Ricardo José de Azevedo Marinho[1]
O Carnaval passado não foi muito
favorável para leitura e reflexão, pelo menos para os governos. As chuvas, ou
melhor, a negligência com elas têm sido vorazes, terríveis e destrutivas, uma
grande catástrofe das que vem acontecendo cada vez mais e não foi diferente há
pouco.
Alguns feriados carnavalescos foram
suspensos. Alguns sopraram a ideia de que tinham de ser adiados como fez uma
cidade da região metropolitana carioca. De fato, o Carnaval que esteve
desaparecido com a pandemia e sempre costuma estar no radar das altas
responsabilidades governamentais.
O governo Lula e Alckmin fez bem em ter
suspendido as suas férias momescas por ocasião do desastre do litoral paulista,
e de imediato ofereceu a ação republicana responsável e foi apreciada pelos
cidadãos tal como ocorrerá com a emergência yanomami.
Parece que o pior já passou e o país, e como
nas ocasiões anteriores, vem dando o melhor de si.
Os bombeiros em primeiro lugar, as Forças
Armadas e os Policiais, autarquias e funcionários públicos, trabalhadores, vizinhos
e cidadãos apoiados pela ajuda de todas e todos mostrou que o país permanece a
ter capacidade de resiliência diante das adversidades e uma generosidade de
espírito que nos fez muita falta à bem pouco tempo.
É claro que a prevenção está longe de
ser como deve, também é claro que as causas das chuvas não se enquadram apenas como
fenômenos naturais. No antropoceno existe um percentual considerável da
participação das humanidades, seja por motivos culposos (por leniência) ou dolosos.
Ambos são sérios e não devemos
ignorá-los. Na ausência de uma Autoridade Climática (e que talvez nunca venha
ou tarde a vir), os poderes constituídos tem o dever de proceder a uma
investigação aprofundada e apurar a magnitude das componentes que deram causa
as tragédias.
O esforço terá agora de se dirigir na
reconstrução da devastação das chuvas, queimadas e desmatamentos com realismo e
aplicação. O pior é fazer promessas no ar que podem se transformar em
frustrações dolorosas em poucos meses. É preciso exercer a crítica, mas também
ter prudência na análise do ocorrido. O Brasil não tem mostrado uma capacidade
de resposta melhor à de outras experiências planetárias diante de catástrofes
comparáveis.
É claro que as medidas para prevenir os riscos
de desastres no país terão que ser reexaminadas à luz destas sucessivas tragédias.
As medidas regulatórias devem situar a proteção dos assentamentos das humanidades
nas áreas metropolitanas e turísticas, lembrando sempre que está ultima trata
de uma atividade importante para a economia nacional e que é preciso aliar o
bem principal de proteger as vidas com o esforço do desenvolvimento.
Liderar um país com responsabilidade é
fruto de reflexão constante e não de impulsos. Como não entender que o Brasil
está sob grande pressão econômica e social neste ano e nos próximos, mesmo
quando a situação econômica mundial não apresentará alguma melhoria que nos
ajudaria?
Como não entender que a necessária
reforma tributária exigirá um esforço de acordos, mas não porque nenhuma força
política tenha grande maioria? Como não inferir que essa pauta exigirá esforços
claramente suprapartidários?
O que está em jogo hoje não são os
vacilantes sonhos de todos os tipos, mas sim o perigo de que o país volte para o
pior, que os nossos indicadores económicos e sociais estagnem ou desçam, e que
a nossa convivência retorne a dureza dos últimos anos. Não é apenas um perigo do
aprofundamento do declínio político, social e econômico, é também o perigo de se
enraizar o declínio de nossa cultura cívica.
Não podemos nos acostumar a pensar que
nosso sistema educacional seguirá sem melhorar e que as atividades culturais de
qualidade continuarão diminuindo, que nossa língua será cada vez mais pobre, como
se não houvesse o uso repetitivo e abusivo de rabiscos em nossas conversas e
que tem sido cada vez mais curtas, com longos silêncios até nos ministérios.
Também não devêssemos pensar que é
normal que reações irritadas e insultos fáceis tenham uma presença na vida cidadã
e/ou se acostumar com o fato de que a leitura é uma atividade estranha para
muitos jovens, quase uma raridade.
Nesse caminho, a atratividade do Brasil
se abrigará apenas na sua pujante paisagem majestosa, enquanto o nosso povo
persista se tornando cada vez mais ruinoso.
Claro, surge a pergunta, como reverter o
curso? A resposta em sua gama de ações republicanas e democráticas é longa e
complexa, mas o passo inicial não. É um esforço coletivo e plural que não faz
da adversidade um muro intransponível contra os acordos básicos de cooperação
que toda sociedade exige para avançar.
Trata-se de abrir-se à esperança de uma
convivência de maior qualidade que evite que nosso ethos cidadão da brasilidade seja novamente invadido pela
deterioração, insegurança e barbárie.
11
de março de 2023
[1] Presidente da
CEDAE Saúde e professor do Instituto Devecchi, da Unyleya Educacional e da
UniverCEDAE.
A reconstrução exige união da sociedade. Os sindicatos eram uma alavanca que movia os críticos. Precisamos voltar a exercer a cidadania. Parabéns pela reflexão.
ResponderExcluirExcelente! Recomendo a leitura!
ResponderExcluir👏🏻👏🏻
ResponderExcluirPor um lado você esta certo ,mas por outro, você esta coberto de razão, Parabens !
ResponderExcluirMuito boa a análise, vamos compartilhar!!
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