Por Lucas Soares
Qual horizonte está reservado para o futuro trabalho?
Como sobreviverá a mesma sociedade que, invertendo a ordem natural da identificação
do ser social, não trabalha e, portanto, não se humaniza? São essas as questões
que saltam os olhos de quem, na tentativa de entender e transformar a realidade
que o cerca, se propõe a analisar os processos históricos que nos fizeram
chegar até elas.
Partindo destes
questionamentos iniciais, constata-se que, quando da chegada do poder que até
então lhes era estranho (mercado capitalista), transformaram-se as formas pelas
quais os homens se ligavam a sua condição natural. Com isso, o homem que
outrora fazia do trabalho a necessidade básica do ser social, agora enxerga
nele o meio de satisfação de suas realizações. Para isso, ou seja, para
alcançar suas satisfações, transforma-se também a própria condição natural do
ser, fazendo dele uma mercadoria.
Apontemos, portanto, os
problemas desse processo:
A precarização do
trabalho pressupõe a precarização das condições de subsistência humana,
evidenciando, dessa forma, o processo de estranhamento do homem para com seu
próprio corpo, sua consciência, sua própria classe, seu papel fundamental na
base de sustentação do capitalismo.
Exposto o fato, imaginemos a pior das hipóteses: O que resta ao ser que, vivendo em um estágio avançado sobrevivente desta conjuntura onde as relações de trabalho se liquefazem em medidas cada vez mais velozes, sequer tem acesso ao trabalho? A mão de obra ociosa, seja ela jovem ou de mais idade, na realidade brasileira, forma um exército de reserva que torna o plano de fundo perfeito para a passagem de reformas e mais reformas que cada vez mais a desumaniza. Tal como a conhecida frase de Darcy Ribeiro sobre o sucateamento da educação, fica claro o projeto de desmonte dos vínculos de emprego, assim como suas finalidades.
Vamos ao próximo ponto: o crescente desemprego e a mão de obra ociosa e ansiosa por um vínculo empregatício contrastam com a supressão de médicos, professores, enfermeiros, guardas municipais, policiais, assistentes sociais, etc... A conta que deveria ser básica, sequer é cogitada. Por outro lado, a burguesia nacional que chancela a política neoliberal de Paulo Guedes e sua trupe, quando se depara com a possibilidade de preencher os postos de trabalho em falta, aproveita-se disso para opor as soluções. Dessa maneira, a população sem emprego é encurralada a fim de precarizar mais ainda o emprego de quem já o tem. O ponto de barganha, para isso, é justamente o índice de desemprego que bate a casa dos 14,6%, tendo como premissa de aceitação a lógica do seguinte dito popular: “É melhor pingar do que secar”. Portanto, agradeça a Deus pela oportunidade de trabalhar metade do seu dia e gastar 1/3 do que te resta no transporte público. Não aceitando tal imposição, existe um oceano de miseráveis que topariam estar no seu lugar.
Diante disto, voltemos para
o debate inicial: entendendo o ritmo de aceleração do neoliberalismo que agora está sem capuz[1],
qual será o futuro de uma humanidade que cada vez menos tem acesso ao trabalho?
A era da Indústria 4.0 bate à porta. Nela, diferente da fábrica cujas peças são
os homens, o homem é substituído pela Cyber Tecnologia, e o que antes era feito
por 400 trabalhadores, agora pode ser realizado por 40.A maneira com que se
esboça o desenvolvimento tecnológico, embora de forma insustentável, está
prestes a devorar mais uma geração.
Por outro lado, a
juventude trabalhadora e periférica que vislumbra a oportunidade de participar
do Round 6 que se tornou o mercado de trabalho brasileiro tem, na melhor das
hipóteses, as seguintes opções: parcelar a vida via FIES, na esperança utópica
de se empregar após a formação; ou aventurar-se na desigual concorrência entre
escolas públicas e privadas no Exame Nacional do Ensino Médio (ENEM). Quanto às
relações diretas de emprego entre a juventude, para além do já exposto caminho
via universidades, nota-se o apagamento de incentivos como o Programa Jovem
Aprendiz, enquanto o segmento aproxima-se de formas precarizadas de trabalho,
como as oferecidas nas plataformas de entrega. Este último sequer é entendido
como vínculo empregatício, transformando o já distante caminho até a
aposentadoria em um verdadeiro Maze Runner.
De imediato, é evidente
que houvera uma transformação no que outrora era uma preocupação com as
condições emergentes de trabalho do século XVIII. Somou-se ao trabalho de
condição alienante o tsunami de desemprego que atinge sobretudo quem tampouco
sabe da existência do debate teórico acerca de suas condições de trabalho. A
constância de idealizações sobrepujando a realidade apenas dificulta a
mobilização de massa necessária para a superação (via política) dos problemas. A
atual situação laboral traz à tona, nesta primeira metade do século XXI, uma
era de romantização do empreendedorismo dissimulado, onde a solidez dos
vínculos de trabalho dá lugar a plataformas virtuais que dificultam a formação
de uma relação concreta entre emprego e empregado. Vencem, desta forma, as
formas mais abstratas do trabalho. Naturaliza-se, portanto, a fome, a miséria,
o desemprego e a banalização da vida.
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