Ricardo José de Azevedo Marinho[1]
Tal como temíamos, o debate político segue
um caminho de confusão onde abundam brigas e intrigas. É difícil para nós o
povo que não vivemos no poder, mas no país, compreender como são as coisas e
para onde vão. À medida que se aproximam as eleições para as prefeituras e
câmaras municipais, tudo indica que o tom vai subir, que haverá menos espaço
para discutir com racionalidade a situação do país e tentar encontrar
entendimentos e soluções.
Vivemos uma dupla briga, aquela entre as
duas forças eleitorais que saíram das eleições 2022, uma da vitoriosa Frente
Democrática e outra da coalizão do governo anterior derrotado e agora na oposição,
bem como a briga que existe dentro de cada uma dessas coligações eleitorais,
porque são constituídas por forças que não são apenas diferentes, o que é
completamente aceitável, mas com concepções as vezes conflitantes, caminhos culturais
contraditórios, e até mesmo reações políticas e de cordialidades instantâneas e
antitéticas aos acontecimentos. São como um contrato de namoro regado as conveniências
e quiçá do mau acordo, obrigados a viver juntos pelas necessidades de
sobreviver e de alcançar ou manter o poder e seu status, que não
consegue esconder os seus problemas, as suas brigas, as suas ausências, para
não falar do amor, mas até de um tênue afeto. Então vão eles, acorrentados pela
vida, para acertar cada qual com sua comédia de erros, em que se preferiria não
estar naquela companhia, sorrindo juntos com um rito de descontentamento oculto
diante das câmeras.
Na extremidade de uma das coalizões se
fez o envio de suas principais líderes para viajar. Alguns foram para embaixadas
da Hungria, esse belo país que hoje, sob o autoritarismo eletivo, constrói
muros, se declara iliberal e promove a extrema direita em todo Leste Europeu.
O que isto tem a ver com o futuro de um
país como o Brasil, que conseguiu sair de uma ditadura e avançar durante anos
num desenvolvimento progressivo e equitativo que infelizmente perdeu o seu
impulso propulsor, e a coesão dos cidadãos e a jornada social nos últimos dez
anos?
O Brasil exige uma nova organização das
forças políticas que contribua para uma melhor governação e a construção de
acordos para que a democracia funcione e gere um desenvolvimento econômico que
dê sustentabilidade aos avanços sociais que estão a ser alcançados. Que permita
recuperar a confiança nas instituições democráticas e que recupere o prestígio
da política e dos políticos, elevando a sua qualidade e representatividade.
É necessário um objetivo estratégico
que não existe desde as últimas duas décadas apesar de todas as possibilidades
que os nossos recursos naturais nos abrem na era digital. A questão é que não
estamos fazendo isso e, para piorar, alguns ficaram obscurecidos pela sua
imaginação ideológica, outros pela sua rigidez atávica.
O acúmulo do que conquistamos nos anos
anteriores nos permite, no entanto, seguirmos caminhando na república e na
democracia e até o momento não termos um colapso institucional tal como
desejado no 8 de janeiro de 2023, nem nos números
de pobreza e desigualdade em que avançamos para reduzi-los e encurtar a
disparidades, respectivamente.
É possível continuar assim? Claro que é
possível, mesmo com o tempo vamos nos acostumando, vamos achando natural a mediocridade,
vamos nos adaptando a piores serviços, para cidades dilapidadas, populações que
vivem em condições indignas e um Congresso de má qualidade.
Estamos diante de uma grande
encruzilhada que não pode ser resolvida recusando as histórias, mas
estabelecendo metas compartilháveis. Já tivemos muitas histórias globais e algumas
delas foram rejeitadas pela grande maioria das pessoas e isso não resolveu nada.
Contar a nós mesmos as nossas histórias ajudará a conseguirmos nossa coesão e
com ela recuperar o impulso propulsivo.
E só seremos solidamente estáveis se
recuperarmos a história do impulso propulsor e, para isso, é necessário
recuperar as histórias da Frente Democrática, seus passos reformistas dos
acordos que perdemos por inúmeros equívocos, inclusive recentes. Mas
infelizmente, pelo menos nesta rodada, aqueles que puderam promover a vitoriosa
Frente Democrática em 2022, neste novo tabuleiro político marcado por uma
competição eleitoral, avessas em tudo a uma visão construtiva e com isso pouco
poderão fazer, ainda que tentem mitigar as forças extremas que querem impor a
sua própria verdade e a quem os avanços democráticos pouco importam perto das
suas utopias e distopias. Enquanto isso não mudar, será impossível sair da estagnação.
E será com a Frente Democrática, simbolizada nesse dramático dia em Porto
Alegre na coletiva da imprensa, tal como havia acontecido no histórico discurso
presidencial na solenidade de sua posse no Congresso Nacional em 1 de janeiro
de 2023, que conseguiremos reconstruir o Rio Grande do Sul.
5 de maio de 2024
Recomendo essa leitura!
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