Mussum,
a Frentis
Em memória de
Luciano Leal dos Santos (Mangueirense, Flamenguista e meu tio)
Por Vagner Gomes
de Souza
O filme “Mussum, o
filmis” timidamente ganha espaço no imaginário popular uma vez que foi bem em
sua primeira semana de estreia no décimo primeiro mês do governo Lula/Alckmin.
Se o filme é tecnicamente perfeito, destaquemos que é muito mais que isso se
for avaliar sua contribuição cultural do frentismo democrático. Uma vez que
Antonio Carlos Bernardes Gomes era um sambista e humorista que fez as pessoas
rirem com as mudanças linguísticas. Além disso, ocupou o “lugar de fala” do
cidadão comum brasileiro, ou melhor, o carioca que torcia pela Mangueira e o
Flamengo.
O roteiro acertou em
fazer uma biografia com humor pelo que representou o biografado em sua carreira
em Os Trapalhões. Essa opção incomodou algumas vozes que desejavam um
Marighella no humor. Porém, não há atalhos no roteiro muito bem dirigido por
Silvio Guindane. E, aqueles que conhecem um pouco de história da cultura
pecebista irão reconhecer como a ascensão do “peixe preto” (referência ao
apelido Mussum dado por Grande Otelo) esteve nas margens desse amplo arco de
alianças que veio a formar depois a Frente Democrática nos anos 70/80.
As cenas do programa Os
Trapalhões que foram reencenadas com o elenco do filme demonstram uma mensagem
muito importante que é possível vencer a ignorância na política através do
riso. Uma vez que fazer humor com militares em plena Ditadura Militar não é um
gesto de alienação e as camadas populares riam de um Sargento autoritário que
era zombado desde seu apelido de Pincel. O público testemunhou nomes como Maria
Bethânia e Ney Matogrosso serem parodiados por esse programa. E, no filme, a
canção Morena de Angola (1980) aparece como uma bela sinalização dessa postura
de Frente. Aliás, Os Saltimbancos Trapalhões é de 1981 que tinha, entre os
diversos roteiristas, Teresa Trautman[1],
mas, se fosse nos dias atuais, os inquisidores das redes sociais comentariam
sobre o passado do Diretor J. B. Tanko.
Logo, não podemos
permitir que Mussum, o filmis seja “cancelado” por juízes da opinião sectários
por não haver uma crítica incisiva ao nordestino Renato Aragão. Ou por achar
irrelevante, a aparição de outro personagem do humor brasileiro com parentes “fichados”
no DOPS, Chico Anísio. Observamos um potencial para fazer nesse filme a
oportunidade de reencontrar a juventude atual com o ensinamento de que nada se
faz pela via do individualismo.
O filme é uma
oportunidade para fazer um segmento popular sorrir sem ser necessário que
julguemos o sentido das piadas. Na verdade, aquilo que tentam sugerir que falta
no filme poderíamos dizer que foi um acerto em não aparecer, pois o momento é
de buscar “pontes” na sociedade de uma forma plural. E sentimos saudades da
Elza Soares dos tempos do Presidente Trabalhista que assiste ao seu Show junto
com os Originais do Samba. Saudades do Jorge Ben antes de acrescentar o Jor.
Entretanto, não é um filme saudosista que assistimos no cinema. Digamos que é
um humor refinado ao nível de Mikhail Bakhtin uma vez que rechaça a via de mão
única das chamadas “narrativas” e a rigidez das reflexões biográficas. Reivindica
a ambivalência, como um discurso carnavalesco. Uma ampliada frente de
interpretações de muitos personagens envolvidos e dialógico.
Refundar um personagem
contraditório foi o desafio muito bem feito na atuação do ator Aílton Graça.
Depois de Majestade – personagem do filme Carandiru (2003) – essa é sua atuação
mais marcante, pois parece ter o humor e o samba em seu “DNA artístico”. Seu
amadurecimento acompanha também o de muitas forças que integram a frente
democrática naquilo que o pensador Gramsci chamaria “revolução passiva”. Além
disso, as classes subalternas nesse país deram voz aos negros tanto no samba
quanto no humor. Não podemos deixar que essas possibilidades se perdessem. Nessa
perspectiva o esse é um dos filmes mais ousados no cinema nacional desde Medida
Provisória de Lázaro Ramos que tinha uma canção de Cartola (personagem que
aparece em Mussum, o filmis).
[1] Com “Os homens que eu tive”, Trautman
tornou-se a primeira diretora de cinema a filmar a partir de um ponto de vista
estritamente feminino, abordando a liberação do corpo da mulher.
Excente texto Vagner . Viva Mussum .
ResponderExcluirTexto que remeteu saudades.
ResponderExcluirBom demais
ResponderExcluirExcelente texto, Vagner! Uma homenagem à altura do Mussum! Grato por compartilhar! Abraço!
ResponderExcluirMuito boa a análise, professor!
ResponderExcluirO filme será sucesso m!
ResponderExcluirTexto magnífico Prof°Vagner!
ResponderExcluirO artigo está muito bem escrito eu amei.
ResponderExcluirMuito bom , parabéns
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