identifique e trate imediatamente. Problema este é a desconexão da juventude - a
qual me enquadro e me identifico - com o real, sob forma de divisões, legendas
e bandeiras de construção identitária que buscam primeiramente rotular e
identificar o que é a sua tentativa de atuação política, para depois analisar
os processos que buscam dar cabo. Quanto a isso, sou otimista, pois na maior
parte das vezes a euforia pela identificação ofusca o desejo de entender o
fenômeno que acabara de vivenciar e atuar sobre ele. Além do mais, ao passo da existência de
inúmeras frentes de identificação política, estão as rusgas entre as mesmas.
Neste
sentido, os mesmos quadros tão distantes da realidade e entrincheirados no
mundo paralelo de seus respectivos movimentos particulares e sectários,
atropelam a possibilidade de constituir uma transição efetiva e bem-sucedida da
geração de atores e quadros políticos. Ficamos, portanto, na estagnação. Essa
imobilidade, no entanto, não é etária, e sim epistêmica.
De toda forma, quão amante do Espírito
Absoluto seria eu se apenas repreendesse o problema da fuga da realidade pela
juventude sem, em meio ao processo de identificação do mesmo, buscasse também
entender o processo que nos levou a esse problema? É necessário encontrar nele
a solução para que sua superação se encontre.
Portanto, exposta a tese de que existe um
abismo na formação de novos quadros políticos; e a antítese da fuga da
realidade pela juventude que deveria ser o motor revolucionário e epistêmico de
transição da política nacional; torna-se necessário, por síntese, o debate
sobre o futuro que este segmento enfrentará. Afastando-se, porém, de qualquer
projeção futurista, pitoresca e fantasiosa, nosso foco deve ser problema
histórico real: a precarização do trabalho e a superexploração no
empreendedorismo dissimulado. É inconcebível a forma pela qual tornaram-se
hegemônicas algumas fraseologias e palavras de ordem que esgotam os neurônios
de qualquer um que deseja, através delas, compreender a política e construir de
forma democrática relações e alianças para a sublevação do cenário de
calamidade que se observa. Tais expressões, de maneira oposta a intenção de
quem as decora e as reproduz por osmose, esvaziam as discussões e movimentações
que deveriam ser realizadas dentro do jogo democrático. Enquanto isso, ao passo
de genocídios, negacionismos e fascismos, a movimentação real da política acontece.
Nela, os novos atores que tentam sua transformação não são capazes de
empreender uma oposição ampla que politicamente debata os estragos da pandemia
na vida dos brasileiros, que estanque o sofrimento das famílias de mais de 500
mil vidas ceifadas, e que, posteriormente, pense a vida, a economia, o emprego,
a saúde, e a educação pós pandemia. Sem projeto, ficaremos à mercê da
terceirização e da informalidade trabalhista. Com fraseologias e sectarismo,
amargaremos o desabrochar de um neoliberalismo apocalíptico para os jovens.
Por certo, uma certeza temos: a festa da
democracia se aproxima! Nesta festa, os movimentos reais da política acontecem
independente das idealizações do jardim de infância revolucionário. Nos
preparativos para tal evento, estou certo também da urgência pela erradicação
do esvaziamento político em nossos discursos e em nossas ações. Tomar partido
não é transformar a luta pela revolução em identidade. Não ser indiferente é
agir de forma concreta para que as vias de acesso à superação do distúrbio
neoliberal estejam cada vez mais claras próximas. Tomemos partido, jovens!