Centro
Oeste é uma peça
Vagner Gomes de
Souza
“E nessa loucura
de dizer que não te quero
Vou negando as
aparências
Disfarçando as
evidências
Mas pra que
viver fingindo
Se eu não posso
enganar meu coração?
Eu sei que te
amo!”
Evidências - Chitãozinho
& Xororó
As placas tectônicas da
sociedade brasileira se movimentam gradualmente sem os grandes abalos sísmicos
de nossos vizinhos da “Terra do Fim do Mundo” ou do não vizinho Equador. O
censo demográfico de 2022, aos poucos, nos revela uma interiorização que foi
inaugurada por JK e seu “nacional desenvolvimentismo”. Aliás, uma modernização
conservadora que teve sequência em tempos ditatoriais. Assim, o exclusivo
agrário brasileiro se abriu no Outro Oeste com uma “ilha de servidores
públicos” que vem a ser Brasília.
Essas movimentações
moleculares se observa no filme “Minha Irmã e eu” que trabalha a dicotomia
“litoral” e “sertão” presente na obra Os
Sertões de Euclides da Cunha. Esse é o estranho momento em que os espíritos
do passado fazem um filme popular de humor andar em suas próprias pernas por
temas delicados e sorrateiros. Direção, nas mãos da experiente Susana Garcia, os
roteiristas e atores colocam diante dos olhos da sociedade brasileira um mundo
rural mais conhecido pela música sertaneja. Um “novo e velho” mundo rural de onde
surgiu o personagem Mazaropi.
As irmãs Mirian
(“sertão”) e Mirelly (“litoral”) seria a melhor metáfora para essa mutação na
sociedade brasileira. Vivem seus conflitos desde criança ao ponto de não
realizarem o sonho da mãe – em interpretação brilhante de Arlete Salles. Numa
estória que se faz sob olhar feminino ao contrário dos atalhos que vertentes
pós-modernas poderiam sugerir. A dialética sem síntese sem os atores da
política nos faz reconhecer um outro estado de Goiás que já teve Pedro Ludovico
(que talvez explique a predileção da elite local pelo curso de medicina) pai do
ex-Governador cassado na ditadura militar Mauro Borges (nascido na mesma Rio
Verde das personagens do filme).
Ambos, dirigentes
políticos viveram no Rio de Janeiro em tempos diferentes da personagem Mirelly,
protagonizada por Tatá Werneck. Esse Rio de Janeiro do filme é a expressão da
ilusão de um antigo glamour diante de uma estrutura social falida (vide as
referências aos assaltos). Nesse mundo, os ventos do americanismo do filme “Minha
Mãe é uma Peça” se faz presente ao trabalhar inúmeras nomenclaturas do
cotidiano social. A família repensada de uma forma humorada. Por outro lado, a
irmã mais velha é Mirian (protagonizada por Ingrid Guimarães) que vive a ilusão
da família perfeita. Viveu a continuidade em Rio Verde seguindo a vida óbvia da
música “Cotidiano” de Chico Buarque no Centro Oeste aonde o café cede para o
frango com alçafrão. Todavia, uma mudança residencial impacta no problema
demográfico brasileiro. “Quem vai cuidar de mamãe?” Em que “mundo” de ilusões
se assumirá os cuidados de uma idosa que fez 75 anos?
O nosso conservadorismo
segue seu curso sem se deixar levar para os extremos. “Quando eu digo que
deixei de te amar / É porque eu te amo (...)” é o começo da música “Evidências”
(Chitãozinho & Xororó) muito bem usada no filme e que nos revela muito bem
esse transformismo nesse “ziguezague” a procura de uma frente. Seria três
personagens (Miriam, Mirelly e a mãe) a procura de um novo sentido que
evidencie um Brasil mais brasileiro pela via de uma recomposição da política.
Logo, não é apenas a busca de uma mãe, mas também a busca de uma interpretação
para esse novo país que emerge. “Eu tenho medo de te dar meu coração / E
confessar que eu estou em tuas mãos” segue esse outro trecho da música para
ajudar a compor nossa percepção diante de uma região que nos deu uma Ministra
do Planejamento.
O filme promoveu o
reencontro do público brasileiro com o cinema nacional. Uma vez que o mundo
real clama e há uma necessidade de fazer a agregação das pessoas de todos os
segmentos por uma vida mais republicana e democrática. “Eu preciso aceitar que
não dá mais - Pra separar as nossas vidas” seria uma possível provocação para
aqueles que não acreditam nos valores da Frente Democrática assim como se vê na
cena final do filme. Ouçamos a realidade nesse ano de desafios na recomposição
democrática do centro político.
👏👏👏👏
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