O
Partido de Narciso
Por Vagner Gomes
de Souza
Narciso é um personagem
da mitologia grega que muito se assemelha as análises de conjuntura feitas
pelos dirigentes do Partido dos Trabalhadores após as eleições municipais de
2020. A vaidade é representada nele. Ele teria nascido com uma grande força
atraente, porém foi aconselhado por Tirésias a não admirar sua beleza. Todavia
a beleza foi acompanhada pela arrogância e o orgulho. Nunca se apaixonou pelos
outros que o admiravam e ficou perdidamente apaixonado pela sua beleza
refletida num lago. A Ninfa Eco, por não ser correspondida em sua paixão, lançou
um feitiço que o fez definhar olhando sua imagem no lago até a morte.
Diante da gravidade da
conjuntura nacional no ano de 2020, os dirigentes do Partido dos Trabalhadores
pretendem debater suas diferenças internas observando seus resultados eleitorais.
Como se fosse o Narciso se admirando no lago, os dirigentes dessa agremiação
partidária do campo reformista democrático perdem escrevendo linhas sobre
números comparativos dos votos conquistados, prefeituras conquistadas, total de
habitantes de prefeituras conquistadas ou de vereadores eleitos. Como se as
contradições das classes sociais estivessem expressas nas linhas eleitorais. Um
partido político é simplesmente uma fração da sociedade brasileira ainda mais
num sistema partidário muito diferente tanto do “modelo europeu” e também do “modelo
norte-americano”. Assim, os números refletem os gostos do narcisismo como “falsete”
de análise política.
Nada nos opomos ao
necessário balanço partidário que se faça de um processo político que foi histórico
por ter ocorrido numa situação de pandemia. Na época da Gripe Espanhola uma
expressiva massa de brasileiros não eram cidadãos ativos numa República
oligarquizada que adotava um liberalismo ortodoxo na economia. Fazer esse
balanço é muito importante a partir da percepção da correlação das forças
políticas e sociais que estão em movimento em plena mutação de nossa estrutura
econômica. As capitais brasileiras definham sua sustentabilidade econômica por
terem se transformado em espaços urbanos de serviços sob o impacto recessivo da
pandemia. A precarização do mundo do trabalho nas capitais sugere muito da
natureza de uma possível derrota eleitoral de um partido que se diz
representante dos trabalhadores. Todavia, os dirigentes do Partido alimentam
seus argumentos com a arrogância e a vaidade para se realizarem lutas internas
paralisantes.
Numa negação do
conhecimento do mais básico marxismo de um Plekhanov, individualizam os
resultados eleitorais do Partido. Seria de bom tom que se aproximassem desse
ensinamento daquele que um dia inspirou Lênin. “(...) Mas, nenhuma outra
particularidade provável garante a pessoas isoladas o exercício de uma
influência direta sobre o estado das forças produtivas, e, por conseguintes,
nas relações sociais por elas condicionadas, isto é, nas relações econômicas.
Um dado individuo, quaisquer que sejam suas particularidades, não pode eliminar
relações econômicas determinadas, quando estas correspondem a um determinado
estado das forças produtivas. No entanto, as particularidades individuais da
personalidade tornam-na mais ou menos apta a satisfazer as necessidades sociais
que surgem em virtude de relações econômicas determinadas ou para opor-se a
essa satisfação.(...)” (O papel do
indivíduo na História). Essa longa passagem demonstra o quanto é um
equívoco projetar 2022 a partir de um indivíduo que já foi Presidente da
República 20 anos depois de sua primeira eleição.
Seria o momento do
Partido dos Trabalhadores fazer a política de aproximação com o centro político
compreendendo sua vitória de um amplo leque de forças do “Campo Democrático”
nas eleições municipais de 2020. O “Campo” saiu vitorioso por nele fazer parte
o PT. O PT saiu derrotado se considerar que não faz parte desse amplo campo
democrático se auto isolando como um “Narciso Chic”. Nessa dialética que
poderia se fazer qualquer balanço partidário de uma esquerda amadurecida ao
ponto de perceber que sua função seria ser um instrumento para a emancipação da
sociedade ao contrário de pensar a sociedade como reflexo de sua acumulação de
força política. O eleitor demonstrou que está interessado na redução das
desigualdades sociais num amplo leque de possibilidades politicas – do
empreendorismo até a taxação das grandes fortunas passando pelas vertentes revisionistas
da economia criativa e da renda mínima. Não inserir esses pontos num balanço
partidário é fazer uma política só eleitoreira pois só se alimenta num processo
de constante debate eleitoral (primeiro as eleições na sociedade para depois
entrar nas eleições internas e depois retornar para as eleições gerais). Essa é
uma característica muito questionada no atual mandatário presidencial que nunca
sairia do “palanque” e se negando a governar para a sociedade. O narcisismo na
política é o alimento da polarização que pode definhar as instituições
democráticas. Portanto, o feitiço de Eco precisa ser quadrado por quadros internos
ou externos ao PT como alerta do quanto esse momento impõe a necessidade da “Grande
Política”.
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